quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Votos de Ano Novo

O Senhor te abençoe e te proteja.
O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face e te seja favorável.
O Senhor volte para ti os seus olhos e te conceda a paz.


É esta a bênção que Deus revela a Moisés para os filhos de Israel. São estes os meus votos para todos os amigos e amigas que frequentam o blogue, que partilharam e partilham a caminhada ao encontro do Verbo ao modo e estilo de São Domingos, nosso pai.

Meditação de Natal - 5

As chuvas de inverno tinham passado e o campo em flor convidava a sair. Havia no ar uma promessa de fertilidade, de frutos a brotar, de uma felicidade anunciada.
E tu chegastes como uma brisa suave ou um raio de luz quase imperceptível numa manhã de sol e paz. Eras um convite, uma proposta, uma revolução na minha vida já traçada pelos homens, eras uma mudança radical de projectos e futuro. Tudo passaria a ser diferente.
E perguntei como seria possível, se eu não conhecia homem e se estava prometida a um homem que esperava por mim para ser sua esposa e mãe dos seus filhos. Mas como poderia conhecer alguém e estar prometida se era por ti que esperava, se era para ti que desde sempre tinha sido preservada e protegida? E ainda hoje é por ti que sou protegida e preservada.
No momento e apesar das interrogações não alcancei toda a dimensão da proposta e do convite. Ser a mãe de Deus, do Salvador de Israel? Agora olho para ti, frágil menino nos meus braços e uma vez mais me interrogo, serei a mãe de Deus? Que Deus é este que se faz menino? Como nos salvarás lindo menino?
Tomei consciência dos riscos que acarretava a resposta ao teu convite, à tua proposta de maternidade quando José me disse que me repudiaria em segredo. Ele é um homem justo, é um homem que me ama, e por esse amor não quis que sofresse o castigo reservado pela lei de Moisés às mulheres que aceitam ser mães fora da união matrimonial. Foi um sinal do seu amor mas foi também um momento de dor, da dor de me sentir estranha ao homem que amava e me amava. A brisa suave que eras transformava-se em vento de tempestade, revoltando já não as flores do campo mas as folhas velhas e secas das nossas relações organizadas e projectadas pelas leis patriarcais ancestrais.
Mas uma noite tudo mudou. Creio que também a José lhe fizestes a mesma proposta e convite que a mim, alterar a sua vida, entregá-la nas mãos de Deus que com a sua colaboração se fazia Deus connosco em ti. És irresistível nas propostas que fazes de alteração de vida, parece que te comprazes em que deixemos de lado os nossos planos para arriscar e aventurar-nos nos teus planos. Sempre fostes assim e não acredito que mudes algum dia. Gostas que as pessoas nada tenham por certo e garantido senão o amor de Deus e a sua protecção. Pergunto-me que partidas me terás reservadas para o futuro.
Tranquilizadas as nossas vidas nesse projecto que não era nosso mas teu, no qual nós não tínhamos qualquer poder, parti ao encontro da nossa prima Isabel. Foi caminhando pelas montanhas da Galileia que percebi um pouco mais do convite que me tinhas feito, que nos tinhas feito. Tu vinhas ao nosso encontro, eu transportava-te no meu seio, para que nós aprendêssemos a transportar-te nos nossos corações e a ir ao encontro do outro. Se o nosso Deus descia da sua glória para habitar connosco, para ser um connosco e como nós, como nos poderíamos recusar a descer ao nível do outro a visitá-lo e a ser um com ele e como ele?
No entanto quero dizer-te que não é fácil e há poucos dias experimentámos isso, eu e José. É verdade que ninguém sabia que receberia o Salvador do mundo, e não sei se mesmo sabendo nos receberiam, mas passámos uma noite em vão batendo de porta em porta para que nos acolhessem e ninguém nos quis acolher. Estavam todos demasiados ocupados, nas suas hospedarias e casas e também nos seus corações e portanto nada disponíveis para acolher alguém que parecia prestes a dar à luz. Não é fácil acolher o outro em situação problemática, é inevitavelmente uma complicação.
Tu certamente um dia passarás por isso, baterás à porta e não te abrirão, estarão demasiado ocupados com o seu mundo pequeno e ruidoso, com as suas verdades feitas e riquezas adquiridas. Mas acredito que outros te abrirão as portas, aqueles que não são queridos por ninguém, aqueles aos quais também muito poucas portas se abrem, aqueles que buscam com as suas limitações a verdade e a justiça. E quando tal acontecer farás festa com eles. Sei que será assim porque tu és uma festa, um dom, um presente, um banquete destinado a saciar os que têm fome, todas as fomes. Foste-o para mim e para José serás também para aqueles que te acolherem como seu Deus e Salvador.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Meditação de Natal - 4

Olho-te embevecido e tu sorris, estreito-te nos meus braços e tu contemplas-me. Eu bato à porta e chamo, quem abrir será minha morada. Tu bateste à minha porta e eu quase não dei por isso e por pouco não passastes a diante. Como te poderei receber, como poderei ser tua morada?
Pediste-me que fosse teu pai, e não sou teu pai nem tu és meu filho. Dar-te-ei o nome de Jesus, mas também esse não é o meu nome nem o nome da minha tribo. Foi-me dado para que tu desse, e por isso nem do teu nome posso ser pai. Contudo, e para todos sou o teu pai e serei o teu pai.
Olho-te uma vez mais e aperto-te com mais força nos meus braços. Que serei eu para ti, porque és tu mais meu pai e eu teu filho que o contrário. Tu és o meu criador, o meu princípio e o meu fim, que poderei ser eu para ti, que pai poderei ser para ti?
Olho a tua fragilidade e tomo consciência que mais ninguém te poderá proteger senão eu, a ti e à tua mãe. E sei também desde já que os perigos serão grandes porque o anjo anunciou a tua mãe que serias o motivo da queda de muitos. Os que não quererão cair, aqueles que terão medo da queda, farão tudo para te eliminar, e eu terei que te proteger deles, mesmo que isso me custe a vida. Meu menino Jesus não deixarei que te façam mal.
Quando começares a entender as letras e as leis dos homens ensinar-te-ei a Escritura e a Lei de Moisés. Um dia poderás discutir com os homens do templo e os sábios de Israel, poderás discutir com eles a justiça de Deus e como ela se manifesta através da verdade e da misericórdia. Tu serás a sabedoria feita carne para aniquilar a mentira dos preceitos opressores.
Mais tarde ensinar-te-ei a arte e o ofício das madeiras e serás por todos conhecido como o filho do carpinteiro. Conhecerás como a madeira se trabalha e poderás reconhecer que o tratamento dado à madeira verde é bem diferente do tratamento dado à madeira seca e velha. E se tu fores tratado como a madeira verde que a força do Altíssimo esteja contigo para enfrentares os inimigos às portas da cidade.
Ensinar-te-ei também o sentido da liberdade, mesmo que isso me custe três dias de busca. Mas não se resume a nossa vida a três dias de busca, a essa busca para a qual tu nos darás a resposta? Quero que sejas livre e libertes os que viverem contigo, que sejas a verdadeira liberdade. Prometo criar-te em liberdade.
Aperto-te nos meus braços e olho-te uma vez mais. Como te poderei receber, como poderei ser tua morada? Abraço-te com mais força e na tua singularidade aceito-te como és, aceito-te como risco a correr, como aventura a viver, como tempestade que liberta as forças da natureza para nos conduzir à bonança. Aceito-te como meu filho, a nascer em cada dia, porque só nascendo em cada dia em aceitação da diferença poderás ser meu filho e eu habitação da tua presença.
Chamaste-me um dia e eu quase não ouvi. Olhando para ti agora pergunto-me como me chamarás no futuro, se por pai se por José. Prefiro que me chames por José, serei eu, poderei ser eu, como todo o meu ser, a responder-te. Não sou teu pai e por isso deves reservar esse tratamento para o teu verdadeiro Pai, ainda que esteja confiante que não deixarás de partilhar a tua filiação connosco, comigo e com todos os outros que como eu caminham na busca da paternidade.
Quando me chamares chama-me por José e ouvirei o teu chamamento e irei em tua busca com todos os meus defeitos e fragilidades, tropeçando nas minhas misérias, mas sempre na esperança de te encontrar e de que me queiras chamar teu filho e dar a graça de ser tua morada.
Estreito-me nos meus braços e sussurro-te: chama-me José.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Meditação de Natal - 3

A noite fria reuniu-nos junto da fogueira enquanto os rebanhos dispersos pelo campo se juntavam também para se aquecerem e protegerem. Longe ouvia-se o uivo de um lobo na noite, um grito feroz a quebrar o silêncio do frio da noite.
Mais um pau para a fogueira e no céu estrelado elevam-se com o fumo as fagulhas levantadas das brasas que crepitam. O vermelho e o laranja do fogo iluminam os rostos recolhidos e enregelados, porque esta vida de pastor não é fácil e menos ainda com este frio.
O silêncio é quase sagrado, ninguém quer dar início à conversa, mas pela cabeça dos presentes circulam as ideias e as memórias do vivido recentemente. Há três noites atrás neste mesmo lugar e por volta desta mesma hora foram surpreendidos por uma grande luz e um grupo de anjos que nos céus cantavam glória a Deus nas alturas. Ficaram aterrados de medo, um medo maior que o provocado pelos ataques dos lobos, pois nunca tinham visto nada assim, nada que estivesse tão fora das suas concepções e experiências. Foi um momento aterrador pela novidade e pela beleza tão nova e tão diferente.
Foi por causa desse medo que um dos anjos se lhes dirigiu directamente e os enviou a visitar um menino recém nascido e deitado numa manjedoura, era o Salvador do mundo, o Messias esperado. E eles foram, ainda que meio às cegas e tontos por tanta luz e tanta novidade. E encontraram de facto o menino deitado numa manjedoura, e sua mãe e seu pai, e uma enorme pobreza pois como viajantes muito pouco tinham trazido consigo.
Olharam, viram, admiraram, ofereceram do pouco que também possuíam, partilharam da enorme alegria dos pais e depois regressaram aos seus campos e rebanhos, uns muito alegres mas outros nem tanto.
O pastor mais velho foi um dos que regressou com a cara fechada e absorto nos seus pensamentos. O anjo tinha anunciado que lhes tinha nascido um salvador, mas ele só tinha visto um pobre menino deitado numa manjedoura aquecido do frio da noite pelo bafo de um burro e de uma vaca. Esperava um rei, um homem todo poderoso, um filho de rei, mas encontrara um menino frágil, cheio de fome, necessitado de tudo e sem qualquer poder. Como poderia aquela pobre criança ser Deus, o salvador esperado?
Diante de tanta dúvida quebrou o silêncio e desabafou: - Não é possível que seja Deus, não pode ser Deus, fomos enganados, é apenas um menino, mais um menino, filho de homem! A tristeza cobriu-lhe o rosto como um véu de morte e as rugas do rosto tornaram-se ainda mais profundas como se fossem as marcas abismais do tempo de espera desde a promessa feita ao primeiro homem.
Perante tal desabafo e desatino o pastor mais jovem, aquele que tinha regressado com a maior expressão de alegria estampada no rosto disse-lhe: - Não podes falar assim porque em verdade o que tu vistes é o nosso Deus e Salvador. Contudo, não te podes esquecer de uma verdade que vem da experiência dos nosso pais no deserto, ninguém pode ver a Deus e continuar vivo. Se acreditas nisto tens que acreditar também que aquele menino é o nosso Deus e Salvador e assumiu a forma humana que tu vistes, e nós vimos, para que pudéssemos ver Deus e continuar vivos. Se vês o menino apenas com os olhos não vês nada, vês simplesmente mais um menino, mas se vês com os olhos do coração e com fé então verás o teu Deus e Salvador e o maior gesto de amor para connosco, pois não só desceu das alturas para nos salvar como ainda se fez homem para que o pudéssemos olhar e contemplar.
Perante tais palavras do jovem pastor ninguém ousou mais quebrar o silêncio, nem o pastor mais velho, que no seu coração começou a sentir a necessidade de voltar à gruta para rever o menino recém-nascido. Quantas vezes teria que voltar, quantas vezes teremos que voltar para o ver com outros olhos?

domingo, 27 de dezembro de 2009

Homilia Domingo da Sagrada Família

Celebramos neste domingo da oitava do Natal a festa da Sagrada Família e o Evangelho de São Lucas apresenta-nos o episódio da perda e encontro de Jesus no templo de Jerusalém.
Como texto escolhido pela liturgia para a apresentação da família que deve servir de modelo às famílias cristãs é um texto estranho, até contraditório, porque parece haver muito pouco de família, ou pelo menos e à luz dos parâmetros psicológicos e sociais actuais estamos mais perante uma família problemática que uma família modelo.
Antes de mais, e conhecendo um pouco a história prévia ao acontecimento relatado pelo Evangelho de hoje, sabemos que o casal vive uma relação especial, uma relação em que a sombra da infidelidade pairou no ar. Sabemos também que há um filho que não é fruto da relação matrimonial, o que não deixou de causar problemas ao casal e até colocar a hipótese de dissolução da união matrimonial.
Hoje, e pelo Evangelho de São Lucas, ficamos a saber que o jovem adolescente vive com bastante liberdade e independência, ou se quisermos olhar com uma lente mais crítica, vive com uns pais pouco atentos à sua segurança e controlo. Um dia de viagem sem conhecimento do paradeiro do filho parece bastante negligência e descuido. E o filho, pela resposta à mãe quando encontrado no templo de Jerusalém, parece também um miúdo um pouco mal-educado para com os seus pais, ou mãe, porque no relato o pai parece quase omisso, uma figura de segundo plano e sem qualquer autoridade sobre o filho.
Estamos assim, e face a estes dados, perante uma família que aparentemente tem muito pouco para oferecer de exemplo a outras famílias. Bem pelo contrário, parece mais uma das nossas famílias contemporâneas, com todos os seus problemas e defeitos, uma família desestruturada e em crise.
Mas é aqui e nesta dimensão e circunstância de crise que a sagrada família de Nazaré se revela surpreendentemente uma família modelo, uma família a seguir e a imitar. E revela-se como modelo a imitar na medida em que não são os laços sanguíneos o que a une, nem é o poder ou a autoridade que governa, mas são outros valores, valores que ultrapassam a dimensão meramente sociológica, antropológica ou cultural, são valores evangélicos, valores da dimensão do transcendental e do divino.
Assim compreende-se que José tenha aceite não só Maria na sua aparente infidelidade mas também que ela fosse mãe de um filho que não era seu, do seu sangue, mãe do Filho de Deus. Nesta relação e nesta família não é o sangue, a linhagem que cria os laços de pertença, nem o sentido de propriedade, mas sim a aceitação do outro pelo que ele vale por si próprio e aos olhos de Deus.
Podemos ver já vividas por Maria e José as recomendações de São Paulo aos Colossenses de que os esposos se devem respeitar e amar como convém no Senhor. E o que convém no Senhor é que os esposos se amem e vivam em comunhão, com sentimentos de misericórdia, de bondade, de paciência, de humildade e de mansidão.
Sentimentos que também devem presidir à relação com os filhos, à sua educação e formação, pois só assim eles poderão crescer em liberdade e responsabilidade, aprender a amar os pais por aquilo que receberam deles em termos de amor e carinho, e não apenas em termos materiais ou sociais.
Estas recomendações de São Paulo foram também vividas por Jesus porque o evangelista diz-nos ao terminar o relato deste episódio que ao regressar a Nazaré Jesus era obediente a seus pais e crescia em espírito, estatura e graça. O episódio de Jerusalém e a resposta um pouco desabrida mostra a consciência da sua liberdade e missão, mas também o sentido da educação que tinha recebido de seus pais. Uma vez mais e acima dos laços familiares estava o laço divino, a pertença e filiação divina, uma realidade que também a nós, a cada um de nós, nos deve marcar nas nossas relações.
Antes de mais, e antes de ser pais e filhos, geração genética e sanguínea, somos criaturas de Deus, somos seus filhos bem amados e portanto é a nossa filiação e relação divina que deve marcar a nossa vida e as outras relações que possamos estabelecer. A família e as relações familiares são um espelho não só da relação e familiaridade que habita a Trindade mas também da relação que Deus estabelece com a humanidade e com cada um de nós.
Desta realidade nasce um desafio enorme para as nossas famílias e relações familiares, que devem libertar-se do peso e dos laços humanos que as condicionam para passarem a viver fundadas no amor e na liberdade de Deus e na responsabilidade que tal forma de vida acarreta. Peçamos ao Senhor a graça de o podermos experimentar.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Meditação de Natal - 2

Saímos de Nazaré e fizemo-nos ao caminho, a este trilho calcado pelos pés dos homens e dos animais carregados de mercadorias. Parecia que seria fácil, rápido, mas quanto nos falta ainda para chegar a Belém.
O pó do caminho levantado pelo vento frio e agreste colou-se aos nossos rostos e roupas. Por entre a fresta do véu que mostra os olhos pequenos e negros vê-se o pó colado às sobrancelhas de Maria; José tem também a barba polvilhada e por vezes sacode aquele que se lhe agarrou aos pés.
O pó fere-nos a carne e lembra-nos que também nós somos formados do mesmo pó, que um dia num excesso de louco amor criativo Deus criador moldou o primeiro homem deste mesmo pó, pó amassado com a saliva do seu Verbo e vivificado pelo sopro do seu Espírito.
Hoje este pó nos traz essa verdade à memória e a esperança de que este menino transportado no seio de Maria nos liberte desta pobre condição, que restitua a essa forma tão terrena a grandeza que teve no momento da sua criação.
Caminhamos e confiantes cruzamo-nos com aqueles que se cruzam connosco. Podem ser ladrões, salteadores, simples viajantes temerosos como nós, não sabemos, mas ainda assim arriscamos cruzar-nos com eles, partilhar esse olhar de quem viaja, de quem se sabe fora de toda e qualquer protecção. Todos estamos no mesmo caminho, no mesmo processo, e isso dá-nos uma solidariedade, um espírito de partilha que não se encontra em outros lugares e momentos da vida. O viajante é sempre um solidário, acompanha-o a graça de Deus e a sua presença angelical, e por isso se cruza com os outros, arrisca uma palavra, uma saudação, até a partilha da parca merenda.
Um dia partilharemos outra mesa, a mesa celestial, onde o pão será de todos e para todos, onde todos saberemos que fomos convidados e temos um lugar porque partilhámos a nossa parca merenda com o outro que se cruzou connosco no caminho.
O menino salta de alegria no seio de Maria, também ele projecta e sonha reunir um dia todos os homens à volta da mesma mesa, não no céu mas já aqui na terra, e para isso entregará o seu corpo como alimento, como mesa de reunião, como palavra convidativa. Aceitarão os homens esse alimento e a sua forma de partilha?
À medida que o dia avança e o caminho se vai trilhando começam a aparecer os primeiros sinais de desconforto, são já muitas horas de viagem para Maria e ainda que acomodada nas costas do pobre burrito o corpo não deixa de sentir o cansaço da viagem. É tempo de uma pausa, de um descanso, pois não se pode correr o risco do menino vir ao mundo neste descampado, neste deserto, ainda que seja no deserto, neste mesmo deserto que um dia já adulto fará a experiência da tentação, essa experiência tão intrínseca ao próprio homem, e que descobrirá a sua filiação divina e a sua missão redentora. Contudo, agora ainda não é tempo, ainda não chegou a hora. Tudo seria precipitado neste momento.
Retemperadas as forças, saciada a sede e recomposto o corpo através de uns passos frágeis e equilibrados retomamos a viagem, pois falta ainda muito para chegar a Belém, um dia mais de viagem. E não sabemos o que nos espera no caminhar que temos por diante, só Deus sabe e só Deus poderá saber. O caminho é uma surpresa, uma dádiva, um desafio, mas também uma possibilidade aberta a Deus através da paisagem, dos outros e da própria meta que nos propomos alcançar, de Belém.
José sente os pés já cansados da jornada mas como está habituado ao dia a dia da sua marcenaria, do caminhar lento atrás das madeiras, não se queixa. Maria pelo contrário começa a expressar a sua apreensão, a sua preocupação, pois o seu corpo não deixa de dar sinais do cansaço e do menino que parece querer antecipar-se à data prevista do seu nascimento.
Como é difícil caminhar neste estado! Mas será que não caminhamos todos neste estado de esperanças, de gravidez de uma realidade que nascerá um dia, no dia em que nos entreguemos totalmente a ela. O homem transporta em si um mundo novo por nascer, um mundo que espera a luz, mas é necessário fazer o caminho para que ele nasça, arriscar-se à viagem pelo desconhecido de si e dos outros que se cruzam no caminho. Belém está logo ali, ao virar da esquina, mas pode estar também muito longe, a anos-luz. A distância é equidistante à nossa capacidade de arriscar caminhar nos trilhos dos homens e no trilho de Deus.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Antífona do Ó do dia 23 de Dezembro

Ó Emanuel, nosso rei e legislador, esperança das nações e salvador do mundo: vinde salvar-nos, Senhor nosso Deus.

O Emanuel é Deus connosco, Deus que vem, Deus que se abaixa. Abram-se os céus e desça, diz Isaías.
Assim fez. Ele desceu Senhor do mundo por amor, legislador supremo. Agora já o possuímos, agora o vemos, está connosco para sempre. Neste pequeno presépio é Ele, o Emanuel, Deus connosco.
Mas também no sacrário temos outro presépio, o Deus connosco na Eucaristia.

O nosso coração pode e deve ser outra presença, outro presépio, o verdadeiro e original.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Meditação de Natal

A dois dias do Natal contemplamos a partida de Maria e de José para Belém. A notícia e ordem do recenseamento obrigatório emanada de Roma surgiram como uma perturbação, como mais um acontecimento extraordinário nestes últimos meses, já de si povoados de acontecimentos extraordinários e perturbadores. Contudo, porque o império e as suas forças assim obrigam, não podiam escapar e José é um homem justo que cumpre os seus deveres e obrigações e não quer faltar neste caso à sua obrigação. José quer ter o seu papel na história e garantir que o seu filho, quase prestes a vir a este mundo, tenha uma referência histórica. Ele nascerá no tempo de César Augusto e sob o governo de Quirino. Poderá isso um dia dar-lhe alguma liberdade, alguns direitos, uma cidadania reconhecida? Quem sabe…
A situação muito particular de Maria, quase prestes a dar à luz, tem sido a grande preocupação para esta viagem, pois a qualquer momento a criança pode querer vir a este mundo. Nos últimos dias e enquanto preparavam a pequena trouxa que os acompanharia o estado de Maria foi o tema das conversas e das horas de sono perdidas de José. Ele bem queria que Maria desse à luz em Nazaré, apoiada pela família e ajudada pelas mulheres da aldeia que já tantas outras vezes se encontrarem no mesmo estado.
Mas Deus quis sempre algo diferente para a mulher que José ama e parece que até neste caso se passa o mesmo, é como se uma vez mais a quisesse proteger do mundo e das suas formas comuns. A virgindade de Maria será preservada até da curiosidade das parteiras da aldeia.
Outra preocupação que atravessa a mente de José é a estadia em Belém e o alojamento, uma vez que não têm ali família directa que os possa acolher. Onde ficarão, onde pernoitarão, numa cidade tão pequena e certamente tão povoada de forasteiros como eles para cumprirem o mandato romano. Na bolsa que escondeu à cintura José colocou duas pequenas moedas para pagar o alojamento mas dúvida que lhes sirva de muito. Entrega-se a Deus e à sua bondade e providência, a esse Deus que lhe deu uma missão tão sublime mas ao mesmo tempo tão difícil de ser pai de um filho que não é seu e marido de uma esposa que é e sempre será virgem.
José sente-se e sabe-se curador de um tesouro que não lhe pertence, mas do qual Deus lhe pedirá contas, porque é um servo fiel e lhe quer dar muito mais para cuidar. É esta consciência que o assalta e o faz preocupar-se com Maria e esta viagem.
Entretanto e sabendo como o menino não quer continuar escondido no seio de sua mãe, Maria preparou a trouxa com os pouco panos finos que possui, panos que servirão para o agasalhar assim que nasça. Também ela está agitada e preocupada pois gostaria de algum sossego neste momento, mas Deus sabe o que faz e como José também ela é apenas um instrumento, ainda que especial, nesta história de salvação.
Com tudo pronto, com a casa entregue ao cuidado e vigilância da família, depois das últimas verificações da trouxa e do que pode faltar, Maria sobe para o pobre burrito que a transportará. José ajuda-a a subir para que não faça nenhum esforço que a coloque em risco e já na montada despedem-se dos que ficam.
Têm pela frente uma longa jornada, uma jornada cujo fim desconhecem, mas à qual se avançam porque a história dos homens assim o proporcionou e o plano de Deus assim o quis.
Em cada dia, e em vários dias especiais da nossa vida, Deus faz-nos o mesmo desafio, partir de viagem para outro lugar, para outro modo de ser, para outro estar no mundo e na história dos homens. Como Maria e José temos todas as razões para querer continuar onde estamos e como estamos, mas não podemos deixar de olhar para o desafio de sair, de partir, e arriscar, pois só dessa forma poderemos encontrar-nos com o nascimento de Jesus.
Instalados na nossa rotina, no nosso mundo vizinho, não possibilitamos a experiência da confiança, da entrega total e pobre a Deus que nos vem resgatar da nossa condição servil. Só à beira do abismo podemos experimentar a vertigem.

Antífona do Ó do dia 22 de Dezembro

Ó Rei das nações e Pedra angular da Igreja: vinde salvar o homem que formastes do pó da terra.

O desejado, o Rei, a Pedra angular, só o Cristo salvador pode fazer chegar à unidade de fé, de esperança, de amor e de felicidade a criatura humana perdida pelas suas próprias mãos. Tudo vem a ele, tudo é um nele, porque tudo foi feito por ele e para ele. Que sejam um, disse um dia Ele, como o Pai e o Filho são um.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O mal da distracção

Encontramos nos Apotegmas dos Padres do Deserto o seguinte dito do padre Poimén: “o princípio de todos os males é a distracção”.
Parece um pouco estranho que a distracção seja o princípio de qualquer mal, mas a verdade é que a experiência do dia de hoje me mostrou que tal é de facto verdade, pode ser de facto verdade.
Retirado para um mosteiro beneditino no norte de Portugal, com mais quatro irmãos que me acompanham, tinha-me proposto viver o dia de hoje em silêncio e atento ao bater do meu coração e aos convites do Senhor a estar com Ele. Lá fora o tempo invernal de chuva, trovoada e vento convidava à interiorização, ao silêncio interior, que o próprio mosteiro por si só também já convida. Queria aproveitar esta oportunidade para viver um Natal mais espiritual, de maior intimidade com Deus menino que nasce e desejo que nasça no meu coração.
Mas qual não foi a minha surpresa, ou se calhar nem tanto, quando dei comigo neste silêncio a pensar num conjunto de coisas que tenho para fazer quando regressar a Lisboa, na viagem de regresso e mesmo depois das festas que se aproximam a uma velocidade vertiginosa.
A distracção invadiu-me completamente e assim o silêncio que me tinha proposto fazer para um encontro mais íntimo com Deus neste Advento acabou por ser povoado por um conjunto de preocupações que neste momento de nada me adiantam, uma vez que não as posso solucionar.
É difícil fazer silêncio na nossa vida, não nos deixarmos invadir pelas distracções que nos cercam por todo o lado e impedem o encontro silencioso e profundo com Deus. Necessitamos disciplina, ordem, como também diz Poimén, uma alma sóbria, que não se alcança sem a graça de Deus e sem o exercício quotidiano deste mesmo silêncio e sobriedade de vida.
Que o Senhor tenha misericórdia de nós e nos conceda a graça de encontrarmos o silêncio, nem que seja momentâneo, para experimentarmos o encontro com Ele neste Natal.

Antífona do Ó do dia 21 de Dezembro

Ó Sol nascente, esplendor da luz eterna e sol de justiça: vinde iluminar os que vivem nas trevas e na sombra da morte.

O divino oriente, o sol incriado é a Sabedoria divina, o Filho de Deus que se proclamou luz do mundo. Ninguém conhece Deus sem ele, ninguém chega a Deus senão por ele.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Antífona do Ó do dia 20 de Dezembro

Ó Chave da Casa de David, que abris e ninguém pode fechar, fechais e ninguém pode abrir: vinde libertar os que vivem nas trevas e nas sombras da morte.

O que está encarcerado é o mundo cativo do mal e do demónio, o mundo que vive nas trevas e não possui mais a ciência de Deus. A Cristo senhor, que é a chave do Céu, cabe a tarefa de abrir a porta da luz e da bondade a esse mundo encerrado.

Homilia Domingo IV do Advento

Neste quarto e último domingo do Advento as diversas leituras da Liturgia da Palavra colocam diante dos nossos olhos textos que estão cheios de movimento, de uma acção que pode ser mais prometida para o futuro, que pode acontecer no presente histórico ou que já aconteceu e por isso mesmo é assumida.
O texto da leitura do profeta Miqueias está cheio desses verbos que prometem uma acção para o futuro: de ti Belém sairá aquele que há-de reinar, Deus voltará para o seu povo, Ele se levantará para apascentar o seu rebanho. Estes verbos no âmbito da promessa indicam acções para o futuro, mas indicam também uma acção de Deus, um movimento que se insere na história e na relação com Deus. O ser de Deus, a sua presença e revelação não é assim um vazio, uma inactividade, uma imortalidade no sentido da ausência de vida. Bem pelo contrário, Deus revela-se na história e no seu ser como movimento, como acção para criar, para salvar e para redimir.
Neste sentido não podemos acreditar num Deus inactivo, num Deus desinteressado por nós e pelo devir da história da humanidade. Ainda que por vezes pareça estranho e alheado de todas as necessidades humanas e pessoais Deus continua presente e activo, continua a prometer os seus bens, a sua salvação e a agir para que ela se torne efectiva e concreta.
Mas para que tal aconteça Deus não prescinde da participação do homem, dos homens e das mulheres e é assim que encontramos na leitura do Evangelho de Lucas a caminhada apressada de Maria para a casa de sua prima Isabel. Maria que tinha já aceite ser participe do mistério da Encarnação assume com esta mudança, com esta actividade, uma participação mais activa, mais visível, pois coloca-se ao serviço de alguém que necessita da sua ajuda e colaboração. O mistério invisível do qual ela fazia parte passa desta forma e através da caridade e solidariedade a uma realidade visível e activa, concreta. Quase que podemos dizer que o mistério da Encarnação deixa o nível teórico e desce ao nível prático, ou empírico, através de uma realidade humana que espelha em si mesma o mistério já presente e pressentido.
A caridade, a solidariedade, a atenção ao outro e às suas necessidades espelham o mistério da Encarnação, tornando-o de facto presente e vivo, actual e actuante, facto que não pode deixar de nos colocar em alerta relativamente à nossa caridade e solidariedade, uma vez que é desta forma que podemos tornar ainda hoje real e presente o mistério da Encarnação.
Corroboram estas palavras a leitura da Epístola aos Hebreus, na qual nos é dito que ao entrar no mundo Jesus Cristo, ou seja no momento da Encarnação, Deus não quis sacrifícios nem oblações mas apenas formou um corpo para se exercer nele a liberdade da obediência. É necessário um corpo para haver comunicação, para haver acção, para que o movimento desejado por Deus possa desenvolver-se.
Este quarto domingo do Advento, às portas da celebração do nascimento do nosso Salvador e do mistério da Encarnação que lhe é inerente, coloca diante de nós essa necessidade de um corpo, de um meio de existência, comunicação e comunhão, e a necessidade de actividade concreta a partir desse mesmo corpo e em direcção aos outros corpos, aos outros seres humanos.
Deus deu-nos a todos um corpo, formou-nos um corpo e não foi para o utilizarmos ou desperdiçarmos em holocaustos nem sacrifícios que ofendem a sua divindade e a própria dignidade dessa mesma obra divina que é o corpo, mas para servir de instrumento e meio para o cumprimento da sua vontade. E como nos esquecemos tão frequentemente disto, acabamos por negar o próprio Natal que nos propomos celebrar e celebramos em cada ano, porque o Natal é também comemoração do corpo, do corpo humano que Deus assumiu para nos salvar e mostrar a possibilidade de salvação através dele.
Não necessitamos de muito, Deus não necessita de muito, apenas de no nosso corpo expressarmos o mistério da sua existência e encarnação através da solidariedade e amor que Ele mesmo manifestou ao assumir o nosso corpo humano. De cada vez que o fizermos actualizamos o mistério da Visitação e fazemos que o Natal seja cada dia que o homem se dispuser a tal.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Antífona do Ó do dia 19 de Dezembro

Ó Rebento da raiz de Jessé, estandarte erguido diante dos povos: vinde libertar-nos, não tardeis mais.

Da Sabedoria incriada, Daquele que falou a Moisés na sarça-ardente, chegamos à cepa dos reis de Judá. Dela brotará o rebento que dará o fruto esperado.


"Que grandes são a luz e a dignidade que recebe a alma verdadeiramente enxertada em ti! Oh incomensurável generosidade! A memória empurra a sentir-nos obrigados a amar-te e a seguir as tuas pegadas e doutrina de Cristo. Por isso, o entendimento se detém na mesma luz e contempla. Bem pronto a vontade ama o que o entendimento viu e conheceu. De este modo um ramo oferece ao outro o seu fruto.

De onde tiras, oh árvore, esses frutos de vida, sendo por ti mesma estéril e estando morta? Da árvore da vida, de tal modo que se não estivesse enxertado nela nenhum fruto poderia produzir por mim mesma, porque sou nada."

Oração de Santa Catarina de Sena

Antífona do Ó do dia 18 de Dezembro

Ó Chefe da Casa de Israel, que no Sinai deste a Lei a Moisés: vinde resgatar-nos com o poder do vosso braço.

Adonai, Aquele que é, o Soberano Criador e Senhor. Ele salvou o povo de Israel da servidão do Egipto, ofereceu-lhe a sua lei, protegeu-o através de prodígios grandiosos no deserto. Agora é uma salvação ainda maior, ainda mais universal e que deve ser realizada em todo o mundo, agora é a libertação e salvação de todos e portanto é necessário aplicar todo o poder.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Antífona do Ó do dia 17 de Dezembro

Ó Sabedoria do Altíssimo, que tudo governais com firmeza e suavidade: vinde ensinar-nos o caminho da salvação.

A Sabedoria que sai da boca de Deus é o Verbo, o Filho de Deus, gerado desde toda a eternidade. Esta Sabedoria dispôs com força e suavidade o maravilhoso plano de salvação do mundo. Plano eterno e realizado no tempo pelo Verbo de Deus feito carne.

Antífonas do Ó


A sete dias da noite de Natal a Igreja apela fervorosa a vinda do seu Senhor e Salvador com antífonas próprias para o Magnificat.
São as Antífonas do Ó, que desde o século VI marcam cada dia da semana que nos separa do Natal e que se iniciam com essa letra que assinala a admiração e a expectativa.
A celebração da festa da Expectação de Nossa Senhora, ou da Senhora do Ó, cuja devoção encontramos presente em diversos locais de Portugal, dava início a esta semana. Hoje já não celebramos esta festa mas as antífonas são ainda cantadas no Oficio litúrgico de Vésperas, dando desta forma uma caminhada muito particular a estes dias prévios ao nascimento do Menino.
No seu conjunto, bem como individualmente, estas exuberantes antífonas recordam os traços característicos do Messias. Partindo de Deus, da sabedoria incriada, atravessando os séculos e a história da promessa, terminam no presépio de Belém onde repousa humildemente o Emanuel.
Cantando ou rezando seguimos o percurso da Promessa, descemos do Paraíso, passando pelos Patriarcas e os reis de Judá, para chegar até à doce e humilde serva, a filha de Sião, a Virgem Maria que adora de joelhos o menino como seu Deus e o estreita nos braços como seu filho.
Caminhemos juntos, colocando nos nossos lábios as palavras que podem de uma forma penetrante iluminar a nossa espera como iluminou e suavizou a espera de Maria.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Homilia Domingo III do Advento

O convite de São Paulo aos Filipenses “alegrai-vos sempre no Senhor” marca este terceiro domingo do Advento. É esta alegria que atenua a cor litúrgica do roxo, dando-lhe este tom rosa que colocamos nos paramentos, e que também justifica a denominação de domingo “gaudete”, domingo da alegria, que se dá a este terceiro domingo do Advento.
Contudo, o convite de São Paulo à alegria não é um convite fácil, simples, pois a alegria de que São Paulo fala, a que São Paulo nos convida, é uma alegria que nasce do Senhor uma alegria de bondade, é afinal algo mais que um simples estado de espírito ou de disposição psicológica. A alegria cristã a que somos convidados neste terceiro domingo do Advento é a vitória de um combate e o fruto de um sementeira.
Houve tempos, e certamente ainda há pessoas que pensam assim, em que se considerava que a alegria era uma ofensa a Deus. De alguma forma tinha-se esquecido a recomendação de São Paulo e por uma influência jansenista considerava-se a alegria como um estado contrário ao ser cristão. A mentalidade e a espiritualidade deixaram-se marcar profundamente pela dor e pela tragédia da sexta-feira santa, pelo peso do pecado, por um sentido trágico da vida em que Deus aparece como um tirano e um justiceiro implacável. Não havia lugar nem para a felicidade nem para a alegria pois elas atentavam contra Deus.
Hoje, pelo contrário, a vida cristã e a espiritualidade estão incondicionalmente marcadas pela alegria, pela alegria da manhã de Páscoa e da ressurreição. Contudo, devemos interrogar-nos se esta alegria é verdadeiramente cristã ou um simples estado psicológico. Será que não nos colocámos nos antípodas da espiritualidade jansenista, esquecendo que a alegria cristã é também ela marcada e profundamente marcada pela dor, e não o pode deixar de ser? Resiste, ou resistirá a nossa alegria aos momentos de dor e de deserto em que a vida tantas vezes nos coloca?
A nossa concepção e construção da vida espiritual, da relação com Deus, assenta hoje muito na ideia de bem-estar, de satisfação, na ideia de uma tranquilidade e uma calma incomparáveis, de um estado “soft” em que a alegria é mais uma das manifestações desse mesmo estado. De alguma forma é como se na vida espiritual não houvesse problemas, como se na nossa intimidade e proximidade com Deus ficássemos livres dos problemas. Nesta concepção presume-se que na relação com Deus se elimina todo o mal, desaparecem todos os conflitos, que não existem acidentes.
Ora, a verdade é que não é assim, e a alegria que se vive ou que buscamos viver só pode ser o resultado de uma vitória, de um dom que nos chega de Deus depois de vencermos o combate. A nossa relação com Deus não é uma sesta tranquila, um encontro mágico e prazenteiro, é uma luta de corpo a corpo, como a de Jacob e o anjo ou como a de Jesus no jardim das oliveiras quando teve que confrontar a sua vontade com a vontade do Pai. E quando vencemos e nos vencemos no combate contra o mal então a alegria surge, a alegria verdadeira que é dom de Deus pela vitória alcançada.
Esta luta corpo a corpo torna-se ainda mais acutilante quando se processa na nossa existência comunitária, quando temos que nos relacionar uns com os outros, quando nos vemos confrontados com a necessidade de colocar a questão que as multidões colocavam a João Baptista depois de ouvirem a sua pregação junto ao rio Jordão: “o que devemos fazer” para, vivendo uns com os outros, alcançar a alegria?
A resposta de São João não é propriamente extraordinária, porque de facto o que recomenda, e nos recomenda também a nós, é que nos demos conta daqueles que estão ao nosso lado, que partilham a nossa vida e o nosso mundo, e vivamos na justiça e na solidariedade com eles. São João não pede nenhuma ascese, nem penitências dolorosas, nem exercícios de piedade balofa, mas apenas que partilhemos o que temos e vivamos em justiça, uns com os outros, ou seja, que vivamos a caridade fraterna. E quando vivemos em caridade, quando semeamos a bondade e o amor nas nossas relações familiares, comunitárias, alcançamos também aí o fruto da alegria que é dom de Deus.
A realidade do nosso dia a dia parece no entanto querer contradizer que esta vitória e este fruto sejam possíveis, que aconteçam de facto. Tal deve-se a essa falta de consciência, da nossa parte, daquilo que nos é dito pelo profeta Sofonias “o Senhor teu Deus está no meio de ti”. Acreditamos muito pouco nisto, que Deus está de facto no meio de nós e por essa razão não nos entregamos completamente ao combate contra o mal nem nos deixamos guiar pela bondade na nossa sementeira da caridade. A nossa fé e a correspondente alegria estão ainda manietadas pela ideia de um Deus distante e uma alegria que lhe é ofensiva. Necessitamos por isso de continuar a viver uma conversão que nos transforme, de continuar por mais algum tempo neste Advento preparatório para o nascimento do Senhor e no qual este domingo da alegria é uma paragem alentadora.
Desta forma e nesta caminhada para o Natal, para a celebração da vinda de Deus até nós na nossa condição humana, peçamos a São João que nos alcance de Deus o sentido da sua presença actual entre nós e em nós e a alegria de exultar como ele exultou no seio de sua mãe Isabel perante tal presença.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Homilia Solenidade da Imaculada Conceição da Virgem Maria

Celebramos hoje a Solenidade da Imaculada Conceição da Virgem Maria, uma festa que podemos dizer é um luxo, uma extravagância de Deus, aliás a única a que se deu o direito em todo o mistério da Encarnação.
Os Evangelhos, as Cartas dos Apóstolos, a fé da Igreja, diz-nos que a Encarnação do Filho de Deus é a realização do projecto de Deus para nos resgatar da nossa condição de pecadores, para nos redimir dessa situação em que nos tínhamos colocado depois do pecado do primeiro homem no paraíso. Expulsos dali e marcados pelo sinal do pecado Deus vem ao nosso encontro conforme o prometido para nos reabilitar, para nos retomar e outorgar a condição de filhos, adoptados mas filhos. Todos somos pecadores desde Adão e Deus vem habitar entre nós, fazer-se homem como nós excepto no pecado, para nos libertar a todos dessa condição e desse mesmo pecado.
Neste sentido o mais normal, o mais natural e consentâneo com este mistério e fim da Encarnação, era que o Filho se gerasse numa mulher como o resto da humanidade, uma mulher também pecadora. Podemos interrogar-nos se isso alteraria alguma coisa ao processo de salvação, porque se o Filho assumia tudo o que há em nós, sofria toda a humilhação da nossa condição pecadora e mortal, que diferença fazia humilhar-se ainda mais, para além da morte e morte de cruz, à condição de filho de uma pecadora? A condição imaculada da Virgem Maria era prescindível no plano de Deus para a encarnação do seu Filho.
Contudo, Deus não prescindiu dela e é neste sentido que podemos dizer que é um luxo, uma extravagância, a única a que Deus se deu o direito. E fê-lo porque Deus é um artista, é um perfeccionista, não um mero criador de obras em série, mas um apaixonado por cada obra criada, por cada momento da criação. Deus só faz obras-primas, no verdadeiro e total sentido da palavra. E para a encarnação do seu Filho criou essa obra-prima que foi a Virgem Imaculada, uma virgem não só pura de corpo mas também de alma, para que nela se gerasse uma nova obra, uma nova criação, uma nova história.
Podemos usar neste sentido a metáfora do ramo de flores que um apaixonado oferece à pessoa que ama. Para a amada uma rosa bastaria, o gesto diria tudo, contudo o apaixonado não deixa de levar um ramo de duas dúzias de rosas vermelhas. É um exagero, é um luxo, uma extravagância, mas o sinal visível do amante e apaixonado que o seu amor é único, vai para além de todos os limites do possível e do razoável. Com a imaculada concepção de Maria Deus oferece à humanidade o seu ramo de rosas extravagante, exagerado, mas manifestação do seu grande amor por aqueles que ama e pelos quais vai iniciar uma obra que nada tem de glória, bem pelo contrário, que é um abaixamento total da sua condição divina e toda poderosa até ao ponto do aniquilamento. A imaculada é um gesto de amor, um gesto terno que contrasta com os momentos de dor e sofrimento da paixão, também ela manifestação de amor.
Neste sentido, e numa dimensão distinta temos que olhar para a obra de Deus em nós, porque cada um de nós e à semelhança de Maria é uma obra-prima, uma extravagância e um luxo de Deus. Cada um de nós é um gesto, um sinal e uma presença do amor de Deus. Como respondemos a essa realidade, a essa obra divina em cada um de nós?
O Evangelho de São Lucas que serve à liturgia da Palavra desta solenidade relata-nos a anunciação do anjo Gabriel a Maria. Enviado por Deus, Gabriel faz a Maria uma proposta, uma proposta que também podemos considerar descabida e desfasada no tempo, pois Maria está já comprometida com José. O anjo Gabriel coloca assim Maria numa situação complicada, pois antes desse compromisso seria tudo muito mais fácil, não haveria lugar para dúvidas ou interrogações. Mas agora é necessário fazer uma escolha, e não é uma escolha entre o bem e o mal, é uma escolha entre dois bens, o esposo e um filho. Maria arrisca tudo e escolhe o projecto de Deus, com tudo o que isso significa de risco, de incerteza, de desconhecido e de entrega à absoluta protecção de Deus.
A nós, a cada um de nós, obra de amor, Deus faz as mesmas propostas, umas vezes de optar entre o bem e o mal, mas outras vezes de optar entre bens que não podemos viver em simultâneo. Somos nós capazes de como Maria aceitar o desafio e arriscar tudo com Deus, aceitar viver o desafio de uma obra-prima por vezes incompreendida e rejeitada por aqueles que a contemplam? Maria colocou-se e entregou-se à protecção da sombra do Altíssimo e dessa forma completou em si o projecto que Deus havia já iniciado com a sua concepção imaculada. Possamos e tenhamos nós a coragem de nos entregarmos à protecção de Deus, permitindo que dessa forma se cumpra em nós a obra também imaculada que Deus iniciou connosco quando num momento de paixão amorosa nos criou.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Frei Juan Bautista Maíno

Quando falamos de pregação pela imagem, e de pregadores dominicanos que usaram a pintura para transmitir a Boa Nova de Jesus, logo nos vem à memória o nome de Fra Angélico. Dele recordamos as célebres Anunciações, os frescos do convento de São Marcos de Florença, os encantadores anjos que alegram o paraíso e o juízo final.
Contudo não foi o único e ao longo da história encontramos outros frades dominicanos que através da pintura ou da escultura procuraram expressar a sua fé e a pregação a que estavam vocacionados pela Ordem a que pertenciam.
O Museu do Prado tem desde Outubro passado uma exposição sobre um pintor espanhol, Juan Bautista Maíno, uma figura pouco conhecida quer como pintor quer como dominicano que foi, mas com uma obra tão voluptuosa que é impossível ficarmos indiferentes a ela.
Por essa sua pertença dominicana, por ser também filho de uma portuguesa e ter passado por Portugal aquando da visita de Filipe II em 1619 não podemos deixar de dar notícia dele.
Segundo o registo de baptismo, celebrado em Pastrana, Juan Bautista nasceu em 1581, filho de um italiano de nome Maíno e de uma portuguesa Ana de Figueiredo, ambos sediados na cidade por razões de oficio ligado aos têxteis, facto que se vai repercutir na obra de Maíno e na qualidade da sua representação dos tecidos que vestem as figuras humanas.
Como era habitual na época, e sendo descendente de italianos de uma forma mais fácil, Maíno fez a sua formação em Itália e aí pôde encontrar-se com mestres como Annibale Carracci ou Guido Reni e obras como as de Caravaggio. Pintores que o influenciaram e que na exposição do Museu do Prado podemos também contemplar.
Foram cinco anos de ausência, entre 1605 e 1610, pois em 1611 Maíno está já em Toledo a assinar um contrato para a pintura de frescos na catedral. Um ano depois assina também contrato para um retábulo com os frades de São Domingos do convento de São Pedro Mártir de Toledo. A proximidade e as relações são tão fortes que em 27 de Julho de 1613 Maíno está a professar como religioso no mesmo convento.
O retábulo que pinta para a igreja do convento é hoje a sua maior e mais significativa obra e nela podemos apreciar a adoração dos pastores, a adoração dos reis, o Pentecostes e a ressurreição de Jesus, acontecimentos evangélicos que liturgicamente marcam o calendário das festas cristãs e por isso são conhecidos como as quatros Pascoas. No conjunto o mistério da revelação de Deus aos homens.
Em 1616 o prior do convento de São Pedro Mártir de Toledo, frei António de Sotomayor é nomeado confessor de Filipe II. Sendo o grande protector de Maíno não o deixa para trás na sua mudança para a Corte, na qual Maino aparece como mestre de desenho e pintura do príncipe. É nesta qualidade que acompanha o séquito real que em 1619 vem a Lisboa, na qual tem também a tarefa de tratar da venda de umas casas que pertenciam a sua mãe.
Entre Madrid e Toledo Maíno vai vivendo e exercendo a sua pintura, até que em 1630 se encontra em Salamanca para pintar uma retábulo para o convento de San Esteban, retábulo desaparecido com a exclaustração das ordens religiosas. Alguns anos mais tarde, em 1639, Maíno aparece envolvido nas teias da inquisição, pois Isabel de Briñas, uma mulher acusada de falsa santidade, usava uma miniatura pintada por si. Maíno tem que testemunhar e justificar a pintura que era usada pela mulher.
Em 1649, a 17 de Abril, Maíno é sepultado no convento de São Tomás de Madrid, deixando uma obra diminuta mas rica de pormenores que quase nos apetece tocar para comprovar que são tinta sobre tela e não telas sobre tintas. A escassa produção de Maíno justifica-se por palavras próprias e em função de opções pessoais. Num litígio com douradores, em 1620, Maíno assume-se como pintor, mas acima disso assume-se como sacerdote e frade de São Domingos. Essa era de facto a sua primeira e principal profissão e da qual os quadros dominicanos que pintou não deixam margens para dúvidas.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Homilia Domingo II do Advento

Em cada ano litúrgico encontramos no segundo domingo do Advento a figura de São João Baptista, o precursor do Messias, o enviado a anunciar a sua presença no meio de nós.
Comparando com os evangelistas Mateus e Marcos, Lucas não nos faz no seu Evangelho nenhuma descrição da figura física de João, nem da sua indumentária de pele de camelo ou vida austera e penitente no deserto. Pelo contrário, alarga os seus e nossos horizontes situando João no espaço e no tempo histórico, apresentando aqueles que politicamente governavam o mundo e religiosamente Jerusalém quando João começou a pregar o arrependimento no deserto.
Esta precisão do tempo, do espaço e do contexto político e religioso visa no Evangelho de São Lucas sublinhar a verdade dos acontecimentos, visa sublinhar que o que se relata não é um mito ou uma história para embalar crianças. Esta precisão histórica e política visa sublinhar que se está perante um acontecimento que é mais decisivo que os gestos daqueles governantes, um acontecimento que confronta aqueles mesmos gestos com a sua caducidade e mentira face à revelação de Deus.
A sobriedade descritiva do Evangelho São Lucas tem assim esse objectivo de nos centrar no que verdadeiramente é essencial na figura de João, ou seja, na Palavra que foi incumbido de anunciar. Essa Palavra diante da qual ele se situa, se situam os reis e os poderosos mencionados, e também nós somos convidados a situar-nos.
João recebe da Palavra Eterna a missão de profeta, mas só a leva a cabo no deserto. É necessário um contexto para creditar e certificar a missão atribuída por Deus. São necessários sinais e em João o grande sinal é o deserto. Como Oseias que desposou uma prostituta, a mandado de Deus, para mostrar ao povo santo a prostituição idolátrica a que se tinha votado, também João vai para o deserto para mostrar ao povo o caminho que devia seguir, o caminho da conversão.
O deserto é o mundo sem Deus, é um mundo sem vida, mas é nele que João se apresenta como enviado de Deus e como alguém com uma palavra de revelação. Esta localização geográfica obriga por si mesma a uma conversão, a uma alteração, porque para alguém ir ao deserto é necessário querer ir, é necessário colocar-se em marcha, fazer o percurso até lá. Aqueles judeus que iam ao encontro de João para o escutar tinham obrigatoriamente que abandonar os seus caminhos habituais para se poderem encontrar com ele, para poderem entrar no deserto e ouvir a sua pregação. Abriam-se desta forma a uma conversão possível.
Também nós temos os nossos desertos, os nossos mundos sem Deus e sem vida e necessitamos predispor-nos e obrigar-nos a ir até eles para nos encontrarmos com a revelação de Deus. Se os deixarmos esquecidos, encerrados na sua própria solidão e aridez não haverá possibilidade de conversão. Poderá acontecer-nos o mesmo que ao povo de Israel, que no deserto erigiu o seu touro de ouro para os governar e conduzir. Construíram um símbolo da pujança física, uma idolatria do corpo, um símbolo da produtividade, uma idolatria do dinheiro, um símbolo da fecundidade, uma idolatria da sexualidade, esquecendo-se que ao mesmo tempo e nesse mesmo deserto Deus lhes entregava a sua lei, os seus mandamentos de salvação. Também nós podemos incorrer na mesma tentação se não visitarmos os nossos desertos e nãos nos predispusermos a aceitar aí a Palavra da revelação de Deus.
Porque se o deserto é o mundo sem Deus, é também no deserto que Deus se revela, que Deus se nos pode fazer presente, como se fez presente na pregação de João. Foi ele e ali no deserto, que perante um homem de Nazaré apontou e disse “eis o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”, eis aquele que eu anuncio e por quem tanto anseio, eis aquele que é o nosso salvador e deveis seguir porque eu já cumpri a minha missão.
A voz de João, o seu convite à conversão e mudança de vida, torna-se assim tão sinal profético como o próprio deserto onde João vive a experiência de Deus e cumpre a sua missão.
João fala no deserto, mas não fala de si, nem por si, nem dos outros como o pai sacerdote, a tribo ou os poderes instituídos. João fala da Palavra e pela Palavra, ele é a voz que grita no deserto que os caminhos devem ser aplanados e as veredas endireitadas. O grito de João junto ao Jordão no deserto é a voz da cólera de Deus, uma cólera totalmente distinta da nossa porque nasce da paixão amorosa de Deus pelas suas criaturas enquanto que a nossa nasce da inveja possessiva que nos habita e molda. A voz da cólera, o grito urgente da cólera de Deus traduzir-se-á de forma plena na encarnação do Filho, na Palavra feita carne para nossa salvação e nosso alimento, na Palavra do amor. João faz-se no deserto instrumento e eco dessa voz e ao fazê-lo abala o deserto, irrompe como uma força que coloca em causa o pressuposto e o adquirido. A voz desfaz o deserto.
Como João também nós somos chamados, e de modo especial no Advento, a gritar a presença da Palavra entre nós, a abalar os desertos que nos cercam e esperam uma voz de salvação. E como João não nos podemos contentar com as palavras sussurradas, com as vozes mansas, com as conversas de corredor, não nos podemos contentar em dizer apenas as nossas palavras, as que nos satisfazem ou agradam. O mundo, o deserto em que habitamos, necessita da provocação da Palavra, das palavras que nascem da cólera do amor de Deus por cada um de nós, precisa dos gritos da nossa voz de fé.
Peçamos ao Senhor a força do Espírito para fazermos da nossa vida e das nossas vozes revelação e eco da sua Palavra viva que vem até nós.