domingo, 29 de novembro de 2020

Homilia Domingo I do Advento - Ano B

Queridos irmãos

Estamos a iniciar o Advento, este tempo de caminhada e preparação para a celebração do Natal do Senhor Jesus. Durante quatro semanas vamos procurar preparar o nosso coração para que o Menino que nasceu em Belém nasça também no nosso coração, em cada dia, em cada palavra, em cada gesto.

E ao iniciarmos este tempo e caminhada, o Evangelho de São Marcos que escutámos apela-nos a vigiar, a estar atentos, uma vez que não sabemos quando virá o Senhor. Certamente pela fluidez o tempo, pelo movimento em que vivemos e nos desenvolvemos, inconscientemente remetemos esta vinda do Senhor para o futuro. Contudo, a vinda do Senhor acontece em cada dia, e por essa razão não sabemos a hora.

Na nossa caminhada de fé, como discípulos de Jesus e filhos de Deus vivemos nesta grande amplitude do tempo que já foi, do tempo que virá e do tempo presente. O Jesus que esperamos é o mesmo Jesus que já veio há dois mil anos, e que em cada irmão continua a vir ao nosso encontro.

Assim, o apelo do Evangelho a vigiar não se joga num futuro desconhecido, na perspectiva de uma recompensa no futuro, mas joga-se no presente, no nosso tempo presente. É agora que o Senhor vem e este é o grande desafio.

Corroborando esta ideia de actualidade vemos como Jesus insere uma pequena parábola para nos chamar a atenção, uma parábola que se vai desenvolver nos outros Evangelhos de uma forma mais elaborada. O Senhor partiu e confiou aos seus servos os seus poderes e uma tarefa a cada um. O convite à vigilância e ao cuidado prende-se assim com estes poderes e esta tarefa. Que estou eu a fazer com aquilo que sou e que tenho?

E neste sentido, na busca de uma resposta, não podemos limitar-nos aos dons e talentos de cada um, às oportunidades que a parábola dos talentos nos aponta. Tendo presente a Carta de São Paulo aos Coríntios que escutámos, sabemos que recebemos os dons da graça, não nos falta nenhum, que fomos enriquecidos em tudo pelos mistérios da encarnação e da redenção operados por Jesus Cristo, e por isso a nossa pergunta deve ir ao encontro desta realidade. O que estamos a fazer com a graça divina que nos foi conferida no baptismo e que vamos alimentando em cada Eucaristia, em cada sacramento da reconciliação, com as nossas obras de piedade e misericórdia?

Contudo, na leitura do Evangelho de hoje, as palavras de Jesus vão um pouco mais longe, podemos dizer que se tornam mais radicais, ou no mínimo mais conscientes da realidade da nossa humanidade, quando nos é dito que ao porteiro se mandou que vigiasse. Será o porteiro alguém em particular? Os ministros da Igreja? Ou não estaremos todos incumbidos e envolvidos na mesma realidade e necessidade de vigiar à porta?

A porta é o espaço de fronteira, é o que separa o interior do exterior, o que se pode fechar e dessa forma isolar-nos ou se pode abrir e assim facultar-nos o acesso aos outros e ao mundo. No entanto, é nesse espaço, nessa brecha, que Jesus nos convida a colocar, a estar atentos e vigilantes, e como à beira de uma ravina vamos caminhando atentamente para nos cairmos, mantendo o equilíbrio tantas vezes exigente entre nós e os outros, entre o nosso interior e o mundo.

O convite e apelo a vigiar neste tempo de Advento é assim um convite a olhar, e a olhar atentamente o tempo presente, as oportunidades do tempo presente, e de uma forma equilibrada fazer a caminhada ao encontro de Deus e dos irmãos conjugando o que é melhor, o que é justo e verdadeiro, o que conduz à maior glória de Deus e à nossa santidade.

E neste sentido não podemos deixar de ter presente a metáfora belíssima que o profeta Isaías usa ao falar do barro nas mãos do oleiro e que nós podemos ler em duas dimensões.

A primeira, e que se prende com cada um de nós e as suas acções, a sua busca e caminhada; tal como o oleiro não desiste da perfeição da obra das suas mãos, também nós não devemos desistir de procurar a perfeição, o melhor que há em nós e nos outros, a santidade que Deus colocou no coração e na vida de cada um de nós. O Senhor deu-nos plenos poderes, os seus poderes.

A segunda, que se prende igualmente connosco, mas que tem já Deus como primeiro actor. Tal como o oleiro molda um vaso ou uma jarra perfeita na medida em que o barro está mais maleável, mais elástico, assim também nós nos devemos colocar nas mãos de Deus, de forma maleável, abertos à sua acção transformadora da nossa vida, acolhendo e assumindo os dons da sua graça, dons que nos tornarão irrepreensíveis para a sua vinda, que nos conduzirão à perfeição.

Assim, nesta primeira semana de Advento, nesta preparação de um Natal cujas celebrações serão diferentes do que estamos habituados, procuremos estar vigilantes, atentos, aos dons e graças que o Senhor nos concedeu e concede, aos poderes e missões que nos foram conferidas, maleáveis à sua acção divina em cada um de nós. Se o fizermos, certamente chegaremos junto do presépio do Menino Deus com uns bons presentes para lhe oferecer, os frutos da sua graça santificante nas nossas vidas.

 Ilustração:

1 – Escultura de oleiro com o seu torno, sobreporta da Rue Bayeux, Caen (Calvados) França.

domingo, 22 de novembro de 2020

Homilia Solenidade de Jesus Cristo Rei - Ano A

Caríssimos irmãos

Estamos a celebrar a Solenidade de Cristo Rei, uma solenidade instituída pelo Papa Pio XI em 1925 depois das atrocidades vividas na Primeira Guerra Mundial e a implantação do estado comunista na Rússia; e que visava não só realçar a realeza de Jesus Cristo, mas também o ministério dos leigos no mundo como construtores do Reino de Deus nas mais diversas realidades humanas, como a política ou a economia.

Este conceito e estatuto da realeza de Jesus Cristo não é, contudo, novo, pois na Idade Média encontramos diversas representações de Jesus crucificado e coroado com uma coroa de ouro, como um rei, fruto da própria narração que encontramos no Evangelho, e neste caso em particular do momento da paixão e morte de Jesus e do pedido do bom ladrão, “lembra-te de mim quando estiveres no teu reino”.

Este momento, e este pedido, é paradigmático da realeza de Jesus, uma realeza escondida aos olhos do mundo, mas visível aos olhos do coração e daqueles que procuram a justiça. Todo o Evangelho se constrói, nesta questão, numa espécie de equívoco que visa cegar os que procuram o poder do mundo e iluminar os que procuram a sabedoria e a humanidade.

Já na narração do nascimento de Jesus encontramos este jogo de escondidas, quando os reis vindos do oriente chegam a Jerusalém à procura de um rei que tinha nascido e nada encontram do que buscavam. Será numa manjedoura, envolto em paninhos, que irão encontrar esse rei tão desejado e procurado, num recém-nascido frágil e indefeso, humilde e pobre.

A entrada de Jesus em Jerusalém, aclamado como rei pela multidão, é igualmente uma cena equívoca, pois aquele que é aclamado como rei apresenta-se montado num jumentinho, e uma vez mais numa fragilidade e vulnerabilidade que escondem aos olhos do mundo o poder e a realeza daquele que vem ao encontro da cidade santa com o dom da sua vida, para a sua salvação e redenção de todos os homens.

É esta mesma realidade escondida que nos é apresentada no Evangelho de São Mateus que escutámos, pois tanto aqueles que entram na glória do reino como aqueles que são condenados não sabem dizer nem têm consciência de quando se encontraram ou desencontraram com o Senhor. Quando é que te vimos?

Talvez, por esta razão, não encontremos nos Evangelhos nenhuma descrição física de Jesus, nenhum esboço do seu rosto, pois afinal é em cada um de nós que se encontra o seu rosto, e de modo muito especial após a ressurreição. Na manhã de Páscoa Maria Madalena não reconhece o rosto do amado na figura do jardineiro, no caminho de Emaús os discípulos não reconhecem o caminhante que se junta a eles, nas margens do lago Pedro não reconhece aquele que lhes pergunta se pescaram alguma coisa.

Hoje, e ainda hoje, é desta forma que Jesus se nos apresenta e nos oferece a sua realeza, no rosto dos nossos irmãos, nas suas mãos estendias e nas suas necessidades. É quando vamos ao encontro do outro e das suas necessidade e fragilidades, quando percebemos aí o apelo de Deus, que Ele se nos revela, é nessa humildade e pobreza, nessa fragilidade. A realeza de Jesus é como um vazio que necessita ser preenchido, por algo de nós que partilhamos com o que os outros partilham connosco.

Quanta beleza e poder de Jesus Cristo podemos descobrir na dança alegre e esfusiante de uma criança com trissomia, uma alegria e efusão que nos contagiam, que nos fazem sorrir, que nos ajudam a relativizar os nossos problemas e dificuldades. Como necessitamos ter os olhos bem abertos, os olhos do coração, porque há verdades que só os olhos do coração podem ver.

Olhos que nos permitem ver também que este rei que é Nosso Senhor, caminha connosco, vem ao nosso encontro como o pastor de que nos falava a leitura do profeta Ezequiel, para nos cuidar, para nos reconduzir ao bom caminho, para impedir que nos desgarremos numa noite de nevoeiro, nas incertezas da nossa vida, no desalento e desespero face às dificuldades.

E neste sentido, é bom recordar uma realidade e conceito da época medieval, posteriormente criticado, mas que nos ajuda a perceber esta dinâmica de Deus connosco na sua realeza, e que se trata da chamada vassalagem. Tal como os vassalos colocavam ao serviço do senhor as suas forças e armas, assim o senhor garantia a cada um deles a protecção e a segurança. Havia uma partilha e responsabilidade mútuas, uma corresponsabilidade e fidelidade.

Com Jesus Cristo, Rei do Universo, o processo é semelhante, uma vez que colocando ao serviço da construção do Reino as nossas forças e capacidades, manifestas na vigilância e atenção ao outro, assim o mesmo Senhor coloca ao nosso serviço a sua graça divina para desenvolvermos estas forças e capacidade de modo a sermos acolhidos no seu Reino, como amigos convidados a partilhar do seu banquete.

Assim, nestes dias que nos vão conduzir ao início do Advento e através dele à celebração do nascimento do Filho de Deus feito homem, que o nosso olhar sobre os nossos irmãos seja um olhar vigilante, atento, mas pleno de ternura, para encontrar e reconhecer essa presença real de Jesus em cada um dos homens e mulheres com quem partilhamos a vida. E colocando todas as nossas forças e capacidades em acção, possamos, pelos nossos gestos e palavras em desenvolvimento, transformar um pouco o mundo de modo a que ele seja cada vez mais Reino de Deus.

Ilustração:

1 – Cristo do Calvário de Atienza, Espanha.

domingo, 15 de novembro de 2020

Homilia XXXIII Domingo do Tempo Comum - Ano A

Queridos Irmãos

Estamos praticamente a terminar o ano litúrgico e neste último domingo, antes da Festa de Cristo Rei, a leitura do Evangelho apresenta-nos a chamada parábola dos talentos, um texto certamente conhecido de todos nós e objecto de diversas meditações e reflexões, e sobre o qual muito poderíamos dizer.

Contudo, vamos centrar-nos em apenas alguns elementos sobre os quais se constrói a parábola, mas que nos podem ajudar a viver estes tempos incertos e desafiantes que estamos a viver.

Antes de mais, e como primeiro dado de reflexão, temos de olhar o que o senhor faz, o homem que parte de viagem, que chama os seus servos e lhes confia os seus bens, segundo as capacidades de cada um.

Este homem viajante, o nosso Deus, confia em cada um de nós e entrega-nos os seus bens para que nós os administremos enquanto ele viaja. Este gesto deve ser para nós um motivo de confiança e de esperança, pois Deus acredita em nós, nas nossas capacidades, faz-nos cooperadores do seu património, dos seus bens, conta connosco. Este gesto de Deus deveria levar-nos a uma atitude mais confiante e activa face aos nossos dons e capacidades, às oportunidades que nos surgem na vida.

Esta entrega dos bens, segundo as nossas capacidades, deve levar-nos a amar e a considerar o que somos e o que temos, as nossas capacidades e dons. Quantas vezes não desperdiçamos a nossa vida porque nos distraímos a olhar para o que os outros têm, algumas vezes permitindo até que se gere no nosso coração a inveja.

A questão não é o que os outros têm, mas o que eu tenho e sou, e como faço frutificar esses dons, como os procuro desenvolver para a minha realização e felicidade, e para o bem dos outros e a glória de Deus. Quantas vidas não são vividas, quanta frustração não é gerada, porque se imagina a realização em outro lugar, alcançada de outra forma, e, no entanto, é onde estamos e com o que somos que Deus nos pede que demos frutos.

Um segundo dado a ter presente na nossa reflexão e para a nossa vida é o valor do que é confiado aos servos. Os estudos bíblicos dizem-nos que um talento representava anos de trabalho, pelo que todos recebem incomensuravelmente muito, mesmo o servo que recebe apenas um talento.

Este exagero e excesso de dádiva mostra-nos que não estamos apenas diante de um conjunto de dons e capacidades, de uma realidade meramente humana ou até produtiva, há algo intrínseco ao próprio Senhor que faz a oferta e que não nos dá do que lhe é externo, mas dos seus próprios bens, de si próprio. Esta dádiva exagerada mostra-nos que é o próprio Senhor que se entrega, a sua dignidade e vida divina, e por isso quando os servos entregam o fruto do que lhes foi confiado é dito a um e a outro que tomem parte na alegria do seu senhor.

Na parábola nada é dito da forma como cada um dos bons servos fez produzir o que tinha recebido do seu senhor, apenas há um produto e resultado que é entregue. Desta forma fica ao discernimento e critério de cada um a frutificação do recebido, poderíamos dizer a forma como a vida da graça é vivida, essa confiança e colaboração que Deus conta que assumamos. Diante do exagero do valor confiado, o importante não é a quantidade do produzido, pois o que se poderia entregar face a tão grande generosidade, mas o vivido e realizado com tal valor, a qualidade de vida vivida com o recebido do senhor. Aqui joga-se uma reavaliação das nossas prioridades, o que é afinal fundamental.

Um terceiro elemento a ter presente na leitura da parábola é a questão do medo, pois o servo que recebeu apenas um talento foi enterrá-lo por medo do senhor que colhia onde não semeava. Quantas vezes não deixamos que o medo nos impeça de fazer o que devemos fazer, de usar os nossos dons e capacidades, de viver e testemunhar dignamente a nossa condição de filhos de Deus, de herdeiros do seu Reino, participantes da sua dignidade e glória. Quantas vezes não inviabilizamos a alegria de ser acolhidos na eternidade pelo Senhor porque não vivemos nem somos testemunhas dessa mesma alegria que nos está prometida.

Mas se esconder o talento recebido conduz à morte, esta morte pode também acontecer pela nossa humildade, porque não queremos dar nas vistas, preferimos passar despercebidos, e, portanto, inviabilizamos a realização de todo o potencial que o talento acarreta consigo. Neste sentido convêm recordar o comentário de São Tomás de Aquino sobre este servo da parábola que não foi condenado por ter feito algo de errado, mas por não ter feito o bem com o que tinha e podia. São as omissões que tantas vezes nos esquecemos de confessar quando nos abeiramos do sacramento da reconciliação. Quanto bem não ficou por realizar?

Assim, e nesta linha de pensamento temos que assumir o apelo de São José Maria Escrivá a não nos aburguesarmos, a não nos deixarmos intimidar pela multidão, a combater a tibieza e a preguiça, para que a nossa vida produza verdadeiros e abundantes frutos, para que os dons recebidos e partilhados uns com os outros nos conduzam à plena participação na alegria do Senhor desde já pelo bem realizado.

Ilustração:

1 – Parábola dos Talentos, de Andrey Mironov. (Wikimedia Commons)

domingo, 1 de novembro de 2020

Homilia Solenidade de Todos os Santos

Caríssimos Irmãos

O cântico de entrada da nossa celebração dizia que “vimos para louvar o Senhor”, e se todos os domingos e em cada Eucaristia nos reunimos com essa intenção, hoje o nosso louvor faz eco desse dom que Deus concede a todos os homens, a santidade. Estamos reunidos para celebrar a Solenidade de todos os santos, os que a Igreja reconheceu e reconhece oficialmente e todos aqueles que no anonimato e no silêncio das suas vidas viveram esse grande dom de Deus.

A cada uma das Bem-Aventuranças que escutávamos na leitura do Evangelho podemos facilmente associar um santo, alguém que conhecemos pela hagiografia e no qual reconhecemos a encarnação de cada uma destas palavras de Jesus. Podemos dizer que elas desenham, traçam o retrato de um homem cristão, de um fiel seguidor de Jesus Cristo.

Mas se esta associação é correcta, não podemos deixar de ter presente que as Bem-Aventuranças traçam antes de mais o retrato de Jesus, ele é o primeiro bem-aventurado, o protótipo da nossa vida e busca da plenitude, porque ele foi o que viveu em primeiro lugar e plenamente cada uma destas Bem-Aventuranças. Até a da perseguição e do ódio pela sua própria pessoa, que por momentos parece que nos vai caber a nós também viver.

Contudo, muitas vezes, procuramos viver as Bem-Aventuranças como uma realidade negociável, numa óptica da remuneração e recompensa, pois se procuramos a verdade ou a justiça temos uma promessa de felicidade na eternidade à nossa espera. Outras vezes, e ainda nesta mesma linha, vivemos as Bem-Aventuranças como uma necessidade de sofrimento, uma via dolorosa que associamos inerente ao seguir Jesus, ao carregar a cruz, neste mundo, para depois podermos gozar da felicidade eterna.

Face a esta perspectiva, não é de todo descabido recordar o que nos dizia o frei Bernardo enquanto estava entre nós, sobre a qualidade da vida eterna e a sua dependência e relação intrínseca com a qualidade da nossa vida neste mundo. É a qualidade que procuramos colocar nesta vida, através da verdade, da justiça, do amor que vivemos, que nos alcançará a qualidade da vida eterna.

As Bem-Aventuranças são assim um convite a procurar fazer e viver como Cristo Jesus, são como que uma espécie de oito vias para nos assemelharmos a Deus na sua divindade feita humanidade para nossa instrução. Há assim um caminho para cada um, um processo, que cada um pode desenvolver e traçar na sua própria identidade e na fidelidade à graça que recebeu no baptismo e de que a simbólica que encontramos na leitura do Livro do Apocalipse nos faz menção.

Tal como encontramos na leitura do Livro do Apocalipse, no baptismo fomos marcados com o selo de Deus, com o sinal da cruz logo no início da celebração do sacramento, depois fomos purificados no sangue do cordeiro e como símbolo dessa vida nossa e dignidade inerente é-nos dada uma veste branca que devemos apresentar sem mancha na vida eterna. Como nos recordava a leitura da Primeira Carta de São João, que também escutámos, passamos a ser filhos de Deus, de uma forma misteriosa, mesclada na nossa fragilidade pecadora, mas que se manifestará um dia na sua plenitude, quando formos semelhantes a Deus, quando o pudermos ver cara a cara.

No Evangelho as Bem-Aventuranças são uma nova lei, uma nova orientação, que não visa tornar o mundo um pouco mais suportável na expectativa de um futuro, de uma eternidade, mas visa tornar o mundo melhor, aqui e agora. As Bem-Aventuranças são uma proposta de vivermos como Jesus e com Jesus e nele saborear a beleza e a grandeza dos momentos presentes.

Os santos que hoje celebramos foram homens e mulheres que tiveram esta capacidade, diríamos esta inteligência, de se perceberem consagrados pelo amor de Deus e por causa desse mesmo amor procuraram saborear na vida todos os momentos com fé, com verdade, com esperança, na fidelidade. E este é o grande desafio que nos deixam, de não deixarmos de acreditar no amor de Deus e de procurar olhar todas as realidades com os olhos amorosos e confiantes de Deus.

Se eu der o melhor de mim, se fizer o melhor que sei, sempre com amor e esperança, a santidade de Deus estará a desenvolver-se em mim e naqueles com quem partilho a vida.

Ilustração:

1 – Coroação da Virgem Maria, Fra Angélico, Uffizi, Florença.

2 – Juízo Final (Pormenor), Fra Angélico, Gemaldegalerie, Berlim.