sábado, 10 de março de 2012

O pai suplicava-lhe que entrasse (Lc 15,28)

A parábola do filho pródigo, como é comummente conhecida, é um texto ao qual vale sempre a pena regressar. Apesar de tudo o que já foi escrito e dito sobre esta parábola de Jesus há sempre algo de novo que nos chama a atenção, há na nossa vida qualquer realidade que merece ser confrontada com o pai e os filhos, as atitudes de cada um.
Neste sentido, é interessante meditarmos na atitude do pai face a um e outro filho, e mais precisamente sobre o silêncio relativamente ao filho mais novo e as palavras de responsabilidade face ao filho mais velho.
Quando o filho mais novo se dirige ao pai, depois de este já o ter abraçado e beijado, dizendo: “pai pequei contra ti e contra os céus, já não mereço ser chamado teu filho”, o pai não lhe dirige qualquer palavra, não lhe condena qualquer atitude, não lhe dá qualquer resposta, mas dirige-se aos servos ordenando que cuidem do filho e preparem a festa.
À luz da atitude do filho, do regresso a casa, com tudo o que isso comporta de humildade, de reconhecimento das faltas, o pai que sempre tinha esperado o regresso do filho não lhe podia dizer nada, não o podia condenar nem prender na culpa já assumida. Afinal o passo mais importante estava dado e qualquer palavra era supérflua.
Para nós, para cada um de nós que se sente um pouco como este filho de regresso a casa do Pai, ou querendo regressar à casa do Pai, é reconfortante saber que para além dos braços abertos nos espera a compreensão, o silêncio face aos nossos desvarios e pecados. Não nos serão atirados em cara os nossos pecados, as nossas faltas, o passado já sem utilidade, porque para o Pai o verdadeiramente importante é o regresso, é a possibilidade de fazer a festa face à conversão.
Perante isto surge de facto a questão de sabermos porque não encetamos o caminho de regresso, afinal que medo nos tolhe para não acorrermos aos braços estendidos do Pai.
A atitude do pai face ao filho mais velho é no entanto completamente oposta, pois ao silêncio para com o filho mais novo contrapõe-se a palavra e a palavra persuasiva e suplicante.
O filho mais velho não tinha perdido nada, não tinha desperdiçado nada, gozava da companhia do pai e tudo o que era do pai também lhe pertencia, e neste sentido estava em perfeita comunhão com o pai. Portanto não tinha razão para não participar da alegria do pai, para não se alegrar com o irmão que voltava vivo. A alegria do pai deveria também ser a dele como tudo o demais também era.
Deste convite do pai ao filho mais velho deriva o convite que Deus nos faz a cada um de nós na medida em que vivemos na intimidade do Pai, em que partilhamos dos seus bens. A nossa participação no património, a nossa presença e vida na casa do Pai deve levar a alegrar-nos com o regresso dos filhos ausentes e distantes, deve levar-nos a partilhar do seu silêncio e do seu perdão, porque o importante é o regresso do que estava perdido, é o reencontro.
Convite um tanto ou quanto difícil na medida em que consideramos o outro como uma ameaça ao nosso património, mas altamente gratificante quando consideramos que a nossa riqueza e relação só existe na mesma medida em que acolhemos e aceitamos o outro.
Que o convite do pai à alegria seja hoje o convite que escutamos de Deus também a cada um de nós.

Ilustração: “O regresso do filho pródigo”, de Pompeo Batoni, Kunsthistorisches Museum, Viena.

3 comentários:

  1. Frei José Carlos,

    Muito grata,pela parábola do Evangelho de S.Lucas,espectacular como teceu esta maravilhoso texto que partilhou connosco.Faço minhas as palavras do Frei José Carlos.Para nós,para cada um de nós que se sente um pouco como este filho de regresso a casa do Pai,ou querendo regressar à casa do Pai,é reconfortante saber que para além dos braços abertos nos espera a compreensão,o silêncio face aos nossos desvarios e pecados.Não nos são atirados em cara os nossos pecados,as nossas faltas,o passado já sem utilidade, porque para o Pai o verdadeiramente importante é o regresso,é a possibilidade de fazer a festa face à conversão.A alegria do Pai deveia também ser a dele como tudo o demais também era.Que o convite do pai à alegria seja hoje o convite que escutamos de Deus também a cada um de nós.Obrigada,Frei José Carlos,pelas palavras reconfortantes que nos ajudam a Meditar mais profumdamente.Fiquei maravilhada ao ler este belo texto.Desejo-lhe uma boa semana.Que o Senhor o ajude e o ilumine.Bem-haja.
    Um abraço fraterno.
    AD

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  2. Frei José Carlos,

    O texto da Meditação que elaborou e que oferece-nos a oportunidade de partilhámo-lo é muito profundo e muito belo. Como começa por dizer-nos a parábola do filho pródigo “é um texto ao qual vale sempre a pena regressar (…) há na nossa vida qualquer realidade que merece ser confrontada com o pai e os filhos, as atitudes de cada um.”
    Em cada um de nós há um filho pródigo mas existe simultaneamente algo de que Frei José Carlos nos fala: a necessidade do perdão, da compreensão no regresso …”Para nós, para cada um de nós que se sente um pouco como este filho de regresso a casa do Pai, ou querendo regressar à casa do Pai, é reconfortante saber que para além dos braços abertos nos espera a compreensão, o silêncio face aos nossos desvarios e pecados. Não nos serão atirados em cara os nossos pecados, as nossas faltas, o passado já sem utilidade, porque para o Pai o verdadeiramente importante é o regresso, é a possibilidade de fazer a festa face à conversão.”…
    Porém, na parábola, há um irmão mais velho, no qual nos vemos representados, nos nossos egoísmos, nas nossas cegueiras e inflexibilidades.
    Como nos salienta …” A alegria do pai deveria também ser a dele como tudo o demais também era.
    Deste convite do pai ao filho mais velho deriva o convite que Deus nos faz a cada um de nós na medida em que vivemos na intimidade do Pai, em que partilhamos dos seus bens. A nossa participação no património, a nossa presença e vida na casa do Pai deve levar a alegrar-nos com o regresso dos filhos ausentes e distantes, deve levar-nos a partilhar do seu silêncio e do seu perdão, porque o importante é o regresso do que estava perdido, é o reencontro.”….
    Grata, Frei José Carlos, pela partilha, maravilhosamente ilustrada, por nos recordar que o reencontro é possível e recebido com alegria se formos capazes de considerar que o outro não constitui uma ameaça ao nosso património, ...” quando consideramos que a nossa riqueza e relação só existe na mesma medida em que acolhemos e aceitamos o outro.”
    Que o Senhor abençõe e guarde o Frei José Carlos.
    Votos de um bom domingo.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

    P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe de novo o texto de uma oração.

    É BOM
    SABER QUE
    ESPERAS
    POR TODOS

    Senhor, ninguém vive tão à espera como Tu!
    Na Tua misericórdia esperas por todos: pelos que estão longe e pelos que estão perto.
    Pelos que se lembram e pelos que têm o coração submerso no esquecimento mais fundo.
    Pelos que todos os dias te rezam: “Vem, Senhor” e por aqueles cuja oração é uma ferida
    silenciosa, um tormento ou uma revolta. É bom saber que esperas por todos.
    E que na imensidão compassiva da Tua espera, cada um pode reaprender o sentido verdadeiro da esperança.

    (In, Um Deus Que Dança, Itinerários para a Oração, José Tolentino Mendonça, 2011)

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  3. Frei José Carlos, Shalom!
    Sou pastor em uma pequena cidade do estado de São Paulo-Brasil. Quero louvar a Deus e agradecer-lhe pelas inspiradas mensagens que muito tem me abençoado. Deus o proteja e o a bençoe cada vez mais, em Cristo, Pr.Dirceu Pereira (prdirceu@yahoo.com.br).

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