quarta-feira, 11 de abril de 2012

Receita de Emaús (Lc 24,13-35)

Antes de mais tenho que dizer que a ideia desta receita me foi sugerida pelas Dominicanas do Mosteiro de Beaufort, em França, por uma meditação que prepararam para a “lectio divina” do dia de hoje. Segundo elas é uma receita fácil de realizar, simples e acessível a qualquer um e portanto a todos.
Iniciamos a preparação desta iguaria, deste prato sublime, apresentando a Deus a nossas incompreensões, as nossas dúvidas, os desesperos e desilusões. Afinal tudo aquilo que nos leva a afastar de Jerusalém como os dois discípulos.
Depois juntamos a esta apresentação, a esta nossa situação de caminho para longe, o encontro com o desconhecido, um desconhecido que se nos junta no caminho e nos abre a compreensão à Palavra de Deus e de modo muito particular ao mistério da paixão, morte e ressurreição de Cristo. Afinal todos nós estivemos ali presentes.
Misturados muito bem estes dois ingredientes, a nossa dor e derrota com a dor e a vitória de Cristo graças ao amor, podemos juntar a hospitalidade, esse convite a que o outro fique connosco.
Este último ingrediente é a mistura de outros dois ingredientes, a hospitalidade do totalmente outro com a hospitalidade dos outros, dando assim origem a uma substância que confirma a presença de cada um dos ingredientes aglutinados.
Podemos então levar ao forno e deixar cozer, deixar o coração arder de desejo para que a massa cresça, o amor se desenvolva, reconhecendo a presença do fermento de Cristo em nós, nos outros, na Igreja e na Eucaristia.
Como muitas outras receitas, esta receita não tem contra-indicações e pode ser consumida sem qualquer moderação em qualquer idade e situação, seja verão ou inverno, faça sol ou faça chuva.

Ilustração: “Ceia de Emaús”, de aluno de Caravágio, Kunsthistorisches Museum, Viena.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    Depois de um dia longo divido entre várias ocupações e algumas preocupações como dizem que só as mulheres sabem fazer, entristecida ao final da tarde pela notícia da morte trágica, no Domingo de Páscoa de um vizinho que há cerca de vinte sete anos vimos iniciar os primeiros passos e balbuciar as primeiras palavras, quando finalmente consegui reservar no silêncio da noite um tempo para Jesus e iniciei pelo blog do Frei José Carlos, a originalidade da “receita” do texto da Meditação que nos oferece consegue fazer-me sorrir e ficar a reflectir. Que interessante e profunda preparação da “Ceia de Emaús” e do seu significado, Frei José Carlos.
    Todos os ingredientes estão lá: as nossas fraquezas que não receamos apresentar a Deus, ...” as nossas incompreensões, as nossas dúvidas, os desesperos e desilusões”(...), “o encontro com o desconhecido, um desconhecido que se nos junta no caminho e nos abre a compreensão à Palavra de Deus e de modo muito particular ao mistério da paixão, morte e ressurreição de Cristo” (…), “a nossa dor e derrota com a dor e a vitória de Cristo graças ao amor, podemos juntar a hospitalidade, esse convite a que o outro fique connosco.”…
    E depois de tudo aglutinado, como nos salienta ...”Podemos então levar ao forno e deixar cozer, deixar o coração arder de desejo para que a massa cresça, o amor se desenvolva, reconhecendo a presença do fermento de Cristo em nós, nos outros, na Igreja e na Eucaristia.”…
    Peçamos ao Senhor que no nosso peregrinar reforce a nossa fé e esperança e à semelhança dos discípulos de Emaús façamos a experiência do encontro com Jesus ressuscitado, na escuta, compreensão, e na prática da Palavra de Deus, no amor que se partilha com o outro, na simplicidade dos gestos de fraternidade e de serviço.
    Um grande obrigada, Frei José Carlos, pela partilha da Meditação, profunda, original na abordagem. Que o Senhor o ilumine e abençõe.
    Continuação de uma boa semana.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva


    P.S. Permita-me que partilhe um poema de Frei José Augusto Mourão, OP.

    Cléofas


    nós somos o companheiro sem nome de Cléofas/fazendo estrada com o invisível/a quem interrogamos//

    nós mendigamos palavras/que nos toquem a alma/e nos desentorpeçam do peso/do sofrimento e da cegueira//

    em nós permanence a necessidade de compreender/quer dizer antes de ver/o estigma, a marca que atravessou/
    a carne do crucificado//

    nos brancos do silêncio escutamos/o sopro do ressuscitado/que inscreveu em nós a ordem/da luta contra o mal/
    e a recusa do processo da vítima/que acaba na Cruz//

    que o Espírito dos caminhos/ solte a nossa língua/com ele quebremos o círculo infernal/da substituição sacrificial/
    o ídolo visível/a fachada//

    arrisquemos a palavra alegria/ou a palávra páscoa/e ajoelhemo-nos/às portas do silêncio e da misericórdia


    (In, “O nome e a Forma”, Pedra Angular, 2009)

    ResponderEliminar