Estamos a celebrar o
domingo do Bom Pastor. Jesus apresenta-se no Evangelho de São João, que
escutámos, como o Pastor que abre a porta às ovelhas, que chama cada uma pelo
seu nome, e que depois de as ter feito passar pela porta segue à frente delas
até às pastagens abundantes.
Ao comentar o Evangelho
deste domingo prestamos uma especial atenção a dois pormenores, que encontramos
igualmente presentes em outros contextos e circunstâncias do mesmo Evangelho de
São João.
O primeiro deles prende-se
com o chamar pelo nome; Jesus, o Bom Pastor, chama cada uma das ovelhas pelo
seu nome. Facto importante, porque não somos mais um número, mais um elemento
na anonimato da massa, mas uma pessoa, alguém com o qual se estabelece uma
relação.
Podemos ver a
importância deste chamar pelo nome no episódio de Zaqueu, que Jesus desconhecia,
mas que interpela pelo seu nome ao convidar a descer da árvore porque desejava
ficar em sua casa. A nossa busca de Deus, o nosso desejo de ver Jesus, é já uma
porta aberta para escutarmos o nosso nome, para o estabelecimento de uma relação
pessoal e única com Jesus que vem ao nosso encontro.
Outro momento
importante para o chamar do nome é o encontro de Maria Madalena com Jesus
ressuscitado. É o pronunciar do nome que desperta para a realidade, para a nova
presença e a nova relação que é necessário estabelecer. Quando aquele que parece
um jardineiro pronuncia o nome de Maria há toda uma realidade relacional que se
reaviva, que podemos dizer ressuscita. Maria Madalena reconhece Jesus pelo seu
nome pronunciado.
Assim, e nas circunstâncias
em que nos encontramos, na nossa busca de fidelidade, de conhecimento de Jesus,
não podemos deixar de estar atentos ao apelo que Jesus nos lança, ao nome por
que nos chama para o seguir, para o acolhermos e para o reconhecermos na nova
realidade da sua ressurreição.
Ainda neste sentido,
não podemos esquecer que o Apocalipse nos apresenta um livro onde estão
inscritos todos os nomes, os nomes daqueles que seguiram o cordeiro, no
contexto desta leitura do Evangelho o Pastor, que foram capazes de perceber o
apelo ao seguimento. A cada um é dado um nome novo, um nome que deriva dessa
relação pessoal e única com o Pastor e que apenas cada um conhece. Procuremos pois
escrever o nome novo com Jesus.
O segundo pormenor, a que
necessitamos dar atenção neste contexto do Bom Pastor, é a realidade abundante
a que o pastor nos conduz. Por várias vezes e em circunstâncias diversas a
abundância da graça e da vida é-nos apresentada pelo Evangelho.
Podemos vê-la nas
bodas de Caná, não só no transbordar das talhas de onde sai o vinho novo, mas
também na qualidade excelente desse mesmo vinho. Podemos vê-la na conversa com
a Samaritana junto ao poço de Jacob e à qual é prometida e oferecida uma água
viva, uma fonte que jorra para a vida eterna, que como sabemos provoca um
grande equívoco na pobre mulher. Podemos vê-la no milagre da multiplicação dos
pães, quando no final e depois de todos saciados ainda sobram doze cestos de
pedaços.
Inquestionavelmente o
Bom Pastor conduz-nos às pastagens verdejantes, às águas cristalinas, à
abundância da vida e por isso não nos podemos distrair com as outras ofertas,
com os salteadores e ladrões que nos prometem oásis de delícias mas que depois
experimentamos serem puras miragens.
A confiança e a fé de
que a promessa não é publicidade enganosa assentam nas palavras de São Pedro,
entre outras, que escutámos na Segunda Leitura. Nós fomos curados pelas suas
chagas, ele suportou os nossos pecados no madeiro da cruz para que vivamos para
a justiça, para que não mais tivéssemos que nos perder pelo deserto em busca de
alimento, porque ele se fez nosso alimento, nosso guarda e protector.
Assim sendo, temos que
estar atentos às diversas ofertas de felicidade que se nos apresentam a cada
esquina, a cada paraíso que nos é oferecido nas imagens e slogans da
publicidade. É verdade que estamos destinados à felicidade, que a devemos
buscar, mas também devemos estar conscientes que ela é exigente, que não se
alcança por um passo de mágica, que exige esforço e aplicação, uma disposição para
a verdade e para a iluminação do espirito. A felicidade é uma conquista.
Neste sentido, e nesta
busca de felicidade a que todos aspiramos, não podemos deixar de recordar que
hoje se celebra também o dia mundial de oração pelas vocações. Aquele e aquela
que descobrem a sua vocação encontram-se com a felicidade, com um processo de
esforço e aplicação que desde o primeiro momento tem por horizonte a realização
plena. Assim, tudo o que faz e que até pode custar e implicar sofrimento é
relativo face ao fim a que se destina.
Todos sabemos como passamos
por dificuldades a nível das vocações sacerdotais e religiosas, não há
sacerdotes para celebrar os sacramentos, nem religiosos para testemunhar a
alegria do Reino construído na fraternidade. Contudo, e como nos recordava
ainda há tempos o Papa Francisco a falta de vocações consagradas deve-se antes
de mais à falta de vocações para a família.
Faltam hoje no mundo
homens e mulheres que assumam a vida familiar, a constituição de uma família
como uma vocação divina, como um processo para a realização e a felicidade do
casal, mas igualmente como uma manifestação da vida divina, da presença e da
história de Deus com os homens. São Paulo recorda-nos isso quando nos diz que o
amor entre o homem e a mulher é uma manifestação do amor de Cristo pela sua
Igreja. Um amor pessoal, um amor com nomes e apelos sinceros, um amor de
entrega total, um amor para a vida em abundância.
Celebramos também hoje
o dia da Mãe, e por isso não posso deixar de lançar este apelo às mães e pais
aqui presentes. A vocação a que Deus vos chamou foi a de ser pais e mães, procurai
sê-lo com sentido divino, formando os vossos filhos para enfrentar os desafios
do mundo, mas formando-os também na escuta e na relação com Deus. Que o vosso
amor conjugal e o amor pelos vossos filhos sejam testemunhos da transfiguração
operada pela passagem de Jesus Cristo nas vossas vidas.
Jesus é a porta por
onde devemos passar. Ele é a nossa salvação. Que o vosso amor, e o amor de cada
um de nós, estejam marcados indelevelmente pela santidade desta passagem.
1 – “Parábola de Jesus Bom Pastor”, de Marten van Valckenborch, Kunsthistorisches Museum, Viena de Áustria.
2 – “O Bom Pastor”, de Bartolomé Esteban Murillo, Museu do Prado, Madrid.
Ser chamado pelo nome é algo a que muitas vezes não damos atenção e que, no entanto,devia marcar a nossa vida e a nossa actuação.É que nós não fazemos parte duma multidão anónima. A cada um de nós Deus conhece com as suas qualidades e defeitos, potencialidades e fraquezas. E é em face de tudo isso que Ele nos chama, nos perdoa e nos acolhe.O nome porque Deus nos conhece é o conjunto de dons que recebemos e a que temos que corresponder. Não podemos esquecer esta grande realidade: Deus chama cada um pelo seu nome. Inter pars
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