Estamos a terminar o
tempo do Natal, e a Solenidade da Epifania coloca-nos diante desse grande
mistério da revelação de Deus aos homens no mistério da Encarnação. Deus faz-se
carne da nossa carne e os magos vindos do oriente para adorar o Menino
revelam-nos que esse mistério, que essa encarnação, se dirige a todos os homens
e a todos os tempos.
Nesse sentido, é bom
que tenhamos presente duas realidades que trespassam os textos da primeira
leitura do Profeta Isaías e o Evangelho que escutámos, como são o desafio da
superação da desilusão, e a grandeza divina da realidade quotidiana.
O texto do profeta
Isaías que escutámos faz eco de um momento delicado da história do povo de
Israel, pois assiste-se ao regresso do povo à sua terra depois do exílio na
Babilónia. Foi um momento de grande euforia, de grandes esperanças e alegrias.
Contudo, o choque com a realidade, com a pobreza, com a destruição do templo e
a incapacidade imediata de o reconstruirem, gerou uma grande desilusão e
frustração. As expectativas estavam longe de serem alcançadas.
É neste cenário,
perante este espirito de um certo derrotismo, que o profeta vem lançar o seu
grito de esperança, que desafia o povo a não perder a esperança, bem pelo
contrário a reanimá-la e a reforçá-la pois algo maior ainda está para
acontecer. Aqueles que acreditarem e perseverarem na esperança do cumprimento
das promessas divinas não só reconstruirão o templo como verão afluir a ele
todos os povos e os tesouros das nações.
A chegada dos magos a
Jerusalém e a inexistência de qualquer recém-nascido no seio da família real
deve ter provocado também uma desilusão, pelo menos num primeiro momento.
Ter-se-iam equivocado na sua busca? Teria sido em vão todo o esforço da viagem?
Inadvertidamente Herodes vai servir de reanimador da esperança, vai servir de
ponte à frustração do desencontro, e vai reencaminhar a esperança daqueles
homens para o que vinham buscar desde longe. Afinal as Escrituras confirmavam a
busca em que se tinham envolvido.
Esta realidade da
frustração, da desilusão face às expectativas que construímos, pode também
acontecer connosco, com cada um de nós e nas mais diversas situações da vida,
no nosso mundo profissional, nas nossas relações afectivas, na nossa própria
relação e expectativa face à acção de Deus. Num primeiro momento podemos viver
como se tudo se fosse realizar como idealizado, sonhado, e depois
confrontarmo-nos com uma realidade bem diferente.
As leituras do profeta
Isaías e do Evangelho de São Mateus dizem-nos que não podemos cruzar os braços,
que não podemos perder a esperança. São naturais as expectativas, são luminosos
e gratificantes os primeiros momentos, mas também existem os desafios que se
lhes seguem, as dificuldades que necessitamos enfrentar e superar. E é quando
continuamos a viver na esperança, a lutar por acreditar, que fazemos a
experiência do extraordinário que estava ao virar da esquina. Para os magos foi
a estrela que novamente se iluminou e os conduziu ao lugar onde se encontrava o
menino. Continuar a acreditar, manter viva a esperança, faz-nos encontrar a luz
que nos guia à realização plena.
Realização plena que
não se encontra no alto dos céus, nem na profundidade dos mares, acessível
apenas a alguns eleitos. A realização encontra-se presente no nosso dia-a-dia,
na nossa casa, nessa casa a que os magos se dirigiram e onde encontraram o
Menino Rei que procuravam. É no nosso quotidiano, nas nossas realidades mais
simples e básicas, que nos podemos encontrar com Deus, que lhe podemos oferecer
o que de melhor temos.
Seria certamente
diminuto o sentido do mistério da encarnação, do Filho de Deus se fazer carne
da nossa carne, homem como todos os homens excepto no pecado, se não fosse para
nos mostrar que é na nossa condição humana que se encontra o caminho para a
nossa realização plena, para a nossa felicidade, iniciada aqui e agora através
do bem e do amor, da verdade e da justiça com que vivemos e que nos projecta na
eternidade.
Deus manifesta-se na
nossa humanidade para a divinizar, em todas as dimensões, em todos os tempos e
em todos os lugares, e os magos que procuram o Menino representam-nos a todos
neste processo de busca e encontro. Deus vem ao nosso encontro se partirmos
também ao seu encontro. E quando tal encontro acontece, regressamos
inevitavelmente como os magos por outro caminho, o caminho da nossa humanidade
divinizada, o caminho da consciência da nossa identidade divina.
Procuremos pois manter
acesa a nossa busca, assim como a esperança de a levar a bom termo, pois é essa
esperança que nos conduz. Tal como diz o poema de São João da Cruz somente a
sede nos ilumina na busca da fonte, “de noche iremos, de noche, que para
encontrar la fuente, solo la sede nos alumbra”.
“Adoração dos Magos”, de Andrey Mironov.
Obrigada,Frei José Carlos pela maravilhosa partilha desta Meditação.Gostei muito.Que o Senhor o ilumine e o proteja.Bem-haja.
ResponderEliminarUm abraço fraterno.
AD