A primeira leitura e o Evangelho deste penúltimo domingo do ano litúrgico apresentam-nos a realidade do fim dos tempos, do fim da história e da humanidade.
Alguns filmes, como o “2012” que estreou esta semana, baseado em profecias diversas, apresentam-nos visualmente esse fim e como estamos marcados por essa mentalidade, essa concepção de um fim catastrófico, trágico, em que tudo e todos serão aniquilados.
A leitura da profecia de Daniel e o discurso de Jesus no Evangelho de São Marcos que escutámos estão alicerçados também nesta concepção, nesta ideia que surgiu no mundo bíblico por volta do século segundo antes de Cristo e que apenas tinha como objectivo dar uma resposta imediata e esperançada para as angústias dos que viviam aqueles tempos difíceis da perseguição, da exploração e da escravatura imperial. Os maus, os que violentavam e exploravam não seriam os vencedores finais.
Contudo, tanto a profecia de Daniel como as palavras de Jesus convidam-nos a olhar mais para além dessa realidade, dessa dimensão catastrófica e trágica, convidam-nos à esperança e a um estilo de vida que deve estar pautado por este fim ao qual todos estamos destinados, mas que não nos deve de modo nenhum condicionar nem privar da liberdade de acreditar e viver para além dele.
A profecia de Daniel diz-nos que o fim será um tempo de angústia, mas também nesse tempo e no meio dessa angústia virá a salvação, para aqueles que estiverem inscritos no livro de Deus. Nas palavras de Jesus serão os seus eleitos que serão reunidos dos quatro pontos cardeais, depois de um tempo de aflição. Ora, perante isto o importante não é o tempo, o acontecimento, mas a condição e o estatuto em que cada um for encontrado, porque como também nos diz Jesus ninguém sabe a hora nem o dia desse acontecimento final.
Na profecia de Daniel os sábios resplandecerão como a luz e os que tiverem ensinado o caminho da justiça serão como as estrelas. Assim, o que verdadeiramente conta nesse momento final é a sabedoria e a justiça, a sabedoria com que tivermos vivido e a justiça que tivermos praticado e ensinado a praticar. Nas palavras de Jesus esta sabedoria e justiça traduz-se nessa capacidade de discernimento de perceber nos sinais dos tempos, no rebentar da folha da figueira, o que verdadeiramente se está a passar e como Deus está a agir no mundo, e como nós podemos colaborar nessa acção.
E quando olhamos os sinais dos tempos e tentamos perceber o que significam, não podemos esquecer que tanto o mundo em que vivemos, como as pessoas que somos, são obra do amor de Deus, são fruto do seu amor e da sua misericórdia, e que Deus nunca abandonou a história a que deu origem a partir da primeira obra da criação, que tem estado presente, está presente e actuante, e mais que tudo interveio na história através da incarnação do seu Filho para nos libertar dessa mesma condição trágica de finitude a que estávamos condenados pelo pecado.
A encarnação de Jesus Cristo, a sua vida, paixão morte e ressurreição são o sinal mais inequívoco de que Deus quer saber de nós, não nos quer condenados, nem nos condena ou castiga a um fim trágico e aniquilador. Deus não abandonou a história do homem, não abandona a nossa história pessoal, nem deixa que um fim aniquilador se abata sobre nós.
Contudo, e para que seja assim, não podemos viver longe da verdade nem na injustiça; bem pelo contrário, temos que procurar em cada momento da nossa vida viver como sábios, como homens e mulheres que conscientes da sua liberdade e fim vivem com responsabilidade. As alterações climáticas a que estamos assistindo mostram-nos tal qual um sinal vermelho dos semáforos como levámos já longe a nossa irresponsabilidade na administração dos recursos naturais, da conservação das espécies e bens comuns da humanidade, e como é necessário inverter a marcha para que não terminemos numa catástrofe. Paralelamente, as violações das leis, a corrupção, a falta de verdade e transparência, a ganância e a mentira, mostram-nos como estamos à beira de um colapso das estruturas e mecanismos que construímos fundados na liberdade, no reconhecimento mutuo dos direitos e deveres. Os atentados à vida, como o aborto e a eutanásia, a desestruturação da família, a falta de valores que norteiem a educação e formação das crianças e jovens, a relativização de todo e qualquer valor moral ou ético, estão a conduzir-nos a outro fim que é o fim do mesmo homem enquanto medida da própria construção do mundo.
Deus não quer o nosso fim trágico, a nossa aniquilação, mas nós estamos irresponsavelmente a fazer tudo para que isso aconteça, impedindo assim que a obra de Deus continue e a salvação que o seu Filho nos trouxe seja consumada até ao fim dos tempos.
Este é um discurso apocalíptico, mas se é assim é porque de facto acreditamos que é possível a conversão, que é possível a mudança de estilo de vida, de princípios e valores, de comportamentos. Não está fora do nosso alcance essa mudança, está na nossa mão, e a Palavra de Deus e os seus mandamentos são pistas para a sua concretização, para a sua viabilização. E ainda que algumas pessoas o afirmem, a Palavra de Deus e os seus mandamentos não são uma ingerência na nossa vida privada, uma violência sobre a nossa autonomia e liberdade, bem pelo contrário são possibilidades de uma realização mais plena da nossa própria natureza e história pessoal e comunitária.
Perante todas as possibilidades de tragédia, de fins apocalípticos do mundo, a maior tragédia e o mais triste fim é vivermos à sombra do medo de Deus, na ignorância das possibilidades de realização total que Deus oferece à nossa existência.
Peçamos ao Senhor a Sabedoria para discernir os sinais dos tempos e viver a justiça a que somos convidados.
Alguns filmes, como o “2012” que estreou esta semana, baseado em profecias diversas, apresentam-nos visualmente esse fim e como estamos marcados por essa mentalidade, essa concepção de um fim catastrófico, trágico, em que tudo e todos serão aniquilados.
A leitura da profecia de Daniel e o discurso de Jesus no Evangelho de São Marcos que escutámos estão alicerçados também nesta concepção, nesta ideia que surgiu no mundo bíblico por volta do século segundo antes de Cristo e que apenas tinha como objectivo dar uma resposta imediata e esperançada para as angústias dos que viviam aqueles tempos difíceis da perseguição, da exploração e da escravatura imperial. Os maus, os que violentavam e exploravam não seriam os vencedores finais.
Contudo, tanto a profecia de Daniel como as palavras de Jesus convidam-nos a olhar mais para além dessa realidade, dessa dimensão catastrófica e trágica, convidam-nos à esperança e a um estilo de vida que deve estar pautado por este fim ao qual todos estamos destinados, mas que não nos deve de modo nenhum condicionar nem privar da liberdade de acreditar e viver para além dele.
A profecia de Daniel diz-nos que o fim será um tempo de angústia, mas também nesse tempo e no meio dessa angústia virá a salvação, para aqueles que estiverem inscritos no livro de Deus. Nas palavras de Jesus serão os seus eleitos que serão reunidos dos quatro pontos cardeais, depois de um tempo de aflição. Ora, perante isto o importante não é o tempo, o acontecimento, mas a condição e o estatuto em que cada um for encontrado, porque como também nos diz Jesus ninguém sabe a hora nem o dia desse acontecimento final.
Na profecia de Daniel os sábios resplandecerão como a luz e os que tiverem ensinado o caminho da justiça serão como as estrelas. Assim, o que verdadeiramente conta nesse momento final é a sabedoria e a justiça, a sabedoria com que tivermos vivido e a justiça que tivermos praticado e ensinado a praticar. Nas palavras de Jesus esta sabedoria e justiça traduz-se nessa capacidade de discernimento de perceber nos sinais dos tempos, no rebentar da folha da figueira, o que verdadeiramente se está a passar e como Deus está a agir no mundo, e como nós podemos colaborar nessa acção.
E quando olhamos os sinais dos tempos e tentamos perceber o que significam, não podemos esquecer que tanto o mundo em que vivemos, como as pessoas que somos, são obra do amor de Deus, são fruto do seu amor e da sua misericórdia, e que Deus nunca abandonou a história a que deu origem a partir da primeira obra da criação, que tem estado presente, está presente e actuante, e mais que tudo interveio na história através da incarnação do seu Filho para nos libertar dessa mesma condição trágica de finitude a que estávamos condenados pelo pecado.
A encarnação de Jesus Cristo, a sua vida, paixão morte e ressurreição são o sinal mais inequívoco de que Deus quer saber de nós, não nos quer condenados, nem nos condena ou castiga a um fim trágico e aniquilador. Deus não abandonou a história do homem, não abandona a nossa história pessoal, nem deixa que um fim aniquilador se abata sobre nós.
Contudo, e para que seja assim, não podemos viver longe da verdade nem na injustiça; bem pelo contrário, temos que procurar em cada momento da nossa vida viver como sábios, como homens e mulheres que conscientes da sua liberdade e fim vivem com responsabilidade. As alterações climáticas a que estamos assistindo mostram-nos tal qual um sinal vermelho dos semáforos como levámos já longe a nossa irresponsabilidade na administração dos recursos naturais, da conservação das espécies e bens comuns da humanidade, e como é necessário inverter a marcha para que não terminemos numa catástrofe. Paralelamente, as violações das leis, a corrupção, a falta de verdade e transparência, a ganância e a mentira, mostram-nos como estamos à beira de um colapso das estruturas e mecanismos que construímos fundados na liberdade, no reconhecimento mutuo dos direitos e deveres. Os atentados à vida, como o aborto e a eutanásia, a desestruturação da família, a falta de valores que norteiem a educação e formação das crianças e jovens, a relativização de todo e qualquer valor moral ou ético, estão a conduzir-nos a outro fim que é o fim do mesmo homem enquanto medida da própria construção do mundo.
Deus não quer o nosso fim trágico, a nossa aniquilação, mas nós estamos irresponsavelmente a fazer tudo para que isso aconteça, impedindo assim que a obra de Deus continue e a salvação que o seu Filho nos trouxe seja consumada até ao fim dos tempos.
Este é um discurso apocalíptico, mas se é assim é porque de facto acreditamos que é possível a conversão, que é possível a mudança de estilo de vida, de princípios e valores, de comportamentos. Não está fora do nosso alcance essa mudança, está na nossa mão, e a Palavra de Deus e os seus mandamentos são pistas para a sua concretização, para a sua viabilização. E ainda que algumas pessoas o afirmem, a Palavra de Deus e os seus mandamentos não são uma ingerência na nossa vida privada, uma violência sobre a nossa autonomia e liberdade, bem pelo contrário são possibilidades de uma realização mais plena da nossa própria natureza e história pessoal e comunitária.
Perante todas as possibilidades de tragédia, de fins apocalípticos do mundo, a maior tragédia e o mais triste fim é vivermos à sombra do medo de Deus, na ignorância das possibilidades de realização total que Deus oferece à nossa existência.
Peçamos ao Senhor a Sabedoria para discernir os sinais dos tempos e viver a justiça a que somos convidados.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarBem haja pela homília e pela interpretação tão importante dos "sinais dos tempos" e da liberdade que Deus deu ao Homem para intervir. Oxalá o Homem consiga reflectir e inflectir o que de errado temos vindo a fazer e que atempadamente possamos corrigir (o ambiente, "as violações das leis, a corrupção, a falta de verdade e transparência, a ganância e a mentira", etc).
Rezemos para que Deus nos inspire a ser cada dia melhores.MJS
Frei José Carlos ajudou-nos mais uma vez a meditar profundamente sobre todos e cada um de nós. Responsabilizou-nos perante nós e o outro.
ResponderEliminarDeixou-nos igualmente um rasto de alegria quando escreveu:"A encarnação de Jesus Cristo, a sua vida, paixão, morte e ressurreição são o sinal mais inequívoco de que Deus quer saber de nós, não nos quer condenados, nem nos condena ou castiga a um fim trágico e aniquilador. Deus não abandonou a história do homem, não abandona a nossa história pessoal, nem deixa que um fim aniquilador se abata sobre nós." G M