A entrada de Jesus em
Jerusalém, recordada e celebrada na procissão dos ramos, assinala o início da
grande semana do ano litúrgico, da Semana Santa, da grande semana que nos
oferece contemplar e viver o grande mistério da nossa redenção.
Assim, ao darmos
início a esta Semana, temos que olhar para essa descida de Jesus desde Betânia até
Jerusalém, descida que termina com a entrada na cidade santa de Jerusalém. O movimento
que o Evangelho nos apresenta associa-se ao movimento de kenosis que o Filho viveu
em todo o mistério da Encarnação.
Tal como nos recordava
São Paulo na leitura da Carta aos Filipenses, o Filho não se valeu da igualdade
com Deus, mas assumindo a condição de servo humilhou-se até à morte e morte de
cruz. Aquele que habitava na glória das alturas assume a condição humana,
baixa-se a essa servidão para poder libertar o homem do poder da morte. E para
significar de forma mais veemente esse abaixamento, esse despojamento divino para
elevar a condição humana, Jesus entra na cidade santa montado num jumentinho,
filho de uma jumenta.
Diz-nos o evangelista
que tal acontece para se realizar a profecia, mas acontece também para
significar o mistério inerente à redenção humana operada por Jesus. Na língua hebraica
a raiz da palavra jumento é a mesma da palavra húmus, a lama de que o homem foi
feito por Deus.
Desta forma, ao colocar-se
sobre um jumentinho para entrar na cidade santa, Jesus assume a condição humana
na sua fragilidade de pó da terra e sob a sua glória faz com que ela seja
introduzida na divindade. O jumentinho sobre o qual Jesus entra em Jerusalém pode-se
dizer, é uma metáfora do mistério da encarnação e da redenção. Jesus eleva a
nossa humanidade à divindade.
Face a este mistério,
e ao iniciarmos a Semana Santa, não podemos deixar de nos interrogar sobre a
forma como de facto assumimos na nossa corporeidade e na relação com os outros
este movimento operado por Jesus, essa elevação que nos alcançou com o seu
abaixamento, com o seu aniquilamento. Viveremos condignamente a nossa condição
de resgatados das forças e dos laços da morte?
É o acolhimento desta
libertação que nós vemos patente naqueles que estendem as suas capas à passagem
de Jesus. Podemos pensar num gesto de glorificação, mas temos que pensar no
significado de confiança que representa este acto. Aqueles que lançavam as
capas aos pés do jumentinho onde Jesus seguia estavam cheios de confiança e de
esperança, tinham deixado de sentir necessidade de uma protecção física ou
material, porque o verdadeiro protector vinha até eles.
Podemos dizer que à
luz deste gesto, tal como Jesus se tinha despojado da sua glória também aqueles
homens se dispunham a despojar da protecção humana para serem acolhidos sob a
protecção daquele que vinha como Rei e Senhor, como Messias. É o acolhimento
que é necessário realizar, confiante, esperançado, fiel, perseverante.
Acolhimento que volta
a estar patente no momento em que Jesus envia os seus discípulos a casa de uma
tal pessoa para celebrar lá a Páscoa. A ordem é clara: é em tua casa que quero
celebrar a Páscoa. A não identificação da pessoa coloca-nos a todos em jogo,
pois na casa de cada um de nós Jesus quer celebrar a Páscoa.
No livro do Apocalipse
vamos encontrar esta mesma referência e necessidade, quando se diz que Jesus
bate à porta e espera que se abra, pois àqueles que lhe abrirem a porta ele a
transporá e celebrará uma ceia com eles. Jesus vem ao nosso encontro, deseja entrar
na nossa casa, fazer-se íntimo de cada um de nós, e se lhe abrirmos a porta
oferecer-nos-á uma ceia que não podemos deixar de dizer que é ele próprio, o
seu corpo divino.
Estes mistérios são
celebrados nesta grande Semana Santa, pois na Quinta-feira Santa celebraremos a
instituição da Eucaristia, do mistério do Corpo que nos é entregue para
alimento, na Sexta-feira Santa a Paixão e morte de Jesus, a redenção da nossa
corporeidade, e no Sábado Santo o grande silêncio que precede a revolução da
Ressurreição celebrada na Vigília da noite Pascal.
Procuremos pois viver
e celebrar dignamente estes dias, conscientes do grande mistério em que estamos
envolvidos e do grande dom que nos é feito, depois da paixão e da morte que
Jesus sofreu por nós, na ressurreição somos ressuscitados com ele.
1 – “Entrada de Jesus em Jerusalém”, de Andrey Mironov.
2 – “Entrada em Jerusalém”, atelier de Pieter Coecke van Aelst, Bonnefanten Museum, Maastricht.
Grata,pela partilha da Homilia do Domingo de Ramos da Paixão do Senhor,muito esclarecedora e rica de sentido,para prosseguirmos a Semana Santa com maior profundidade na vivência destes Santos Mistérios.Obrigada,Frei José Carlos por todo o seu apoio.Que o Senhor o ilumine e o proteja.Desejo-lhe uma boa Semana Santa com muita Paz.
ResponderEliminarUm abraço fraterno.
AD