segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Quando é que te vimos irmão pequenino, Senhor? (Mt 25,37)

Nesta manhã de inverno um tom de cinza cobre o firmamento; dos ramos despidos dos velhos plátanos da avenida as gotas de chuva tombam grossas sobre o vidro do carro. No passeio alguns transeuntes, homens e mulheres que acorrem aos seus postos de trabalho, mas antes têm que deixar os filhos no colégio.
Que azáfama logo de manhã, e com este tempo tão pouco convidativo a qualquer movimento. Uma irritação aflora nos movimentos, pois o filho parece não perceber que a chuva mansinha o molha e o coloca novamente em perigo face à gripe. O guarda-chuva parece que encravou e um pensamento negativo fulmina a mente.
Vamos passando, uns e outros, transeuntes de passeio, fechados nos nossos abrigos e escondidos sob os nossos guarda-chuvas, e a pobre mãe aflita porque o tempo urge e o filho ainda quer o brinquedo que está no assento de trás do carro.
Quando o fizeste a um dos meus irmãos mais pequeninos a mim o fizestes, diz o Senhor! E contudo não vemos o irmão mais pequenino, nem na criança, nem na mãe, nem na idosa que carrega o seu saco pesado de compras, e muito menos na pessoa que temos diante de nós no balcão do nosso serviço de atendimento.   
Hoje, e ainda que seja apenas hoje, vou elevar o guarda-chuva, vou soltar o botão da gabardina, vou abrir o coração e estender a mão ao irmão mais pequenino que Deus coloca diante de mim, no meu caminho.
O Irmão Pequenino é essa criança que nos atrapalha o passo, essa mãe aflita sem tempo, o pai esgotado de um dia de trabalho, a avó que já não sabe onde deixou a sua carteira, o colega de trabalho que está sem paciência, o idoso que entrou no autocarro e não tem lugar, o desconhecido que se cruza connosco na rua e merece um sorriso, um voto de bom dia.
Hoje, vou encontrar o meu irmão pequenino e ter um gesto que marque a diferença, hoje vou encontrar-me com o Senhor no rosto de um daqueles que se cruzar comigo.

 
Ilustração:
“Deixai vir a mim as criancinhas”, de Fritz von Uhde.

4 comentários:

  1. Obrigado Frei José Carlos por nos lembrar todos os "pequeninos" que cada dia passam ao nosso lado e esperam o nosso gesto de amor .Será que também eu vou conseguir encontrar o Senhor no rosto daqueles que se cruzarem comigo? Inter pars

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  2. Frei José Carlos,

    Grata,pelo belo e maravilhoso texto que acaba de partilhar conosco,tão rico de sentido e que nos convida e estarmos atentos com todos aqueles "pequeninos " que se cruzam connosco no nosso dia a dia .Saibamos nós também,como nos diz o Frei José Carlos, ao encontrar o nosso irmão pequenino termos um gesto que marque a diferença,num sorriso,um bom dia com carinho , com todos os que se cruzam comigo .Obrigada, pela excelente partilha e pela maravilhosa ilustração.Que o Senhor o ilumine o ajude e o abençoe.Votos de uma boa noite e um bom descanso.Bem-haja,Frei José Carlos.
    Um abraço fraterno.
    AD

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  3. Frei José Carlos, boa noite. Como está?
    Peço ao Senhor que se lembre de mim, quando o meu tempo, os meus gestos e os meus passos se dirigirem para aqueles pequeninos citados neste seu sentido e fraternal texto, tão ricamente elaborado. Realmente algumas são as vezes em que o meu pensamento fica preso à Terra e não se eleva ao Céu, vendo em cada um deles o Seu Rosto. Por isso, peço ao Senhor que se lembre de mim, quando eu não me lembro d'Ele.
    Uma santa noite e que o seu trabalho continue a dar fruto.
    Um fraterno abraço,
    GVA

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  4. Caro Frei José Carlos,

    Quando reflectia sobre o texto da Meditação que teceu perguntei-me quanto tempo da vida alguns de nós passa(ou) sem compreender o que o Senhor nos pede(ia) quando temos (tínhamos) ao nosso alcance os gestos, as atitudes que Jesus espera de cada um de nós. Recuo umas décadas e interrogo-me também se na actualidade a indiferença é substancialmente diferente daquela que se vivia então, a vários níveis. É diferente, é mais visível, ostensivamente ou cegamente mais indiferente, mais egoísta... Será, Frei José Carlos?
    Tudo se conjuga para que tal aconteça, e torna-se desnecessário e fastidioso elencar as grandes transformações ocorridas nos dois últimos séculos, particularmente no século passado e no que decorre. A indiferença começa em cada um de nós para ir aumentando de escala e de organização. E, por vezes, a análise pessoal da indiferença face ao meu próximo, ao outro, meu irmão, é a mais difícil de fazer. Somos peritos em vê-la nos outros, sem sermos capazes de ter a humildade para nos julgarmos.
    Temos receio de dar o primeiro passo, receamos abrir a porta ao nosso próximo porque na realidade não acreditamos plenamente que não estamos sozinhos e que Jesus nos acompanha. Mea culpa!
    Um grande obrigada, Frei José Carlos, pela partilha, simples, tão profunda, num belo estilo literário, por nos ter recordado como tão facilmente podemos passar para o outro lado da ponte..., com gestos tão simples, e quão fácil é afinal encontrarmo-nos com o Senhor. Bem-haja.
    Que o Senhor o ilumine, e cumule de todas as bênçãos.
    Bom descanso. Continuação de boa semana.
    Um abraço mui fraterno,
    Maria José Silva

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