Estamos a iniciar um
novo Ano Litúrgico e com ele um novo tempo de Advento, quatro semanas de
preparação para a celebração do Natal do Senhor. É um tempo de graça, uma nova
oportunidade para fazer a experiência de Deus que vem ao nosso encontro, que
vem habitar entre os homens.
É verdade que todos os
anos vivemos este tempo de Advento, e que podemos sentir que já pouco nos diz,
que já não nos motiva, e ainda mais quando na sociedade e cultura em que nos
movemos toda a preparação parece já nos ter ultrapassado.
Mas por esta mesma razão,
pelo comércio feito à volta desta festa e que nos deixa um sentimento de
repulsa e insatisfação, temos que reassumir este tempo e esta oportunidade como
um dom divino, como uma graça que nos é concedida.
Neste sentido, temos
que assumir que o Advento não tem apenas por objectivo ajudar-nos a preparar a
celebração do Natal, mas que antes de mais é um tempo para reavivar e reanimar
a esperança.
A oração inicial da
Colecta colocava-nos nesta sintonia quando nos convocava a despertar a vontade
firme pela prática das boas obras para ir ao encontro de Cristo. É o encontro com
Cristo que está em causa, é o encontro com Cristo Jesus que nos deve motivar e impelir
em tudo o que fazemos.
Deus veio e vem ao
nosso encontro em Jesus Cristo e portanto o que se espera de cada um de nós é
essa disposição para o acolher, é a abertura do nosso coração à sua vinda e
presença, que acontece constantemente, mas se torna efectiva e de verdade na
medida da fé e da esperança com que acolhemos o dom que nos é feito.
Não podemos deixar que
o nosso coração se torne pesado, ou inerte, que sejamos dominados pelas
preocupações da vida ou pelas realidades que nos embriagam e distraem da
verdade das nossas vidas e da vida de Deus em cada um de nós.
O Advento é assim um
convite, cheio de esperança e confiança da parte do próprio Deus, a colaborar de
uma forma renovada na presença do Senhor entre os homens, a uma actualização do
mistério da encarnação, a fazer presente novamente entre os homens o dom do
Filho de Deus.
Esta participação e
realização acontecem, tal como nos diz São Paulo na Carta aos Tessalonicenses,
através da caridade que vivemos e manifestamos uns pelos outros, da justiça que
pomos em prática e da verdade a que nos configuramos e somos fiéis.
São o perdão, a
fraternidade, a solidariedade, a atenção ao outro, a um outro que tantas vezes
está ao nosso lado e nos passa despercebido, que nos fazem viver
verdadeiramente a presença de Deus entre nós.
Este tempo de graça é
contudo para muitos dos nossos irmãos um tempo de inoportunidade, como lhe
chamou a religiosa espanhola Dolores Aleixandre, porque confrontados com a luz
e a beleza, com o esplendor e a riqueza, com a paz anunciada pelos textos
bíblicos, muitos dos nossos irmãos sentem mais amargamente e de uma forma mais
acutilante a sua pobreza, a sua miséria, as consequências da guerra e da
violência, o isolamento a que foram votados.
O Advento é assim o
tempo e a oportunidade para cada um de nós, de nesta inoportunidade, marcar a
diferença, fazer com que algo aconteça, e aconteça de tal modo que o Natal não
seja um motivo de dor ou sofrimento, mas uma verdadeira festa, uma fraternidade
renovada.
O Advento desafia-nos
assim a abrir os olhos aos nossos irmãos, às realidades que provocam sofrimento
e a ir ao seu encontro, a fazer encontro de modo a que algo nasça, a que um
nascimento para outra vida aconteça.
Ao acender a primeira
vela da coroa de Advento pedíamos ao Senhor que nos iluminasse para que pudéssemos
distinguir o autêntico do falso, o justo do injusto, o que está bem do que está
mal, para podermos levar a luz verdadeira do Natal a todos os homens e a todas
as realidades que encontramos a cada passo do nosso dia a dia.
Seja este o nosso programa
desta primeira semana do Advento e que a luz de Cristo brilhe em todos os
nossos sentimentos, palavras e gestos.
Ilustração:
Fotografia da primeira
vela da coroa de Advento de 2014 da igreja de Cristo Rei – Porto