sábado, 17 de fevereiro de 2024

Podem os amigos do esposo ficar de luto enquanto o esposo está com eles? (Mt 9,15)


 Jesus é interpelado pelos discípulos de João Baptista, podemos dizer um pouco escandalizados, porque os seus discípulos não jejuam, como eles e como os fariseus jejuam.

Jesus responde aos seus interlocutores explicando-lhes que os seus discípulos não necessitam de práticas ou exercícios externos e materiais, mas de relação, de exercícios de relação, pois são amigos do esposo, estão envolvidos numa relação com Ele que é o mestre e esposo e com os outros que são seus irmãos. Não serão os exercícios externos, materiais, que poderão salvar, mas a relação, as relações que se estabelecem com o outro.

Esta resposta de Jesus ajuda-nos a perceber o sentido do jejum cristão e da abstinência, que ao serem vividos à sexta-feira nos colocam antes de mais em comunhão, em relação de solidariedade com a morte e a paixão de Jesus.

Nós não vivemos para comer, mas comemos para viver, e prescindir de comer, jejuar, abster-se de algum tipo de alimento, é como morrer, é uma forma de partilha, de solidariedade com a morte de Jesus, assim como também uma partilha e solidariedade com aqueles que vivem experiências de violência e morte.

Ao jejuar, ao abster-se de algum alimento, experimentamos a fragilidade, a necessidade, sentimos a fome, e torna-nos certamente mais despertos e sensíveis para com aqueles que se encontram em situações de fome, de miséria, e de morte, cria-nos uma relação solidária e íntima com eles. Por esta razão o jejum anda associado à esmola e à oração, uma tríade de relações que somos convidados a viver na Quaresma.

O jejum que nos encerra numa prática isolada, num exercício de luta sobre os nossos apetites, numa exibição orgulhosa de como somos capazes de nos domar, é um jejum sem relação com o outro e por isso sem sentido e cabimento para o discípulo e amigo de Jesus.

Jejuo de alimentos, mas também posso jejuar de palavras e gestos violentos, de maledicência e murmuração e de tantas outras realidades do nosso quotidiano, como nos convida o Papa Francisco; mas faço-o para me orgulhar e estar de bem com a minha consciência de piedade religiosa, ou para verdadeiramente estabelecer relação com outros, e através deles com o outro que é Deus amigo e esposo?

Ilustração:

Bodas de Caná, de Paolo Veronese, Museu do Louvre, Paris.

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