As leituras que
escutámos colocam diante de nós uma realidade que algumas vezes, para não dizer
bastantes vezes, nos custa a aceitar, a comprometermo-nos com ela. Somos eleitos
de Deus, somos uma opção do seu amor, e nesse amor somos enviados ao mundo e
aos outros para partilhar esta eleição e construir o Reino querido por Deus.
A leitura do livro do
Profeta Amós é neste sentido muito clara, uma vez que nos apresenta um homem que
era guardador de gado, cultivador de sicómoros, e que sem qualquer iniciativa
da sua parte, sem qualquer pretensão pessoal, é enviado por Deus ao santuário
de Betel.
Amós sai da comodidade
da sua vida, poderíamos dizer da sua zona de conforto e segurança, para se
dirigir a um local e a outros que não reconhecem nele qualquer autoridade,
nenhuma credencial para a missão que pretende realizar. E Amós vai, sem
qualquer pretensão de crítica pessoal da instituição a que se dirige, mas
porque Deus o enviou, porque o Senhor lhe confiou esta missão.
Neste sentido, e face
à consciência que temos que também cada um de nós é enviado por Jesus Cristo,
Amós é para nós um modelo e um testemunho da forma como nos devemos situar na
nossa missão e face à crítica e à rejeição que podemos sofrer no exercício
dessa mesma missão. Não estamos para criticar ninguém, para julgar ninguém,
estamos porque fomos enviados.
E se na nossa missão
se encontra a necessidade de chamar a atenção para alguma realidade que não
está bem, que provoca o mal, ou gera a injustiça e o sofrimento, tal necessidade
deriva da consciência de que chamados por Deus somos enviados do amor e para o
amor. Tal como nos recordava São Paulo na Carta aos Efésios fomos escolhidos
antes da criação do mundo para sermos santos e irrepreensíveis em caridade.
A caridade é assim o
princípio e o fim da nossa missão, porque somos escolhidos e enviados pelo amor
para conjuntamente vivermos no amor e dessa foram sermos santos e irrepreensíveis
diante de Deus.
A história da Igreja e
a nossa história pessoal mostra-nos no entanto que muitas vezes fugimos e
falhámos nesta missão que nos foi confiada, que muitas vezes, mais que pelo
amor, nos deixámos conduzir pelas nossas paixões e interesses, pelas nossas
próprias apreciações e valorizações. Centrámos a missão em nós esquecendo-nos
que nos foi confiada.
Conhecedor profundo do
coração do homem, Jesus sabia que esta tentação pairaria sempre sobre a cabeça
dos seus discípulos e a missão que lhes confiava, e por essa razão quando os
envia, como escutámos no Evangelho de São Marcos, os envia dois a dois e lhes recomenda
que não levem nada para o caminho.
Ainda que seja uma
exigência legal da Lei de Moisés para o reconhecimento do testemunho de alguém,
o envio dos discípulos dois a dois por parte de Jesus evidencia essa dimensão comunitária
e externa a cada um daqueles que é enviado. A missão e a mensagem não é
propriedade pessoal, mas é um tesouro que lhes é confiado para ser partilhado
com outros.
As outras exigências
do envio, como não levar dinheiro, nem pão, nem alforge, nem duas túnicas,
prendem-se com a liberdade necessária para a credibilidade da mensagem e da
missão. Uma vez mais se nos coloca como evidente, que a mensagem não pode ficar
sequestrada, retida, não é uma matéria negociável.
Contudo, não podemos
esquecer que esta pobreza e liberdade nos remetem para a caridade, para o amor,
para a confiança na acção de Deus na própria missão que nos foi confiada. Partindo
da pobreza das nossas limitações e fragilidades Deus confia-nos o seu amor para
que o levemos aos outros sem qualquer apropriação, partilhando e participando
do projecto da herança comum constituída em Jesus Cristo.
As leituras deste
domingo recordam-nos assim que a missão a que somos chamados e a graça que lhe
é inerente são uma opção e uma escolha de Deus, as quais devemos acolher com
amor e confiança para sermos verdadeiramente um hino de louvor à sua glória.
“Jesus envia os Apóstolos”, iluminura do Evangeliário Siysky, Biblioteca da Academia das Ciências Russia
"Somos eleitos de Deus e opção do Seu amor". Que grande verdade! E como o esquecemos facilmente! "Temos uma missão a cumprir que Ele nos confiou". Mas quantas vezes não centramos a missão em nós, esquecidos de que ela nos foi confiada? Tem toda a razão ao dizê-lo, Frei José Carlos .É a tentação que Jesus sabia que pairava sobre os apóstolos. E sobre nós, não? Por isso os mandou dois a dois ... E a nós? Inter pars
ResponderEliminarCaro Frei José Carlos,
ResponderEliminarAs leituras do XV Domingo do Tempo Comum e a reflexão sobre o texto da Homilia que teceu conduz-nos à forma como somos na vida cristã e em todos os outros domínios da vida independentemente da função que exercemos.
Quando assumimos que somos o centro de tudo, do poder, do dinheiro, da sabedoria, de que não precisamos dos outros para viver, trabalhar, amar, de que podemos modificar a sociedade de hoje “por decreto”, de que as constituições, os códigos..., têm o primado sobre a realidade de cada um de nós, criamos uma sociedade indiferente, em crise, injusta, onde o amor, a fraternidade e a partilha não existem.
Como nos afirma...” A história da Igreja e a nossa história pessoal mostra-nos no entanto que muitas vezes fugimos e falhámos nesta missão que nos foi confiada, que muitas vezes, mais que pelo amor, nos deixámos conduzir pelas nossas paixões e interesses, pelas nossas próprias apreciações e valorizações. Centrámos a missão em nós esquecendo-nos que nos foi confiada. (...)
(...) Partindo da pobreza das nossas limitações e fragilidades Deus confia-nos o seu amor para que o levemos aos outros sem qualquer apropriação, partilhando e participando do projecto da herança comum constituída em Jesus Cristo.”...
Grata, Frei José Carlos, pela partilha do texto da Homilia, profunda, que nos leva a descentrar-nos, e a assumirmos com coerência, ainda que com dificuldade, o que somos na realidade, por recordar-nos que ...” Somos eleitos de Deus, somos uma opção do seu amor, e nesse amor somos enviados ao mundo e aos outros para partilhar esta eleição e construir o Reino querido por Deus.”...
Bem-haja. Que o Senhor o ilumine, e o abençoe com todas as bênçãos de Deus.
Bom descanso e boa semana.
Um abraço mui fraterno,
Maria José Silva