domingo, 20 de março de 2016

Homilia do Domingo de Ramos da Paixão do Senhor

Durante as semanas da Quaresma fomos realizando uma caminhada, uma preparação em ordem a chegar a este pórtico, como é o Domingo de Ramos, que nos introduz na grande semana que hoje começamos a viver e na qual recordamos e fazemos presente o mistério da nossa redenção. Iniciamos a Semana Santa, a semana dos mistérios, e para nos ambientar ao que vamos celebrar o Evangelho de São Lucas que lemos recordava-nos não só a Paixão de Jesus mas também a Última Ceia.
Esta narração dos dois momentos coloca-nos de sobreaviso relativamente ao que vamos celebrar, à unidade intrínseca entre os momentos que se sucedem no tempo, na história e na celebração litúrgica. A memória da Última Ceia ajuda-nos a compreender que todo o sofrimento, toda a derrota que parece acontecer, a paixão e a morte, têm um fundamento, um sentido, que é o amor.  
Sem o amor tudo o que escutamos e tudo o que vamos viver não tem sentido, é apenas mais uma tragédia que pode ser esquecida tal como tantas outras que são esquecidas. Contudo, se desde há dois mil anos a recordamos em cada Páscoa, e a partir dela em cada domingo e em cada celebração da Eucaristia, é porque o amor a liberta dessa finitude, dessa dimensão trágica e do esquecimento.
É o amor que faz memória, assim como foi o amor que conduziu aquele que é o objecto de toda a violência, Jesus Cristo. É o amor que o leva a celebrar a Páscoa com os seus discípulos, a partilhar a refeição com o traidor, é o amor que proclama que o serviço é um dom e uma grandeza, quando eles querem saber quem é o maior, é o amor que se deixa conduzir sem resistência porque sabe que o bem gera sempre resistência da parte do mal.
É o amor que recompensa o amor, porque como semente lançada à terra esse amor não podia deixar de florescer e frutificar e por isso passados estes dias memoráveis de dor e sofrimento vamos encontrar na manhã de Páscoa o Senhor ressuscitado.
Celebrar assim a Semana Santa e a Páscoa da Ressurreição é recordar o amor, é recordar o início de um reino que não se funda sobre espadas, mas numa entrega aos outros para que eles possam viver, para que tenham vida, é recordar o início do reino do amor infinito, do amor a toda a prova.
Necessitamos por isso, tal como afirmava o profeta Isaías, ter os ouvidos atentos, despertar para a escuta, porque só escutando o bater do coração de Jesus neste drama podemos atravessá-lo com confiança e ter a graça de o partilhar com os outros nossos irmãos.
Necessitamos estar aos pés da cruz, sem preconceitos nem expectativas, para tal como o centurião romano intuir a presença da divindade naquele corpo chagado e maltratado, naquele homem sem poder nem glória, mas que é verdadeiramente um homem justo, o Filho de Deus.
Pedro e os outros apóstolos estavam dispostos a seguir Jesus, a dar a sua vida por um reino que era apenas uma ilusão das expectativas pessoais e da euforia da multidão que subia a Jerusalém para a festa da Páscoa.
Saibamos nós seguir Jesus nestes dias, na memória dos acontecimentos, para não desejar ou construir um reino ilusório, mas para experimentar verdadeiramente o amor e a partir dele e com o serviço que nos é pedido construir o verdadeiro Reino em cada dia do resto do ano.

 
Ilustração:
1 – “Judas abandona a Última Ceia”, de Carl Heinrich Bloch.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    Fiquei maravilhada ao ler esta excelente Homilia do Domingo de Ramos da Paixão do Senhor,muito profunda e tão rica de sentido para todos nós.Como nos afirmava o profeta Isaías,necessitamos por isso,ter os ouvidos atentos,despertar para a escuta,porque só escutando o bater do coração de Jesus neste drama podemos atravessá-lo com confiança e ter a graça de o partilhar com os outros nossos irmãos.
    Saibamos nós seguir Jesus nestes dias,na memória dos acontecimentos,para não desejar construir um reino ilusório,mas para experimentar verdadeiramente o amor e a partir dele e com o serviço que nos é pedido construir o verdadeiro Reino em cada dia do resto do ano.Obrigada,Frei José Carlos,pela excelente partilha que propôs para nossa reflexão,que nos ajuda a estar mais atentas e mais unidos a Jesus com amor.Este Jesus que deu todo o seu amor por cada um de nós e,também pele beleza da ilustração.Que o senhor o ilumine o proteja e o abençoe.Bem-haja.
    Desejo-lhe uma boa Semana Santa com paz e alegria.
    Um abraço fraterno.
    AD


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