sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Homilia Missa dos Namorados

Meus queridos amigos
Antes de mais quero agradecer-vos a resposta ao desafio que vos lancei de nos reunirmos para celebrar o Dia de São Valentim, o Dia dos Namorados, com uma Eucaristia de acção de graças pelo amor que Deus colocou no coração de cada um de nós.
Quero também partilhar convosco que a ideia me surgiu quando há umas semanas atrás soube do convite que o Papa Francisco tinha dirigido neste mesmo sentido aos vários namorados que se preparam para celebrar o seu casamento.
E ao contrário de um jornalista francês, que ontem comentava no jornal “La Croix” que esta era uma forma de recristianização de uma festa que tinha escapado à esfera de influência da Igreja, creio que não se trata disso, de uma reconquista se assim se pode falar, mas de uma oportunidade para iluminar uma realidade profundamente intrínseca a todos nós, como é o amor e a sua necessidade.
E neste sentido, o Evangelho de São Lucas que escutámos, nesta celebração em que fazemos também memória dos Santos Cirilo e Metódio, padroeiros da Europa, é profundamente rico de notas que nos podem ajudar a viver o amor em verdade e plenitude.
É um Evangelho que nos apresenta o envio dos discípulos dois a dois, tal como dois a dois são chamados e enviados os namorados, aqueles que pretendem contrair uma união estável entre si. Desde o momento da criação que Deus viu que não era bom que o homem estivesse só e por isso necessitamos sempre de alguém, de um outro na nossa vida.
Ao enviar os discípulos dois a dois, Jesus aposta também na complementaridade e no reforço testemunhal de cada um. O enviado tem alguém com quem partilhar as dificuldades e alegrias, assim como uma garantia, um crédito, de verdade que o outro lhe proporciona.
Outro que não podemos nunca deixar de ver como dom, como uma oferta de Deus a cada um de nós. Não é uma propriedade, um bem adquirido para nosso uso e consumo, mas tal como a parábola dos talentos nos diz, é algo, alguém para fazermos crescer, para ajudarmos a ser e a desenvolver-se em plenitude.
O namoro e consequentemente a vida matrimonial é assim um processo, um caminho, que deve conduzir a que o homem seja mais homem pela mulher que tem consigo e a mulher seja mais mulher com o homem que tem ao seu lado. A nossa vocação comum é fazer com que o outro seja mais, seja melhor, seja perfeito, no sentido de que seja em plenitude, seja totalmente ele ou ela.    
Para que tal aconteça não podemos esquecer que uma realidade fundamental deste caminhar é a paz, a paz que o Evangelho nos convidava a levar uns aos outros. Num mundo cansado, cheio de tensão, como fazemos a experiência da paz, e da paz que oferecemos uns aos outros?
Uma carícia, um beijo, um abraço forte podem ser gestos propiciadores de paz, e necessitamos deles, até vital e fisicamente necessitamos deles, mas temos que ter também a ousadia, pelo mesmo amor, de gestos que exigem mais de nós, que nos conduzem a uma paz interior mais profunda e intensa, como são o perdoar, o pedir por favor, o agradecer.
Ainda esta manhã o Papa Francisco falava destas atitudes aos cerca de vinte cinco mil noivos que se encontraram com ele na Praça de São Pedro. Necessitamos de pequenos gestos, de gestos que dignifiquem o nosso amor e a pessoa que cada um é e quer que o outro seja. No amor não podemos querer que o outro seja menos que nós.
Estes gestos e este processo são, face à cultura do consumo e do provisório em que vivemos, como um envio de cordeiros para o meio de lobos; mas não podemos temer estes lobos, nem ter medo de viver o amor arriscando em opções definitivas, porque no fim das contas o que está em causa é a nossa realização, a nossa realização plena à imagem e semelhança do Filho de Deus.
Também Jesus viveu de forma radical o amor; e a sua promessa de que nunca nos deixaria abandonados, que onde estivessem dois ou três reunidos em seu nome ele estaria presente, deve animar-nos e fortalecer-nos neste caminhar e viver radical do amor.
Afinal no nosso amor encontra-se presente Deus, Ele que é a fonte de todo o amor e o horizonte para o qual todo o amor deve tender. Se vivermos de verdade o amor a força criadora e transformadora de Deus estará connosco e enfrentará todos os desafios.


Ilustração: "Jacob e Raquel junto ao Poço", de

 

1 comentário:

  1. Caro Frei José Carlos,

    Quando li o título e o texto da Homilia que teceu no dia de São Valentim não deixei de esboçar um sorriso. Pela surpresa e pela forma como construiu o caminho da necessidade e da formação do amor no ser humano. Como a celebração de outras festividades ou memórias, o dia de São Valentim, Dia dos Namorados, foi aproveitado pela sociedade de consumo para desvirtuar o seu significado e conduzir os namorados a vivê-lo, muitas vezes, de forma artificial.
    O dia de São Valentim é vivido de forma muito diferente na civilização ocidental e oriental e alguns povos celebram-no como um dia festivo, com troca de gestos simbólicos, extensivo a namorados, amigos e familiares. Afinal a amizade é uma forma de amor.
    Quando vivemos tempos em que alguns jovens e adultos vivem o dom do amor, ao contrário, do fim para o princípio, todas as oportunidades, para falar das relações entre os indivíduos e da descoberta do outro, são importantes.
    O caminho a percorrer não é fácil, mais difícil, quando as bases não são sólidas. Como nos salienta …”não podemos esquecer que uma realidade fundamental deste caminhar é a paz, a paz que o Evangelho nos convidava a levar uns aos outros. Num mundo cansado, cheio de tensão, como fazemos a experiência da paz, e da paz que oferecemos uns aos outros?
    Uma carícia, um beijo, um abraço forte podem ser gestos propiciadores de paz, e necessitamos deles, até vital e fisicamente necessitamos deles, mas temos que ter também a ousadia, pelo mesmo amor, de gestos que exigem mais de nós, que nos conduzem a uma paz interior mais profunda e intensa, como são o perdoar, o pedir por favor, o agradecer.”…
    Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Homilia, oportuna, profunda, maravilhosamente ilustrada, pela força que nos transmite ao recordar-nos que …”Se vivermos de verdade o amor a força criadora e transformadora de Deus estará connosco e enfrentará todos os desafios.”
    Que o Senhor o ilumine, o abençoe e o guarde.
    Bom descanso.
    Um abraço mui fraterno e amigo,
    Maria José Silva

    P.S. Permita-me que deixe um link para uma peça intemporal, de Franz LISZT, Sonho de Amor (Rêve d'amour, Liebestraum - Love Dream), nº. 3,
    http://www.youtube.com/watch?v=KpOtuoHL45Y

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