terça-feira, 11 de abril de 2017

Não cantará o galo sem que me tenhas negado. (Jo 13,38)

Estavam reunidos para celebrar a Páscoa, a alegria transparecia no rosto de quase todos, e sem se perceber muito bem como o Mestre sentiu-se intimamente perturbado. O seu semblante alterou-se e sem qualquer preparação psicológica anunciou aos seus amigos ali reunidos que um deles o ia trair.
Podemos imaginar o murro no estômago que todos sentiram, o nó que se formou na garganta e lhes embargou a voz, ao ponto de apenas o discípulo amado ser capaz de perguntar: “quem é Senhor?” Olharam-se uns aos outros numa tentativa de percepção de quem seria o traidor.
Pedro, na sua habitual rusticidade, não aceita o que Jesus diz, e afirma que ainda que alguém possa trair o Mestre ele está disposto a dar a vida, está disposto a seguir Jesus até ao fim, a ser fiel inquestionavelmente. A tal disposição Jesus responde com o anúncio da negação, uma negação tripla ainda antes do galo cantar, ainda antes da noite terminar.
As palavras de Jesus feriram, devem ter sido um outro murro e muito mais forte no estômago e no coração de Pedro. Como era possível que o Senhor dissesse que ele o trairia ainda essa noite? Ele que tinha já deixado tanta coisa para o seguir. O orgulho de Pedro desmoronou-se!
Mas é esta ferida no orgulho de Pedro que lhe permitirá não cair na tentação do desespero, que lhe permitirá reconhecer o amor incondicional de Jesus, a porta aberta por este anúncio de traição. O Mestre sabia já o que ele faria, conhecia as suas fraquezas, e não o condenava nem o excluía, bem pelo contrário anunciava-lhe a realização da sua pretensão de entrega e fidelidade, embora para mais tarde e de outra forma.
Deus conhece as nossas fraquezas e potencialidades de infidelidade, mas não nos condena nem nos fecha a porta, bem pelo contrário, por causa delas oferece-nos a mão estendida do perdão, da misericórdia, para não soçobrarmos nas nossas infidelidades. Não é um conjunto de homens e mulheres perdidos que lhe interessam, mas aqueles que estão dispostos a fazer a experiência do perdão, a retomar o caminho onde foi abandonado.
Neste dia da Semana Santa ousemos apresentar ao Senhor as nossas próprias negações e traições para dessa forma sermos acolhidos por Ele e acolhermos a graça de uma vida nova que é já ressurreição.

 
Ilustração:
“A negação de Pedro”, de Andrey Mironov.

1 comentário:

  1. Que o nosso orgulho, como o de Pedro se desmorone, para podermos ver a mão estendida de Cristo, pronto a acolher-nos e a perdoar-nos.Será que conseguimos viver, nestes dias,a certeza de que o caminho do Calvário é também a via para a Ressurreição? Inter pars

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