segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Perdoar os pecados - Lc 5,23

A cena é estranha, inusitada, mas certamente não poderia deixar de ser de outra maneira, pois enquadra uma questão verdadeiramente incomum, paradoxal.
O que é mais fácil dizer: os teus pecados estão perdoados, ou levanta-te e anda?
Para os escribas e fariseus a primeira afirmação era uma blasfémia, mas o que significava para eles a segunda? Se só Deus pode perdoar os pecados poderá qualquer homem dizer ao seu irmão, levanta-te e anda? Qual o peso destas palavras, desta ordem?
Jesus ordena ao paralítico que se levante e ande, que carregue a sua enxerga e volte para casa. Mas tal ordem é apenas para manifestar o poder da primeira afirmação, a sua realidade actuante. É o perdão dos pecados que liberta, que ergue e faz andar, que permite carregar a enxerga e voltar para casa.
Hoje perguntamos muitas vezes porque não acontecem tantos milagres como aconteceram no tempo de Jesus, porque não nos ordena ele também que nos libertemos das nossas paralisias e andemos erguidos.
A tal pergunta, Jesus interpela-nos e questiona-nos sobre o perdão dos pecados, se acreditamos verdadeiramente que ele nos perdoa dos nossos pecados, que tem poder para nos erguer da nossa infidelidade e miséria egocêntrica. Acreditamos que ele tem poder para tal? E se acreditamos, acreditamos que tal verdadeiramente acontece?
A pergunta de Jesus põe de manifesto o que verdadeiramente é mais fácil para Deus, o que está mais de acordo com a sua natureza, que é perdoar. Os milagres que nos podem pôr a andar, a ver, que nos podem curar, são intervenções secundárias para Deus, se assim se pode falar, pois interferem com o movimento natural da matéria de que somos constituídos. No mínimo, e como nos diz o Evangelho de São Lucas, são manifestações para colocar em evidência a misericórdia. Esta é a natural acção de Deus.
No nosso caminhar em ordem à celebração do Natal do Senhor podemos e devemos questionar-nos sobre a nossa fé no perdão dos pecados. Temos consciência das nossas falhas, dos nossos pecados, do que fizemos de mal ou do bem que deixámos de fazer? Acreditamos que Jesus nos perdoa? E acreditando, percebemos como a graça do perdão nos ergue e nos transforma, nos dá uma vida nova, uma vitalidade que nos permite carregar com a enxerga que é a cruz de cada dia?
Que neste Advento escutemos no nosso coração “os teus pecados estão perdoados” e nos sintamos erguidos para procurar viver dignamente como filhos de Deus.

 
Ilustração:
Jesus envia o paralítico para casa, Anthony van Dyck, Royal Collection, Windsor Castle.

 

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