O Evangelho que
escutámos diz-nos que uma multidão seguia Jesus. Diante desta realidade não nos
custa imaginar que um bom estratega, um político da nossa praça ou um bom técnico
comercial aproveitaria esta situação para fazer uma proposta aliciante, uma
proposta cativadora das expectativas e esperanças dos seguidores, de modo a transformar
esses mesmos seguidores anónimos em seus adeptos convictos.
Mas Jesus não é um
estratega, nem um político e muito menos alguém interessado em vender um
produto ou angariar um cliente, e por isso a proposta que faz àquela multidão
que o segue, e a cada um de nós seus discípulos, é uma proposta radical, uma
proposta que desde o primeiro momento se apresenta exigente e por isso talvez pouco
atractiva a muitos dos nossos olhos.
Face àquela multidão
que o segue, e que sabemos que tinha interesses materiais, interesses de
satisfação imediata, Jesus anuncia explicitamente que para o seguir é
necessário renunciar, é necessário tomar consciência de que há realidades que
são incompatíveis com o seu seguimento e com o projecto de salvação que Deus
realiza.
No seguimento de Jesus
há condições que têm que ser vividas com toda a radicalidade, e condições que
estão para além da renúncia de bens ou dos afectos mais legítimos, como o amor
dos pais ou o amor dos irmãos. Quando Jesus diz que temos de nos libertar dos
laços familiares, de todos os afectos e apropriações, está a desafiar-nos na
disposição de toda a nossa vida e toda a nossa pessoa, está a desafiar-nos na
alteração radical do centro e eixo da nossa existência. Ao deixarmos tudo somos
convidados a apenas ter e contar com Deus.
Porque não é fácil e
porque não é uma situação pontual, uma questão que se resolve num momento ou
num dia, Jesus convida aqueles que o desejam seguir a tomar a sua cruz, a
assumir as dificuldades e desafios inerentes ao próprio seguimento e a caminhar
em frente.
Podemos assim dizer
que este carregar a cruz é um estilo, uma marca identificadora daqueles que
seguem Jesus, mas verdadeiramente, o que acontece em realidade, é ser uma
terapia, uma terapia de longa duração que nos vai descentrando de nós próprios
e nos vai colocando no eixo de Deus, é uma terapia que nos vai abrindo aos
outros e ao amor que devemos uns aos outros como irmãos e filhos de Deus.
Esta terapia crucificante
não pode contudo ser iniciada de forma ligeira, mais ou menos superficial, mas
deve ser bastante consciente e profunda, e por essa razão Jesus apresenta
depois do desafio radical do seguimento e da cruz as parábolas do homem que se
propõe construir uma torre e do rei que se prepara para a guerra.
São parábolas que se
centram sobre os nossos recursos, as nossas capacidades e forças para seguirmos
Jesus, mas face ao cálculo que somos convidados a realizar podíamos dizer que estas
parábolas são quase um convite a desistir do seguimento, pois onde
encontraremos a forças para nos desprendermos, os soldados para vencer aquele
que vem contra nós com o dobro do poderio?
Contudo, e
paradoxalmente, este cálculo e verificação das nossas forças conduzem-nos à
descoberta inevitável de que não podemos contar connosco, que somos incapazes,
mas com Deus seremos capazes e venceremos. O seguimento de Jesus e o
desprendimento e a libertação que nos são exigidos estão assim ao nosso alcance
na proporção da medida de força que deixamos Deus ter em nós.
Seguir Jesus é assim
libertar-se de tudo para que Jesus possa ser tudo, para que Jesus possa tomar
conta de tudo, para que possamos dizer como São Paulo “já não sou eu que vivo é
Cristo que vive em mim”.
Neste sentido, e parafraseando
o Livro da Sabedoria, nós podemos não conhecer as nossas forças, podemos não
conhecer o desígnio de Deus, mas Deus dá-nos a sabedoria pelo Espirito Santo
para as encontrarmos nele próprio desde que nos disponhamos a tal. É uma
proposta de acolhimento em liberdade à semelhança da que São Paulo propõe a
Filémon relativamente a Onésimo.
Neste dia em que a
Igreja celebra também o nascimento da Virgem Maria peçamos a sua intercessão em
nosso favor, ela que foi a primeira a deixar tudo, a abdicar de tudo para
seguir Jesus, quando aceitou com toda a liberdade ser a mãe do Salvador.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarBem-haja por clarificar-nos a proposta de radicalidade que Jesus faz à multidão que o seguia e a cada um de nós seus discípulos.
Como nos salienta …”Jesus convida aqueles que o desejam seguir a tomar a sua cruz, a assumir as dificuldades e desafios inerentes ao próprio seguimento e a caminhar em frente”… a qual se revela …” uma terapia de longa duração que nos vai descentrando de nós próprios e nos vai colocando no eixo de Deus, é uma terapia que nos vai abrindo aos outros e ao amor que devemos uns aos outros como irmãos e filhos de Deus.”
Porém, para vencermos o desafio, para encontrarmos forças para continuar o seguimento, face às múltiplas adversidades com que nos vamos defrontando, precisamos contar com Deus, como nos recorda …”O seguimento de Jesus e o desprendimento e a libertação que nos são exigidos estão assim ao nosso alcance na proporção da medida de força que deixamos Deus ter em nós.”…
Sigamos o exemplo da Virgem Maria pedindo a sua intercessão a nosso favor.
Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Homília do XXIII Domingo do Tempo Comum que teceu, profunda e directa, maravilhosamente ilustrada, que nos ajuda a reflectir sobre a relação de cada um de nós com Deus e com os outros e as suas exigências e, como nos lembra …”Ao deixarmos tudo somos convidados a apenas ter e contar com Deus”.
Que o Senhor o ilumine, o abençoe e o guarde.
Boa semana. Bom descanso.
Um abraço fraterno e amigo,
Maria José Silva