domingo, 4 de maio de 2014

Homilia do III Domingo do Tempo Pascal

O Salmo que cantámos na Liturgia da Palavra deste domingo tinha como refrão “Mostrai-me senhor o caminho da vida”. Um refrão e um pedido que todos dirigimos a Deus, não só aqui e agora, mas muitas vezes e em outras circunstâncias e lugares. É um desejo que nos habita e que não podemos negar, aspiramos à vida e à vida em plenitude.
Não podemos negar também que Jesus Cristo se oferece como caminho verdade e vida, e portanto esse nosso desejo de vida, essa aspiração profunda, apenas encontra eco e satisfação verdadeira quando assumimos que Jesus é o caminho, quando nos colocamos em caminho com Jesus.
Neste sentido, a leitura do Evangelho de São Lucas e a narração do encontro dos discípulos com Jesus em Emaús, mostra-nos que Jesus caminha connosco mesmo nos nossos momentos de desalento, de decepção e dúvida. Jesus vem ao nosso encontro e caminha connosco, questiona-nos e interessa-se pelos nossos problemas, pelas nossas questões e dúvidas. Jesus ressuscitado faz-se próximo da nossa fragilidade humana.
Contudo, percebemos também pela leitura do Evangelho que a presença de Jesus, o seu caminhar ao nosso lado, apenas se torna evidente quando partilhamos o pão que ele abençoou. É na partilha do pão que o ardor do coração face à Palavra, face ao testemunho, face às explicações, se revela como um indicativo da sua presença, do seu caminhar connosco.
A Eucaristia, a celebração da Santa Missa, é a oportunidade que temos em comunidade de partilhar este pão, o pão que o Senhor abençoa e pela acção do Espirito Santo se transforma para cada um de nós em corpo e sangue do Jesus Ressuscitado. Na Eucaristia experimentamos a presença viva do ressuscitado entre nós e temos a oportunidade de nos alimentarmos do verdadeiro pão, do Pão da Vida.
Mas também no nosso dia-a-dia, quando partilhamos o nosso pão material com aqueles que não têm com que se alimentar ou subsistir, e o fazemos pelo amor que nos é inerente como filhos de Deus, podemos fazer a experiência de Jesus que caminha connosco, podemos sentir o ardor no coração que indicia a sua presença.
Certamente muitos de nós já fizemos essa experiência, já sentimos que uma alegria insuspeitada despertou em nós depois de termos partilhado alguma coisa com um outro que de distante se fez próximo. Essa alegria, tal como o ardor do coração dos discípulos é um sinal da presença de Jesus ressuscitado caminhando connosco.
Há no entanto uma outra experiência de partilha que nos faz sentir de uma forma mais profunda a presença de Jesus ressuscitado, que nos faz sentir actores de Emaús, é a experiência da partilha pessoal, do saber-se e fazer-se pão e alimento para aqueles que nos rodeiam.
Quando somos capazes de nos dar aos outros, de alimentar a vida e a esperança dos outros com o nosso amor, aproximamo-nos de Jesus que se fez alimento e se deixou como alimento para a nossa caminhada.
De cada vez que somos capazes de nos partilharmos com os outros, assumimos e vivemos na nossa própria condição carnal as palavras de Jesus na última ceia, “este é o meu corpo entregue por vós”. Então Jesus não só caminha connosco mas faz-se vida e verdade em cada um de nós, faz-se alimento de amor no nosso amor.
Desta forma, de cada vez que pedimos ao Senhor que nos mostre o caminho da vida estamos a pedir que o Senhor nos ensine como ser alimento, como transformarmo-nos em pão para a vida dos outros. E se arriscamos de verdade em ser alimento assumimos que o Senhor é o nosso refúgio, a nossa herança e que o nosso destino está nas suas mãos.
Um destino que não tem nada de trágico, ainda que possa atravessar vales de dor e sofrimento, mas que é uma realidade de delicias eternas, de alegria plena, pois a nossa felicidade realiza-se à semelhança da doação total de Deus, que se fez tudo em nós para que pudéssemos ser tudo nele.
Como os discípulos de Emaús saibamos descobrir na partilha que Deus abençoou com o seu amor a presença viva e caminhante de Jesus connosco.

 
Ilustração: “A Ceia de Emaús”, Pintor anónimo italiano do século XVII.

 

1 comentário:

  1. Caro Frei José Carlos,

    A narrativa do encontro de Cristo Ressuscitado com dois dos discípulos a caminho de Emaús, o caminho feito conjuntamento, a explicação de Jesus sobre as Escrituras, a “fracção do pão” constituem um excerto do Evangelho segundo São Lucas que é profundo e o texto da Homilia que teceu é de grande espiritualidade.
    É Jesus que toma a iniciativa. Jesus faz-se peregrino para nos recordar que partindo da Páscoa é necessário reler as Escrituras com um novo olhar, o olhar do coração, da fé, da vivência quotidiana. Podemos interpretar este encontro de Jesus com os discípulos de Emaús como a mensagem da vida de Jesus para cada um de nós, de entrega, de Amor, de refúgio, de partilha e fraternidade.
    Jesus não se impõe, continua a caminhar connosco e com a liberdade que nos foi dada cabe-nos a nós convidar Jesus em permanência para ficar com e nEle, mesmo se a nossa habitação está desarrumada e estamos em falta com o Senhor...
    Como nos recorda ...” Quando somos capazes de nos dar aos outros, de alimentar a vida e a esperança dos outros com o nosso amor, aproximamo-nos de Jesus que se fez alimento e se deixou como alimento para a nossa caminhada.
    De cada vez que somos capazes de nos partilharmos com os outros, assumimos e vivemos na nossa própria condição carnal as palavras de Jesus na última ceia, “este é o meu corpo entregue por vós”. Então Jesus não só caminha connosco mas faz-se vida e verdade em cada um de nós, faz-se alimento de amor no nosso amor.”…
    Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Homilia, de grande espiritualidade, formação e esperança. Bem-haja por salientar-nos que …” Jesus vem ao nosso encontro e caminha connosco, questiona-nos e interessa-se pelos nossos problemas, pelas nossas questões e dúvidas. Jesus ressuscitado faz-se próximo da nossa fragilidade humana.”…
    Ficai connosco Senhor e “Mostrai-me o caminho da vida”!
    Que o Senhor o ilumine, o abençoe e o guarde.
    Votos de uma boa semana, com paz, alegria e confiança.
    Bom descanso.
    Um abraço mui fraterno e amigo,
    Maria José Silva

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