sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Homilia da Solenidade da Assunção da Virgem Maria

Celebramos hoje em comunhão com toda a Igreja a Solenidade da Assunção da Virgem Maria, um mistério da vida de Maria e da Igreja que somos convidados a contemplar à luz das palavras que escutámos na Segunda Epístola de São Paulo aos Coríntios.
Se em Jesus Cristo, pelo mistério da ressurreição, todos são restituídos à vida, a Virgem Maria, em virtude da proximidade e da relação com Cristo, é a primeira a usufruir dessa restituição, podemos dizer que desse privilégio, na medida em que pertence a Cristo de forma plena e total.
Contudo, e se o texto da Carta de São Paulo nos apresenta esta restituição como algo a acontecer apenas aquando da vinda de Cristo na sua glória, a Igreja desde bem cedo acreditou que a Virgem Maria gozou desta restituição imediatamente após a sua morte.
Ela é a primeira beneficiária da vitória de Cristo sobre a morte, porque foi também a primeira a acreditar no cumprimento de tudo o que lhe foi dito da parte do Senhor, ela é a primeira discípula, a primeira crente em Jesus Cristo e na sua vitória, mesmo quando nada deixava prever ou antever o que iria acontecer.
Maria assemelha-se neste aspecto, nesta submissão da sua vontade à vontade de Deus, a Abraão, aquele que acreditou e colocou toda a sua confiança no Senhor e numa promessa que também não vislumbrava no imediato. Maria é assim a porta da nova aliança, da aliança que Deus estabelece com todos os homens, de todos os povos e de todos os tempos.
E se nas diversas alianças que Deus estabeleceu com os homens um sinal recordava a Deus e aos homens essas mesmas alianças, como foi o arco iris e a circuncisão, a assunção do corpo de Maria aos céus é também sinal visível e presente dessa aliança estabelecida em Jesus. Maria elevada ao céu é o sinal da acção salvadora de Deus, uma memória para Deus e uma memória para os homens.
A celebração desta memória coloca-nos assim nos passos de Maria, no que ela representa de desafio da fé, de acreditar sem ver, de acreditar que é possível cumprir-se tudo o que nos é dito da parte do Senhor, bem como no que ela representa de confiança e fraternidade, de caminho que se faz de encontro a Deus aquando do encontro com o outro.
Maria é elevada ao céu porque desde o primeiro momento, desde o anúncio da sua maternidade, se projecta para fora de si, num primeiro momento pelo acolhimento das palavras do anjo e depois na viagem ao encontro da sua prima Isabel.
Maria é assim o reverso do egoísmo, do egocentrismo, ela vive desde o primeiro momento a assunção na medida em que se deixa levar, se deixa elevar, na medida em que permite a vontade de Deus realizar-se.
E neste sentido também nós podemos ser assumptos, podemos ser elevados ao céu, ou seja na medida do nosso acolhimento da vontade de Deus, da elevação que permitimos que Deus realize nas nossas vidas.
Procuremos pois, com a mesma confiança incondicional em Deus, seguros que com ternura e amor nos conduz, que a vontade de Deus se realize em nós, que nos eleve da nossa fragilidade humana à glória divina que nos está destinada e de que Maria é a primeira beneficiária.

 
Ilustração: “Assunção da Virgem Maria”, de Alonso López de Herrera, Museu Nacional de Arte do México.

1 comentário:

  1. Caro Frei José Carlos,

    O texto da Homilia da Solenidade da Assunção da Virgem Maria que teceu é um desafio para cada um de nós sobre algumas das dúvidas que nos assaltam como a invisibilidade, a busca permanente de Deus, a escuta de Deus, a incompreensão sobre a injustiça e o sofrimento do mundo que habitamos, frequentemente provocado pelo próprio homem, sobre os nossos egoísmos, sobre a não solidariedade.
    Como nos recorda e passo a citar ...” A celebração desta memória coloca-nos assim nos passos de Maria, no que ela representa de desafio da fé, de acreditar sem ver, de acreditar que é possível cumprir-se tudo o que nos é dito da parte do Senhor, bem como no que ela representa de confiança e fraternidade, de caminho que se faz de encontro a Deus aquando do encontro com o outro.”…
    Mas para que tal aconteça é necessário libertar-nos, “projectar-nos para fora”, como Maria foi capaz de fazer, mostrando-se disponível a acolher o anúncio do anjo São Gabriel e quando se dispõe a fazer o caminho para visitar e acompanhar a sua prima Isabel.
    Inspirados por Maria e Isabel saibamos cultivar a confiança, reaprender a despertar-nos interiormente, encontrar a capacidade de maravilhar-nos, de (re)descobrir e praticar o que Jesus nos ensinou e testemunhou, como filhos de Deus e como irmãos no amor, na fraternidade, na solidariedade.
    Grata, Frei José Carlos, pela partilha do texto da Homilia, profunda, que nos conduz a uma longa reflexão, por salientar-nos que ...”também nós podemos ser assumptos, podemos ser elevados ao céu, ou seja na medida do nosso acolhimento da vontade de Deus, da elevação que permitimos que Deus realize nas nossas vidas.”
    Bem-haja. Que o Senhor o ilumine, o abençoe e o guarde.
    Bom descanso e bom fim-de-semana.
    Um abraço mui fraterno,
    Maria José Silva

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