domingo, 13 de outubro de 2013

Homília do XVIII Domingo do Tempo comum

Terminada a Liturgia da Palavra é facilmente perceptível que há uma grande relação e semelhança entre a primeira leitura do Segundo Livro dos Reis e o Evangelho de São Lucas. Não só estamos perante uma situação de lepra, de uma cura de lepra, mas igualmente de um conjunto de atitudes que não podem deixar de nos interessar enquanto crentes, enquanto homens e mulheres de fé.
Neste sentido importa ter presente que Naamã vem de longe para se encontrar com o profeta Eliseu na esperança de uma cura que lhe foi comunicada como possível. Vem carregado de esperanças, de expectativas, mas igualmente de um imaginário mágico e de um conjunto de riquezas para poder alcançar a cura desejada.
O encontro com o profeta Eliseu, que o general nem sequer conhece pessoalmente pois não sai ao seu encontro, revela-se num primeiro momento como um fracasso, pois o que lhe é pedido não corresponde às suas expectativas nem ao seu imaginário e poder aquisitivo. De acordo com as instruções veiculadas pelo profeta, Naamã necessita apenas encontrar-se com a sua condição humana, com a sua fragilidade, necessita apenas humildemente reconhecer o poder de Deus, um poder que não se pode comprar, do qual ele não se pode apoderar.
Operada a conversão, assumida com humildade a graça divina através da cura realizada nas águas do rio Jordão, o general Naamã pode regressar ao profeta Eliseu e manifestar-lhe o seu agradecimento, a descoberta do dom gratuito de Deus. Pode agora face a face manifestar a sua fé e dar início a uma nova vida e a uma nova relação com Deus simbolizada nesse gesto de levar alguma terra para construir sobre ela um altar.
O encontro de Jesus com os dez leprosos, quando passava entre a Samaria e a Galileia, assemelha-se ao encontro de Naamã com o profeta Eliseu nessa primeira distância que é mantida entre Jesus e os leprosos e na humildade do acolhimento das instruções apresentadas.
Assim, mantendo a distância que a impureza legal impunha, os leprosos pedem desde longe o auxílio de Jesus, pedem-lhe que tenha piedade deles, e contrariamente a outras situações de cura, em que Jesus se aproxima, em que Jesus toca o doente, neste caso dos dez leprosos a distância é mantida e estritamente salvaguardada, como se ela fosse de facto verdadeiramente importante e necessária.
E também, contrariamente a outras curas e milagres, Jesus não age directamente, mas ordena que os leprosos cumpram o que estava estipulado na lei para que fossem considerados curados, ou seja, que se apresentem diante dos sacerdotes.
O texto evangélico de São Lucas diz-nos que ao dirigirem-se para os sacerdotes conforme ordenado por Jesus os leprosos ficaram curados, ou seja, que a obediência às palavras de Jesus lhes tinha alcançado a cura. Contudo, e aparentemente numa atitude de desobediência, um dos leprosos ao ver-se curado voltou para trás, e veio prostrar-se aos pés de Jesus, agradecendo e louvando a Deus pela cura alcançada.   
É face a esta atitude, evidenciada para todos por Jesus face à condição de estrangeiro do curado, que percebemos que as ordens de Jesus e a distância mantida inicialmente se destinavam a revelar que ele era o verdadeiro sacerdote, o verdadeiro templo, e que os leprosos o deveriam ter reconhecido e era a ele que se deveriam ter dirigido.
Face a estas curas somos convidados a perceber, na nossa caminhada de fé e de discipulado, que não há distância que nos possa separar de Deus e da sua graça, que nada nos impede de nos aproximarmos de Deus e da sua misericórdia. Todos somos estrangeiros e samaritanos, mas se procuramos Deus com humildade e de coração aberto às suas palavras Ele não deixa de actuar em nós, não deixa de nos curar das nossas feridas, não deixa de nos rejuvenescer para uma nova vida.
Estas duas curas ajudam-nos também a perceber e a assumir que qualquer cura, qualquer conversão é uma pura ilusão, é vã, se não é acompanhada de uma atitude de louvor, de acção de graças, se não assumimos uma outra terra para prestar culto a Deus, ou seja, se a nossa vida não se torna outra.
Peçamos ao Senhor a graça da fidelidade, da perseverança, e da esperança na misericórdia de Deus face às nossas faltas, pois, como diz São Paulo a Timóteo, ainda que nós sejamos infiéis Deus não pode deixar de ser fiel às suas promessas.

 
Ilustração: “O profeta Eliseu recusando os presentes de Naamã”, de Pieter Fransz de Grebber.

2 comentários:

  1. Caro Frei José Carlos,

    Como nos recorda no texto da Homilia do XXVIII do Tempo Comum que teceu, tendo presente as curas operadas por Jesus, de Naamã e dos dez leprosos… “somos convidados a perceber, na nossa caminhada de fé e de discipulado, que não há distância que nos possa separar de Deus e da sua graça, que nada nos impede de nos aproximarmos de Deus e da sua misericórdia. Todos somos estrangeiros e samaritanos, mas se procuramos Deus com humildade e de coração aberto às suas palavras Ele não deixa de actuar em nós, não deixa de nos curar das nossas feridas, não deixa de nos rejuvenescer para uma nova vida” (…) sem esquecer que “qualquer cura, qualquer conversão é uma pura ilusão, é vã, se não é acompanhada de uma atitude de louvor, de acção de graças”…
    Somos responsáveis pelos nossos actos perante Deus e nos efeitos dos mesmos no nosso semelhante mas confiamos na misericórdia infinita do Senhor e no perdão mútuo de cada um de nós.
    Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Homilia, profunda, que nos ajuda na nossa caminhada de fé, por lembrar-nos que a “cura do corpo não significa a cura do espírito”, por salientar-nos que …” como diz São Paulo a Timóteo, ainda que nós sejamos infiéis Deus não pode deixar de ser fiel às suas promessas.” Que o Senhor o cumule de todas as bençãos.
    Boa semana.
    Um abraço fraterno e amigo,
    Maria José Silva

    P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe um link para o video “Bendecid al Señor”. Cânticos de Taizé
    http://www.youtube.com/watchv=t6Dv_pe73fk&list=PLqcr7q3tE8EwlygTrcoeXPiJaoJAZpUX2&index=5

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  2. Frei José Carlos,

    Agradeço-lhe esta bela e maravilhosa Homilia do XXVIII Domingo do Tempo Comum,muito profunda que nos ajudam na nossa caminhada.Como nos diz São Paulo a Timóteo,ainda que nós sejamos infiéis Deus não pode deixar de ser fiel às suas promessas.Obrigada,Frei José Carlos,pelas palavras partilhadas que muito gostei,e pela excelente ilustração.Bem-haja.Que o Senhor o abençoe e o proteja.Desejo-lhe uma boa semana com paz e alegria.
    Um abraço fraterno.
    AD

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