sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Homilia da Tomada de Posse da Paróquia de Cristo Rei

Meus Irmãos
Não podia ser mais oportuna, para esta celebração de tomada de posse como Pároco de Cristo Rei, a leitura que escutámos do Evangelho de São Lucas, no qual nos é relatado o anúncio do anjo Gabriel a Maria.
É um texto de marcados contornos vocacionais, como outros que encontramos na Sagrada Escritura. Um texto em que nos confrontamos com o chamamento de Deus, o convite de Deus a uma missão, neste caso trata-se da maternidade do Filho de Deus; a consciência das dificuldades e limitações por parte do chamado, Maria contrapõe às palavras do anjo a sua virgindade; e a promessa de que o chamamento, o projecto de Deus, é suficientemente poderoso e eficaz para superar essas dificuldades e limitações, a sombra do Altíssimo virá sobre Maria.
Tomar posse como pároco de uma comunidade de fiéis é também um chamamento de Deus para uma missão, ao qual é impossível não apresentar as nossas dificuldades e limitações, como o fez a jovem virgem de Nazaré. O nosso percurso de vida, opções vocacionais religiosas, tarefas ministeriais enquanto dominicano, fazem com que essas dificuldades e limitações pairem também no espirito face ao chamamento que o Senhor me faz para ser Pároco de Cristo Rei.
Contudo, e tal como a Virgem Maria, diante das limitações e dificuldades, não posso e não podemos, cada um de nós, deixar de fazer um acto de fé, não podemos deixar de nos abandonar à confiança da acção e do poder de Deus. Tal como Maria, necessitamos descentrar-nos de nós próprios e dos nossos projectos e assumir a proposta de Deus.
Só dessa forma, deixando de ser o centro e passando para a periferia, Deus se pode tornar presente na nossa vida e na nossa missão, só nesse processo de conversão Deus se pode tornar Emanuel, Deus connosco.
Um dominicano do século catorze bastante importante na história da mística cristã, o Mestre Eckhart, dizia aos seus ouvintes, que se não formos capazes de nos esvaziarmos de nós próprios Deus nunca terá espaço para fazer a sua habitação em nós.
A importância e a urgência deste processo advêm-lhe não só da possibilidade de Deus nascer em nós, de Deus fazer a sua habitação em nós, mas também da possibilidade de nos encontrarmos com os outros de uma forma mais completa, de uma forma mais plena e livre.
Quando o Papa Francisco nos interpela sobre a dimensão missionária da Igreja, a missão a que todos somos chamados, não deixa de nos advertir que, para que tal missão possa ser levada a cabo, necessitamos obrigatoriamente de nos deixarmos de preocupar connosco, temos que sair dos nossos esquemas, temos que nos descentrar do acessório e do que é apenas meio, para nos centrarmos no verdadeiramente fundamental.
Para São Domingos o fundamental, a sua grande preocupação, e para esse fim foi fundada a Ordem dos Pregadores, era a salvação das almas, ou seja o encontro com a verdade de Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, a verdade que nos liberta e redime na nossa humanidade.
Como dominicano, e ao assumir o ofício de pároco de Cristo Rei, não posso deixar de ter presente essa preocupação e consequentemente a necessidade de vos apresentar Jesus e proporcionar o seu crescimento no vosso coração e na vossa vida.
Com este objectivo, e servindo-me da imagem do pastor, que o Papa Francisco utiliza para falar dos Bispos na Exortação Apostólica “A Alegria do Evangelho”, (nº31) umas vezes irei à frente de vós, outras vezes irei no meio de vós, e outras vezes atrás de vós.
Irei à frente de vós na exigência de vida, no testemunho fiel e alegre, no exercício do ministério sacramental; irei convosco partilhando os momentos de alegria e tristeza, os momentos de crescimento pessoal e comunitário; irei atrás de vós porque há irmãos mais débeis e cansados, que necessitam de tempo, mas também porque não somos donos exclusivos da verdade, nenhum de nós, e há homens e mulheres que pela sua posição avançada no terreno da nossa sociedade e cultura nos podem indicar que outro caminho é possível.
Contudo, este caminhar só é possível com a vossa participação, com a vossa fé e esperança, com o amor que nos faz reconhecer os outros como membros imprescindíveis à vida do corpo que é a nossa comunidade, a nossa igreja, a nossa paróquia.
Todos somos necessários e todos ainda somos poucos face aos desafios que o mundo nos coloca como discípulos de Jesus. Que o Espirito do Altíssimo desça sobre nós e nos dê a ousadia de Maria de arriscar servir o projecto de ser Mãe de Deus.

Ilustração: “A Anunciação”, de Beato Angélico, Claustro de São Marcos, Florença.

 

3 comentários:

  1. Frei José Carlos, boa noite.
    Estive também presente espiritualmente! Ofereci intimamente a Eucaristia de hoje, dia 20 de Dezembro de 2013 pelo amigo que tomava posse como pároco. Até aí, a suposição foi a condutora do meu pensamento. Recolhida agora no silêncio da casa, com que crescente satisfação li o texto da sua homilia. Rejubilei de paz pela autenticidade das palavras com que nos oferece a Palavra. Rejubilei de paz pelo dominicano que se propõe "[...] apresentar Jesus e proporcionar o seu crescimento no vosso coração e na vossa vida." Que o Senhor o ajude a levar a cabo a sua missão.
    Tenha uma santa noite.
    Com um fraterno abraço,
    GVA

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  2. Caro Frei José Carlos,

    Li cuidadosamente a partilha da Homília que teceu no dia em que tomou posse como Pároco de Cristo Rei e na reflexão que fiz pergunto como podemos discernir o rumo traçado pelo homem e o rumo traçado por Deus. Tantas questões permanecerão sem resposta no mistério tão grande que é a vida, Senhor!
    Bem-haja pela humildade em partilhar connosco as questões de diversa ordem que se colocam ao Frei José Carlos ao aceitar a missão que lhe é confiada e que aceita como um chamamento de Deus. ...” O nosso percurso de vida, opções vocacionais religiosas, tarefas ministeriais enquanto dominicano, fazem com que essas dificuldades e limitações pairem também no espirito face ao chamamento que o Senhor me faz para ser Pároco de Cristo Rei.
    Contudo, e tal como a Virgem Maria, diante das limitações e dificuldades, não posso e não podemos, cada um de nós, deixar de fazer um acto de fé, não podemos deixar de nos abandonar à confiança da acção e do poder de Deus. Tal como Maria, necessitamos descentrar-nos de nós próprios e dos nossos projectos e assumir a proposta de Deus.”…
    ...” Todos somos necessários e todos ainda somos poucos face aos desafios que o mundo nos coloca como discípulos de Jesus.”
    Que São Domingos interceda junto de Jesus para que possa “desfrutar da missão” a que foi enviado.
    Que o Senhor o ilumine, o abençoe e o guarde.
    Bom fim-de-semana com paz, alegria, confiança e esperança. Bom descanso.
    Um abraço mui fraterno e amigo,
    Maria José Silva

    P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe um poema de Frei José Augusto Mourão, OP

    da coragem

    Deus ensina à nossa vida que não há coragem inútil/que os lugares do impossível se deslocam/
    quando a confiança toca o chão das coisas/e não é crença ornamental, alegoria//

    liberta a nossa vida do discurso da resignação/que é o fatalismo,/
    do derrotismo, que é a filosofia espontânea dos proletários//
    ......

    dá ao nosso corpo a graça das viagens sem bagagens,/sem outro futuro que a coragem,/
    sem outro combate que a justiça e o direito à diferença//

    arma os nossos olhos da paciência ardente/e os nossos braços da ternura real,/
    para acolhermos a aurora do Teu dia/no cruzamento do que em nós se repete e se interrompe,/
    se desloca e se excede,/e descubramos o esplendor da tua face/de mãos dadas com quantos,/
    de todos os horizontes te procuram/e te proclamam

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  3. Frei José Carlos,

    Ao ler esta maravilhosa e bela Homilia da Tomada de Posse da Paróquia de Cristo Rei,fiquei maravilhada com a beleza das suas palavras partilhadas,pela sua humildade e simplicidade,como partilhou as questões de diversa ordem que se colocam ao Frei José Carlos,ao aceitar a grande missão que lhe foi confiada.Que o Espírito Santo o ilumine em todos os seus trabalhos que Deus lhe acaba de confiar.Grata,Frei José Carlos,bela beleza da Celebração que muito gostei,e pela bela ilustração.Que o Senhor o ajude o proteja e abençoe.Votos de uma boa semana com paz e alegria.Uma boa tarde de domingo e bom descanso.Bem-haja,Frei José Carlos.
    Um abraço fraterno.
    AD

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