Não podia ser mais
oportuna, para esta celebração de tomada de posse como Pároco de Cristo Rei, a
leitura que escutámos do Evangelho de São Lucas, no qual nos é relatado o
anúncio do anjo Gabriel a Maria.
É um texto de marcados
contornos vocacionais, como outros que encontramos na Sagrada Escritura. Um
texto em que nos confrontamos com o chamamento de Deus, o convite de Deus a uma
missão, neste caso trata-se da maternidade do Filho de Deus; a consciência das
dificuldades e limitações por parte do chamado, Maria contrapõe às palavras do
anjo a sua virgindade; e a promessa de que o chamamento, o projecto de Deus, é
suficientemente poderoso e eficaz para superar essas dificuldades e limitações,
a sombra do Altíssimo virá sobre Maria.
Tomar posse como
pároco de uma comunidade de fiéis é também um chamamento de Deus para uma
missão, ao qual é impossível não apresentar as nossas dificuldades e limitações,
como o fez a jovem virgem de Nazaré. O nosso percurso de vida, opções
vocacionais religiosas, tarefas ministeriais enquanto dominicano, fazem com que
essas dificuldades e limitações pairem também no espirito face ao chamamento
que o Senhor me faz para ser Pároco de Cristo Rei.
Contudo, e tal como a
Virgem Maria, diante das limitações e dificuldades, não posso e não podemos,
cada um de nós, deixar de fazer um acto de fé, não podemos deixar de nos
abandonar à confiança da acção e do poder de Deus. Tal como Maria, necessitamos
descentrar-nos de nós próprios e dos nossos projectos e assumir a proposta de
Deus.
Só dessa forma,
deixando de ser o centro e passando para a periferia, Deus se pode tornar
presente na nossa vida e na nossa missão, só nesse processo de conversão Deus
se pode tornar Emanuel, Deus connosco.
Um dominicano do
século catorze bastante importante na história da mística cristã, o Mestre
Eckhart, dizia aos seus ouvintes, que se não formos capazes de nos esvaziarmos
de nós próprios Deus nunca terá espaço para fazer a sua habitação em nós.
A importância e a
urgência deste processo advêm-lhe não só da possibilidade de Deus nascer em
nós, de Deus fazer a sua habitação em nós, mas também da possibilidade de nos
encontrarmos com os outros de uma forma mais completa, de uma forma mais plena
e livre.
Quando o Papa
Francisco nos interpela sobre a dimensão missionária da Igreja, a missão a que
todos somos chamados, não deixa de nos advertir que, para que tal missão possa
ser levada a cabo, necessitamos obrigatoriamente de nos deixarmos de preocupar
connosco, temos que sair dos nossos esquemas, temos que nos descentrar do
acessório e do que é apenas meio, para nos centrarmos no verdadeiramente
fundamental.
Para São Domingos o
fundamental, a sua grande preocupação, e para esse fim foi fundada a Ordem dos
Pregadores, era a salvação das almas, ou seja o encontro com a verdade de Jesus
Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, a verdade que nos liberta e redime
na nossa humanidade.
Como dominicano, e ao
assumir o ofício de pároco de Cristo Rei, não posso deixar de ter presente essa
preocupação e consequentemente a necessidade de vos apresentar Jesus e
proporcionar o seu crescimento no vosso coração e na vossa vida.
Com este objectivo, e
servindo-me da imagem do pastor, que o Papa Francisco utiliza para falar dos
Bispos na Exortação Apostólica “A Alegria do Evangelho”, (nº31) umas vezes irei
à frente de vós, outras vezes irei no meio de vós, e outras vezes atrás de vós.
Irei à frente de vós
na exigência de vida, no testemunho fiel e alegre, no exercício do ministério
sacramental; irei convosco partilhando os momentos de alegria e tristeza, os
momentos de crescimento pessoal e comunitário; irei atrás de vós porque há
irmãos mais débeis e cansados, que necessitam de tempo, mas também porque não
somos donos exclusivos da verdade, nenhum de nós, e há homens e mulheres que
pela sua posição avançada no terreno da nossa sociedade e cultura nos podem
indicar que outro caminho é possível.
Contudo, este caminhar
só é possível com a vossa participação, com a vossa fé e esperança, com o amor
que nos faz reconhecer os outros como membros imprescindíveis à vida do corpo
que é a nossa comunidade, a nossa igreja, a nossa paróquia.
Todos somos
necessários e todos ainda somos poucos face aos desafios que o mundo nos coloca
como discípulos de Jesus. Que o Espirito do Altíssimo desça sobre nós e nos dê
a ousadia de Maria de arriscar servir o projecto de ser Mãe de Deus.
Ilustração: “A Anunciação”, de Beato Angélico, Claustro de São Marcos, Florença.
Frei José Carlos, boa noite.
ResponderEliminarEstive também presente espiritualmente! Ofereci intimamente a Eucaristia de hoje, dia 20 de Dezembro de 2013 pelo amigo que tomava posse como pároco. Até aí, a suposição foi a condutora do meu pensamento. Recolhida agora no silêncio da casa, com que crescente satisfação li o texto da sua homilia. Rejubilei de paz pela autenticidade das palavras com que nos oferece a Palavra. Rejubilei de paz pelo dominicano que se propõe "[...] apresentar Jesus e proporcionar o seu crescimento no vosso coração e na vossa vida." Que o Senhor o ajude a levar a cabo a sua missão.
Tenha uma santa noite.
Com um fraterno abraço,
GVA
Caro Frei José Carlos,
ResponderEliminarLi cuidadosamente a partilha da Homília que teceu no dia em que tomou posse como Pároco de Cristo Rei e na reflexão que fiz pergunto como podemos discernir o rumo traçado pelo homem e o rumo traçado por Deus. Tantas questões permanecerão sem resposta no mistério tão grande que é a vida, Senhor!
Bem-haja pela humildade em partilhar connosco as questões de diversa ordem que se colocam ao Frei José Carlos ao aceitar a missão que lhe é confiada e que aceita como um chamamento de Deus. ...” O nosso percurso de vida, opções vocacionais religiosas, tarefas ministeriais enquanto dominicano, fazem com que essas dificuldades e limitações pairem também no espirito face ao chamamento que o Senhor me faz para ser Pároco de Cristo Rei.
Contudo, e tal como a Virgem Maria, diante das limitações e dificuldades, não posso e não podemos, cada um de nós, deixar de fazer um acto de fé, não podemos deixar de nos abandonar à confiança da acção e do poder de Deus. Tal como Maria, necessitamos descentrar-nos de nós próprios e dos nossos projectos e assumir a proposta de Deus.”…
...” Todos somos necessários e todos ainda somos poucos face aos desafios que o mundo nos coloca como discípulos de Jesus.”
Que São Domingos interceda junto de Jesus para que possa “desfrutar da missão” a que foi enviado.
Que o Senhor o ilumine, o abençoe e o guarde.
Bom fim-de-semana com paz, alegria, confiança e esperança. Bom descanso.
Um abraço mui fraterno e amigo,
Maria José Silva
P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe um poema de Frei José Augusto Mourão, OP
da coragem
Deus ensina à nossa vida que não há coragem inútil/que os lugares do impossível se deslocam/
quando a confiança toca o chão das coisas/e não é crença ornamental, alegoria//
liberta a nossa vida do discurso da resignação/que é o fatalismo,/
do derrotismo, que é a filosofia espontânea dos proletários//
......
dá ao nosso corpo a graça das viagens sem bagagens,/sem outro futuro que a coragem,/
sem outro combate que a justiça e o direito à diferença//
arma os nossos olhos da paciência ardente/e os nossos braços da ternura real,/
para acolhermos a aurora do Teu dia/no cruzamento do que em nós se repete e se interrompe,/
se desloca e se excede,/e descubramos o esplendor da tua face/de mãos dadas com quantos,/
de todos os horizontes te procuram/e te proclamam
Frei José Carlos,
ResponderEliminarAo ler esta maravilhosa e bela Homilia da Tomada de Posse da Paróquia de Cristo Rei,fiquei maravilhada com a beleza das suas palavras partilhadas,pela sua humildade e simplicidade,como partilhou as questões de diversa ordem que se colocam ao Frei José Carlos,ao aceitar a grande missão que lhe foi confiada.Que o Espírito Santo o ilumine em todos os seus trabalhos que Deus lhe acaba de confiar.Grata,Frei José Carlos,bela beleza da Celebração que muito gostei,e pela bela ilustração.Que o Senhor o ajude o proteja e abençoe.Votos de uma boa semana com paz e alegria.Uma boa tarde de domingo e bom descanso.Bem-haja,Frei José Carlos.
Um abraço fraterno.
AD