Em
pleno tempo de Verão encontramos na leitura do Evangelho deste domingo a
narração, segundo o Evangelho de São João, do milagre da multiplicação dos
pães.
Narração
extremamente rica de pormenores e conteúdo, como é habitual no Evangelho de São
João, e que por isso nos obriga a concentrar a atenção num ponto determinado,
para não nos dispersarmos.
Neste
sentido, e neste tempo de férias em que nos reunimos tantas vezes com a família
e com os amigos à volta de uma mesa, num ambiente mais descontraído e festivo,
gostava de vos chamar a atenção para a forma como o Senhor nos convida também a
uma outra mesa, a sua mesa, através da narração deste milagre da multiplicação
dos pães.
Inevitavelmente nesta narração, a atenção
dirige-se imediatamente para a desproporção existente entre o pão que o rapaz
apresenta, a multidão que é necessário alimentar e por fim para os doze cestos
que sobram depois de todos terem ficado saciados.
Contudo,
não podemos deixar de ter também presente o que São João também nos conta, ou
seja, que depois de uma breve conversa de Jesus com Filipe e André sobre a forma
de como alimentar aquela multidão que os tinha seguido até ao monte, todos se
sentaram na relva que era abundante naquele lugar e foram servidos dos cinco
pães e dos dois peixes que o jovem rapaz trazia consigo.
Pormenor
circunstancial, certamente, mas extremamente significativo porque aquela
multidão como todos nós somos convidados a sentarmo-nos à mesa com Jesus, a
assumir o nosso lugar não só de convidados mas também de herdeiros do
proprietários da casa.
Este
pormenor torna-se significativo na medida
em que temos presente que ao tempo de Jesus e ainda em nossos dias os servos e
os escravos, os empregados, não se sentam à mesa com o seu Senhor, com o dono
da casa ou seu patrão.
Sentar-se
à mesa é uma dignificação, é adquirir um outro estatuto social e relacional,
que implica uma partilha da intimidade, uma relação de igualdade e
reciprocidade entre todos os que estão sentados.
Assim,
no milagre da multiplicação dos pães revela-se não só a generosidade de Deus, a
sua solicitude por aqueles que necessitam, mas igualmente a solicitude de Deus
por dignificar os seus filhos, por dignificar o homem convidando-o a partilhar
a sua mesa.
E
esta solicitude é ainda mais evidente quando o relato da multiplicação dos pães
nos conta que a multidão se sentou sobre a relva abundante que existia naquele
local. Mais um pormenor da narração de São João? Ou pelo contrário um indício mais
da solicitude de Deus, que proporciona um espaço de conforto àqueles que o
procuram? Neste sentido e compreendendo a referência espacial não nos podemos
esquecer do cântico do Salmo que nos diz que o Senhor nos conduz aos prados
verdejantes e lá nos faz repousar.
O
milagre da multiplicação dos pães é assim a revelação do banquete a que Deus
nos convida, o banquete em que somos tratados como filhos, como herdeiros, com
a dignidade que nos corresponde ao estatuto de nos podermos sentar. E neste banquete encontramos o repouso, o
descanso que tantas vezes buscamos e não encontramos.
Desta
forma, e no nosso merecido tempo de descanso, nas nossas férias depois de um
ano de trabalhos, o Senhor recorda-nos
que podemos em cada momento, em cada dia, depois de cada jornada de trabalho,
encontrar um momento de repouso, um momento de descanso, e um momento de dignificação.
Para
isso basta aceitarmos o convite que nos é dirigido de nos sentarmos à mesa com
Ele, de partilharmos da sua intimidade, reconhecermos a nossa dignidade de
filhos de Deus e herdeiros do seu reino.
Que
em cada dia saibamos, com a luz do Espirito Santo, encontrarmos o tempo e a disponibilidade
para nos sentarmos e nos deixarmos servir pelo Senhor.
Ilustração:
Multiplicação dos pães, de Ludwig Glotzle, na igreja paroquial de São Jodok em
Bezau, Vorarlberg.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarO texto da Homília do XVII Domingo do Tempo Comum que teceu e partilha é muito profundo e belo. Como nos demonstra ...” O milagre da multiplicação dos pães é assim a revelação do banquete a que Deus nos convida, o banquete em que somos tratados como filhos, como herdeiros, com a dignidade que nos corresponde ao estatuto de nos podermos sentar. E neste banquete encontramos o repouso, o descanso que tantas vezes buscamos e não encontramos.”…
Jesus convida-nos a viver com o nosso semelhante a partilha, a solidariedade do que possuímos. Deus pode realizar o impossível. E este convite vai para além dos bens físicos, é igualmente a partilha espiritual, e a partilha do amor que vivemos com Jesus e com o nosso próximo, ainda que conheçamos as dificuldades da coerência entre os pensamentos, as palavras e as acções na vivência de um quotidiano, apressado, sem tempo para reflectir, para olhar um pouco mais longe, para pensarmos nos que estão próximos e/ou ausentes, sem tempo para um gesto ou palavra de conforto. Que dura realidade, que mundo construímos, sem lugar para desenvolvermos um projecto de justiça e salvação em que somos chamados e desejamos participar, Frei José Carlos. O Reino de Deus começa aqui e agora. Só a fé e a esperança podem dar sentido à vida de cada um de nós.
Grata, Frei José Carlos, pelas palavras partilhadas, por exortar-nos a …” Que em cada dia saibamos, com a luz do Espirito Santo, encontrarmos o tempo e a disponibilidade para nos sentarmos e nos deixarmos servir pelo Senhor.”
Que o Senhor o ilumine, abençõe e proteja. Continuação de boa semana, repousante.
Bom descanso.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva