terça-feira, 31 de julho de 2012

Homília do XVII Domingo do Tempo Comum

Em pleno tempo de Verão encontramos na leitura do Evangelho deste domingo a narração, segundo o Evangelho de São João, do milagre da multiplicação dos pães.
Narração extremamente rica de pormenores e conteúdo, como é habitual no Evangelho de São João, e que por isso nos obriga a concentrar a atenção num ponto determinado, para não nos dispersarmos.
Neste sentido, e neste tempo de férias em que nos reunimos tantas vezes com a família e com os amigos à volta de uma mesa, num ambiente mais descontraído e festivo, gostava de vos chamar a atenção para a forma como o Senhor nos convida também a uma outra mesa, a sua mesa, através da narração deste milagre da multiplicação dos pães.
Inevitavelmente nesta narração, a atenção dirige-se imediatamente para a desproporção existente entre o pão que o rapaz apresenta, a multidão que é necessário alimentar e por fim para os doze cestos que sobram depois de todos terem ficado saciados.
Contudo, não podemos deixar de ter também presente o que São João também nos conta, ou seja, que depois de uma breve conversa de Jesus com Filipe e André sobre a forma de como alimentar aquela multidão que os tinha seguido até ao monte, todos se sentaram na relva que era abundante naquele lugar e foram servidos dos cinco pães e dos dois peixes que o jovem rapaz trazia consigo.
Pormenor circunstancial, certamente, mas extremamente significativo porque aquela multidão como todos nós somos convidados a sentarmo-nos à mesa com Jesus, a assumir o nosso lugar não só de convidados mas também de herdeiros do proprietários da casa.
Este pormenor  torna-se significativo na medida em que temos presente que ao tempo de Jesus e ainda em nossos dias os servos e os escravos, os empregados, não se sentam à mesa com o seu Senhor, com o dono da casa ou seu patrão. 
Sentar-se à mesa é uma dignificação, é adquirir um outro estatuto social e relacional, que implica uma partilha da intimidade, uma relação de igualdade e reciprocidade entre todos os que estão sentados.
Assim, no milagre da multiplicação dos pães revela-se não só a generosidade de Deus, a sua solicitude por aqueles que necessitam, mas igualmente a solicitude de Deus por dignificar os seus filhos, por dignificar o homem convidando-o a partilhar a sua mesa.
E esta solicitude é ainda mais evidente quando o relato da multiplicação dos pães nos conta que a multidão se sentou sobre a relva abundante que existia naquele local. Mais um pormenor da narração de São João? Ou pelo contrário um indício mais da solicitude de Deus, que proporciona um espaço de conforto àqueles que o procuram? Neste sentido e compreendendo a referência espacial não nos podemos esquecer do cântico do Salmo que nos diz que o Senhor nos conduz aos prados verdejantes e lá nos faz repousar.
O milagre da multiplicação dos pães é assim a revelação do banquete a que Deus nos convida, o banquete em que somos tratados como filhos, como herdeiros, com a dignidade que nos corresponde ao estatuto de nos podermos sentar.  E neste banquete encontramos o repouso, o descanso que tantas vezes buscamos e não encontramos.
Desta forma, e no nosso merecido tempo de descanso, nas nossas férias depois de um ano de trabalhos, o Senhor  recorda-nos que podemos em cada momento, em cada dia, depois de cada jornada de trabalho, encontrar um momento de repouso, um momento de descanso, e um momento de dignificação.
Para isso basta aceitarmos o convite que nos é dirigido de nos sentarmos à mesa com Ele, de partilharmos da sua intimidade, reconhecermos a nossa dignidade de filhos de Deus e herdeiros do seu reino.
Que em cada dia saibamos, com a luz do Espirito Santo, encontrarmos o tempo e a disponibilidade para nos sentarmos e nos deixarmos servir pelo Senhor.

Ilustração: Multiplicação dos pães, de Ludwig Glotzle, na igreja paroquial de São Jodok em Bezau, Vorarlberg.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    O texto da Homília do XVII Domingo do Tempo Comum que teceu e partilha é muito profundo e belo. Como nos demonstra ...” O milagre da multiplicação dos pães é assim a revelação do banquete a que Deus nos convida, o banquete em que somos tratados como filhos, como herdeiros, com a dignidade que nos corresponde ao estatuto de nos podermos sentar. E neste banquete encontramos o repouso, o descanso que tantas vezes buscamos e não encontramos.”…
    Jesus convida-nos a viver com o nosso semelhante a partilha, a solidariedade do que possuímos. Deus pode realizar o impossível. E este convite vai para além dos bens físicos, é igualmente a partilha espiritual, e a partilha do amor que vivemos com Jesus e com o nosso próximo, ainda que conheçamos as dificuldades da coerência entre os pensamentos, as palavras e as acções na vivência de um quotidiano, apressado, sem tempo para reflectir, para olhar um pouco mais longe, para pensarmos nos que estão próximos e/ou ausentes, sem tempo para um gesto ou palavra de conforto. Que dura realidade, que mundo construímos, sem lugar para desenvolvermos um projecto de justiça e salvação em que somos chamados e desejamos participar, Frei José Carlos. O Reino de Deus começa aqui e agora. Só a fé e a esperança podem dar sentido à vida de cada um de nós.
    Grata, Frei José Carlos, pelas palavras partilhadas, por exortar-nos a …” Que em cada dia saibamos, com a luz do Espirito Santo, encontrarmos o tempo e a disponibilidade para nos sentarmos e nos deixarmos servir pelo Senhor.”
    Que o Senhor o ilumine, abençõe e proteja. Continuação de boa semana, repousante.
    Bom descanso.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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