terça-feira, 21 de março de 2017

Perdoar até sete vezes? (Mt 18,21)

Pedro aproximou-se de Jesus e perguntou-lhe se um irmão o ofendesse o deveria perdoar até sete vezes. Conhecendo nós, antecipadamente, a resposta de Jesus, podemos dizer que Pedro estava a ser muito pobrezinho, muito pouco fraterno, a ficar muito aquém do que Jesus pedia.
Contudo, não podemos deixar de ter presente que o número sete é o símbolo da plenitude, o que significa que afinal Pedro não estava a ser mesquinho, mas estava já a elevar a fasquia do perdão. A pergunta de Pedro encerra já um projecto de plenitude, de um perdão enorme.
A resposta de Jesus, que Pedro deve perdoar setenta vezes sete, ultrapassa contudo a dimensão da plenitude, ela visa mostrar que há uma outra dimensão do perdão a assumir, a dimensão divina, de contrário o homem nunca chegará a perdoar verdadeiramente.
Para compreender a resposta de Jesus temos que remontar à leitura do livro do Génesis, à escalada de violência que acarreta a vingança. Em Génesis 4,24 um descendente de Caim clama a todos os que o querem ouvir: “Matei um homem porque me feriu, matei um rapaz porque me pisou. Se Caim foi vingado sete vezes, Lamec será vingado setenta vezes sete!”
Jesus conhecendo o coração do homem, sabendo como facilmente se inclina para a vingança e para guardar no coração o ressentimento, pede a Pedro que entre na lógica do amor, que assuma viver na espiral da misericórdia, pois só deve forma se pode perdoar mais que sete vezes e mais que setenta vezes.
Após a ressurreição, Pedro vai fazer a experiência das palavras de Jesus, do perdão concedido setenta vezes sete, da espiral de misericórdia que é convidado a viver. Após as diversas negações na noite da paixão, Pedro necessita do perdão de Jesus, mas não apenas do perdão humano em toda a sua plenitude, Pedro necessita do perdão misericordioso que o restabelece e restaura na sua dignidade.
“Pedro, tu amas-me”, é a pergunta de Jesus. E a cada resposta afirmativa de Pedro, Jesus confirma-o no seu amor, “apascenta as minhas ovelhas”. É o perdão desmesurado, o perdão do amor, o perdão que restaura a dignidade de Pedro, o perdão divino, o perdão daquele que sabe tudo e tudo pode assumir em si pelo seu amor infinito.
A Quaresma é o tempo favorável para fazer a experiência do perdão dado e recebido sem medida, com um amor infinito, com uma dimensão divina. Saibamos pois acolher a oportunidade perdoando misericordiosamente, restaurando o outro na sua dignidade com o perdão transfigurado pelo amor de Deus.

 
Ilustração:
“São Pedro penitente”, de Gerard van Honthorst, Bonhams Auctions 2007.

3 comentários:

  1. Pedir perdão e dá-lo por palavras é simples. São simplesmente palavras... Difícil é dar esse "perdão sem medida, com um amor infinito" Esse é que exige conversão, mudança, aceitação. Treino de Quaresma? Inter pars

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  2. Grata, pela maravilha deste texto da Meditação que propôs para nossa reflexão,gostei muito.Obrigada,Frei José Carlos.Que o Senhor o ilumine o proteja e o abençoe.
    Um abraço fraterno.
    AD

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  3. Grata,pelas belas palavras tão ricas de sentido que propôs para nossa reflexão.Ajuda-nos a estar mais atentas e pensarmos mais em Jesus neste tempo Quaresmal.Obrigada,Frei José Carlos,por toda a sua ajuda tão positiva.Bem-haja.Que o Senhor o ilumine e o proteja.
    Um abraço fraterno.
    AD

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