Tal como acontece todos os meses reuniu-se hoje a Vigararia de Porto
Poente. É um momento de encontro e trabalho do conjunto dos párocos e diáconos
desta zona da cidade e diocese do Porto.
Na reunião de hoje tivemos a oportunidade de escutar uma pequena
reflexão, apresentada pelo Padre João Santos, sobre a necessidade de esclarecer
e afirmar os verdadeiros valores.
O que se segue são algumas notas desta apresentação, que pela sua
actualidade creio que merecem uma partilha mais generalizada e uma reflexão
pessoal.
O contágio social
É inquestionável que todos somos influenciados pela sociedade e pelos
grupos em que estamos integrados. Também os membros da Igreja não escapam a
este princípio, assim como não escapam à influência e aos valores, ou pseudo valores,
que são transmitidos pelos meios de comunicação.
Estamos contagiados por estes valores, que em muitos casos se opõem e
entram em conflito com os valores evangélicos, provocando uma espécie de
esquizofrenia espiritual, ou síndroma bipolar.
A velocidade
Entre os valores com que somos contagiados, ou até contaminados,
encontra-se a velocidade. Vivemos na era da velocidade, em que qualquer atraso
nos desespera. Tudo se mede pelo segundo, ou centésimo de segundo, pela
velocidade dos impulsos. Desejamos a velocidade da luz.
E contudo, a natureza mostra-nos que o tempo é um bem não só precioso
como necessário. Necessitamos tempo para crescer, para amadurecer, para dar uma
outra qualidade à vida e ao que fazemos. Ao tempo, como valor, associa-se a
paciência, uma virtude tão pouco cultivada como apreciada.
A facilidade
Associada à velocidade anda a facilidade, o pouco cuidado, uma vez que
é necessário responder rapidamente e portanto não se pode perder tempo a
cuidar, a aprimorar o que fazemos. Importa mais o já feito que o bem feito.
Neste sentido seria interessante perguntar-nos se alguma da nossa
frustração, da nossa insatisfação face ao trabalho realizado não deriva desta
facilidade, do cuidado da beleza e da bondade que nos moldam mas aos quais não
nos deixam dedicar o tempo necessário.
A Novidade
Andamos todos ávidos de novidade, como se o último modelo do que quer
que seja nos trouxesse a felicidade. E depois verificamos que continuamos no
mesmo sítio, do mesmo modo, não foi o último modelo que nos fez ser mais
felizes.
Necessitamos aprender a ser atletas de fundo, de maratona, a repetir
os exercícios como no ginásio até que se ganhe a massa muscular desejada ou
necessária. A novidade que devemos procurar é afinal a oferta de cada dia e das
suas realizações, é o hoje que é de Deus que vem ao meu encontro.
O melhor
O desejo de ser o melhor, o maior, é uma tentação que nos pode
arrastar e devorar. É verdade que não podemos deixar de aspirar ao melhor, à
plenitude que podemos alcançar ou realizar.
Contudo, não podemos deixar-nos escravizar por esse desejo, ele deve
ser alimentado de forma equilibrada, reconhecendo e aceitando que há limites,
que há fragilidades.
A plenitude pode ser alcançada pela fórmula de São Paulo, ou seja,
quando sou fraco então é que sou forte, nas debilidades descubro as minhas
forças, e pelo serviço discreto que se orienta pelo bem do outro, pelo melhor
do outro.
A actividade
A actividade constante que nos é exigida hoje leva inevitavelmente ao
activismo, a uma espécie de febre que não nos deixa tranquilos, sossegados, que
exige mais actividade como compensação satisfatória.
Este activismo pode encontrar-se no pensar, no sentir e no agir,
gerando consequentemente a neurose, a ansiedade e o esgotamento com que tantas
vezes nos vemos confrontados.
Face a isto, importa perguntar, se eu tenho que fazer tudo, e tudo ao
mesmo tempo. Importa perguntar se ainda que necessário é imprescindível.
Que saibamos acolher o tempo presente como um dom que Deus nos oferece,
e com paciência esperar os frutos do nosso trabalho cuidado, amado, perseverantemente
feito com humildade.
Obrigado por esta reflexão sobre os valores autênticos que, tantas vezes, esquecemos para correr atrás do imediato e daquilo que nos parece imprescindível, sem tempo para parar e agradecer o dom que é a vida. Obrigado por esta partilha que me ajuda a afastar neuroses e ansiedades, que coloca o trabalho e a actividade no seu justo lugar. CR1
ResponderEliminarFrei José Carlos, bom dia! Quão oportuna é esta partilha! Que bem ela me nos fez a todos que a leram. Quanta humildade é necessária para a aceitar! Que Deus o conserve junto de nós!
ResponderEliminarUm abraço fraterno,
GVA
Frei José Carlos,
ResponderEliminarLi com muito interesse esta magnífica partilha tão profunda e esclarecedora,gostei muito.Obrigada,Frei José Carlos,pelas palavras partilhadas,sempre oportunas e pela bela ilustração. Que o Senhor o ilumine o guarde e o ajude..Votos de um bom fim de semana,e um bom descanso.
Um abraço fraterno.
AD
Caro Frei José Carlos,
ResponderEliminarFoi com muito interesse e com gratidão que li e reflecti sobre o texto da Meditação que elaborou e partilha. Se o conteúdo da reflexão partilhada e anotada tocam-me a várias dimensões, particularmente em termos de passado, presente e futuro, a humildade com que o faz não excluindo uma parte da Igreja da qual todos fazemos parte, “cala-me fundo”.
De forma breve e ligeira, poderíamos citar um conhecido provérbio “Depressa e bem, há pouco quem”! Porém, a reflexão exposta é mais profunda. É, como intitulou a mesma, um tema de “Valores versus Valores”.
E, se todos os subtítulos que alinhavou, estruturou e comentou: o contágio social, a velocidade, a facilidade, a novidade, o melhor, a actividade são realidades tranversais a toda a sociedade e de âmbito mundial/global, a questão que coloco é como podemos passar das palavras à mudança? Como podemos participar na construção de um mundo diferente, com outros valores. Sei que o papel de cada um de nós é muito relativo, pequeno, mas do qual não nos podemos demitir. Jesus deseja e espera de cada um de nós que sigamos a Sua vida e os Seus Ensinamentos.
Cada um de nós, em contextos diferentes, desde o simples caminhar no passeio, ao deambular ao ar livre, passando pelo contexto familiar, profissional, religioso, experimentámos ou experimentamos vivências repletas de todos ou alguns dos elementos da vossa reflexão e sabemos que, regra geral, duas atitudes se opõem: a mais frequente e mais fácil, é fazer parte da corrente dominante, por receio, por ambição, por comodidade; a outra, mais rara, é a da discordância fundamentada, dando a cara, assumindo as consequências inerentes.
Bem-haja. Grata, Frei José Carlos, pelas palavras partilhadas, por recordar-nos que ...” A plenitude pode ser alcançada pela fórmula de São Paulo, ou seja, quando sou fraco então é que sou forte, nas debilidades descubro as minhas forças, e pelo serviço discreto que se orienta pelo bem do outro, pelo melhor do outro.”…
Que o Senhor o ilumine, o abençoe e o guarde.
Bom fim-de-semana. Bom descanso.
Um abraço mui fraterno,
Maria José Silva
P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que volte a partilhar o texto de uma oração.
ORAÇÃO DO
TEMPO
Senhor, de todas as perguntas com que Tu me deixas, há uma que cresce dentro de mim: “que fazes do teu tempo?”.
Sabes, perco-me nas tarefas, nas voltas a dar, nesta e naquela responsabilidade, num imprevisto ... e no meio disso tudo,
confesso, o tempo da minha vida assemelha-se mais a uma fuga que a uma sementeira. Hoje, queria pedir-te que me desses
a sabedoria de viver e de repartir o meu tempo. Ajuda-me a realizar o meu trabalho e o meu lazer, o meu esforço e a minha pausa como tempos de dádiva e de encontro. Como tempos que não sejam apenas tempo, mas circulação de vida, de entusiasmo, de criação e afecto.