terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Homilia da Solenidade da Imaculada Conceição

Celebramos a Solenidade da Imaculada Conceição da Virgem Maria, realidade da natureza da Virgem Maria proclamada dogma da Igreja em 1854 pelo Papa Pio IX.
Esta proclamação não foi no entanto uma novidade, uma mudança radical na concepção do papel da Virgem Maria no mistério da encarnação e da salvação, mas foi o cristalizar de um sentimento que a Igreja desde sempre manifestou pela Mãe do Salvador.
Tal como escutávamos na Epístola de São Paulo aos Efésios, os cristãos sempre sentiram que Maria era alguém que Deus tinha escolhido, que Deus tinha predestinado, tinha constituído de modo particular para realizar uma missão, para ser um hino de louvor à sua glória.
Por isso, considerar que ela era imaculada, que tinha sido concebida sem pecado, não era estranho ao projecto de Deus nem ofendia a dignidade de qualquer um dos outros filhos, bem pelo contrário colocava-os em evidência e desafiava-os numa resposta.
A concepção imaculada da Virgem Maria é assim uma realidade que nos diz respeito, que não pode ficar encerrada na exclusividade de Maria, porque tal como ela também nós fomos escolhidos, fomos eleitos e para a mesma missão, a de dar à luz o Filho de Deus, ainda que em circunstâncias e modos completamente diferentes.
A concepção imaculada de Maria tinha por fim primeiro e único a encarnação do Filho de Deus, e em atenção aos méritos do Filho, à missão salvadora que o Filho de Deus deveria desenvolver, ela foi preservada de todo o pecado, foi cuidada com a graça divina para poder gerar o Filho de Deus com toda a pureza na nossa humanidade.
Com cada um de nós, tal não acontece nem é necessário, pois o Filho de Deus feito homem como nós no seio da Virgem Maria, realizou a missão única e eterna que lhe estava destinada, e da qual todos beneficiamos, e por isso não necessita mais de um seio virginal para se fazer homem.    
Neste aspecto distanciamo-nos radicalmente de Maria, ela é verdadeiramente única, foi a que foi necessária para que o mistério de salvação se iniciasse, mas aproximamo-nos dela na medida em que, tal como aconteceu com Maria, Deus não deixa de solicitar o nosso consentimento à obra que deseja realizar.
Também nós fomos escolhidos, predestinados, chamados a dar o nosso sim ao projecto de Deus, a permitir que o Filho de Deus se faça carne hoje, não já carne que se gera num útero durante nove meses, mas carne habitada pelo espirito divino que o mesmo Filho de Deus nos alcançou pelo mistério da redenção, pela sua morte e ressurreição.
Hoje somos chamados a dar à luz o Filho de Deus ressuscitado, glorioso, o Filho de Deus que nos fez herdeiros do Reino, que nos alcançou a dignidade divina que se tinha perdido pelo pecado de Adão. E tal acontece sempre que vivemos no amor, na justiça, na verdade, sempre que procuramos viver com dignidade, com essa dignidade de filhos de Deus que somos pela encarnação do Filho Primogénito no seio virginal de Maria.
E se o temor e a surpresa nos assaltam diante deste mistério, não podemos estranhar, não podemos ficar indiferentes, porque também a Virgem Maria se sobressaltou quando ouviu a saudação do anjo. O toque de Deus, o apelo de Deus à porta do nosso coração provoca inevitavelmente o nosso estremecimento, deixa-nos estarrecidos, afinal todos sabemos que não somos dignos, todos sabemos que estamos nus diante de Deus.
Que a resposta de Maria, o seu consentimento ao projecto de Deus, o sim para que se cumprisse a vontade divina, seja também a nossa resposta, seja o nosso consentimento ao projecto de Deus, ao mistério da incarnação do Filho que deve acontecer em cada um de nós nas suas circunstâncias e limitações, aqui e agora.
Que Maria nos proteja com a sua intercessão e nos ilumine diante de qualquer temor que possamos ter, para que sem medo a Palavra Eterna se faça em nós vida em plenitude.

 
Ilustração:  
“Imaculada Conceição”, de Juan de Frias, Museu de Belas Artes de Córdova.

3 comentários:

  1. Será que estamos sempre disponíveis para cumprir o plano de Deus; sempre prontos a dar o nosso consentimento `a realização da Sua vontade em nós?
    É que há dias de sol e outros em que a bruma torna sombrios os nossos pensamentos... Que Maria, a Virgem sempre pronta e sempre disponível, faça sorrir o sol cada manhã, mesmo quando o dia é de nuvens. Inter pars

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  2. Frei José Carlos,

    Que maravilha de Homilia bela e profunda para nossa reflexão deste maravilhoso dia da Imaculada Conceição,gostei muito.Obrigada,Frei José Carlos,com a excelente partilha,que nos ajuda a reflectir com mais profundidade.Que a resposta de Maria,o seu consentimento ao projecto de Deus,o sim para que se cumprisse a vontade divina,seja também a nossa resposta,seja o nosso consentimento ao projecto de Deus,ao mistério da incarnação do Filho que deve acontecer em cada um de nós nas suas circunstâncias e limitações,aqui e agora.
    Que Maria nos proteja com a sua intercessão e nos ilumine diante de qualquer temor que possamos ter,para que sem medo a Palavra Eterna se faça em nós vida em plenitude.
    Que o Senhor o ilumine o guarde e o abençoe.Continuação de uma boa semana com saúde paz e alegria.Desejo-lhe um bom dia e um bom descanso.
    Bem-haja,Frei José Carlos.
    Um abraço fraterno.
    AD

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  3. Caro Frei José Carlos,

    Maria interrogou-se, questionou o anjo, antes de dizer sim a Deus. Uma vez esclarecida confiou em Deus para a missão para a qual estava destinada, “no mistério da encarnação e da salvação”. E se desejamos ser como Maria, no peregrinar da vida, nas mais variadas circunstâncias, temos a coragem de nos interrogarmos se, verdadeiramente, confiamos no Senhor, porque a Luz não aquece os nossos corações, as sombras toldam o horizonte, a vida é um permanente sobressalto, o peso da cruz é difícil de suportar... E, sabemos que o mal é provocado pelo ser humano, que o Senhor é Amor e misericórdia, que é o nosso bordão na caminhada, temos provas que é um Deus connosco, mas fraquejamos e questionamo-nos muitas vezes...
    Façamos nossas as palavras de Frei José Carlos e peçamos a Maria que ...” nos proteja com a sua intercessão e nos ilumine diante de qualquer temor que possamos ter, para que sem medo a Palavra Eterna se faça em nós vida em plenitude.” Bem-haja.
    Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha da Homilia, profunda, que nos desafia e conforta, maravilhosamente ilustrada, por recordar-nos ...” Que a resposta de Maria, o seu consentimento ao projecto de Deus, o sim para que se cumprisse a vontade divina, seja também a nossa resposta, seja o nosso consentimento ao projecto de Deus, ao mistério da incarnação do Filho que deve acontecer em cada um de nós nas suas circunstâncias e limitações, aqui e agora.”
    Que o Senhor o cumule de todas as bênçãos e o proteja.
    Um abraço mui fraterno,
    Maria José Silva

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