sexta-feira, 10 de junho de 2011

Pedro amas-me? (Jo 21,15-19)

Ao aproximarmo-nos do fim do Tempo Pascal o Evangelho apresenta-nos o relato do encontro de Jesus com os discípulos nas margens do lago e a conversa um tanto ou quanto constrangedora que teve com Pedro, que num determinado momento se tinha disposto a dar a sua vida pelo Mestre, a segui-lo por onde quer que fosse, mas que perante a ameaça à sua vida se apronta a negar o Mestre dizendo que não o conhecia.
De facto Pedro não conhecia o Mestre, e muito menos aquele Mestre que ele via de longe humilhado, sem poder e sem glória, quase sem figura humana, e completamente desenquadrado das suas expectativas e das expectativas dos demais membros do grupo. Aquele Jesus, com o qual a criada o confrontava, não era o Jesus que ele conhecia, não cabia dentro dos referenciais que tinha adquirido ao longo do tempo que tinha vivido com ele.
Agora que tudo passou, e que o peso da culpa domina o seu coração, Jesus coloca-o face a face com um amor que necessita ser retomado, necessita ser redimido por um amor maior, que é o amor do próprio Mestre que misericordiosamente vem ao seu encontro.
Há uma necessidade de começar de novo, de refundar a relação e por isso Jesus não interpela Pedro com esse nome que um dia lhe outorgou como chefe do grupo, mas chama-o de Simão, com o nome de toda a vida e da sua humanidade e história. Pedro necessita nascer de novo para o seguimento do Mestre e para o amor de Jesus.
A pergunta, “Simão, tu amas-me mais que estes”, deixou certamente Pedro constrangido, pois não só Jesus o chamava por um nome que não era o dado, como colocava o seu amor em comparação com os outros, que ainda que o tivessem abandonado não o tinham negado.
Não é de estranhar que Pedro tenha respondido um pouco acabrunhado e triste que amava o Senhor, porque o Mestre o obrigava a confrontar-se com a relação pessoal que tinham e com a relação que cada um dos outros também tinha com o Mestre. Contudo, e apesar da resposta temerosa, Jesus não deixa Pedro na tristeza e na incerteza do seu amor, bem pelo contrário, a esse amor frágil e inconstante convida a tomar conta dos seus cordeiros.
Por uma segunda vez Jesus pergunta a Pedro pelo seu amor, embora desta feita não haja já termo de comparação. É o amor de Pedro em exclusivo que interessa, um amor que depois de afirmado, ainda que temerosamente, vai ser convidado, não já a tomar conta das ovelhas, mas daqueles que também cuidavam das ovelhas, ou seja, um amor por aqueles que não negando o Mestre o tinham abandonado. O amor de Pedro deve estender-se aos seus irmãos e condiscípulos, deve ser um amor colegial e ao mesmo tempo misericordioso para com os pecadores.
Por fim e numa terceira vez Jesus pergunta a Pedro pelo seu amor, facto que leva Pedro aos limites da sua consciência e da sua infidelidade, da sua incapacidade de amar sem a força e o amor do Mestre presentes. É a necessidade e a resposta do despojamento, à semelhança de Jesus, de tudo colocar nas mãos do Senhor.
E perante tal disponibilidade, tal abertura, Jesus confirma Simão na missão de Pedro, porque já não será guiado por si mesmo, pelas suas forças e vontade mas pela mão de um outro que o levará aonde ele mesmo não quererá ir. Simão Pedro poderá então dar plenamente resposta ao convite “segue-me”, com que termina a conversa entre Jesus e Pedro.
A conversa de Jesus com Pedro e as perguntas sobre o amor levam à descoberta dos vários níveis do amor e do seguimento de Jesus, que se traduzem num cuidado das ovelhas do rebanho, num amor misericordioso para com aqueles que também falham no cuidado, e numa abertura e disponibilidade total ao Espírito Santo, dessa mão que nos guiará pelos caminhos insuspeitos pelos quais se traduz o seguimento mais perfeito de Jesus.
Que cada um de nós saiba despojar-se de tudo o que nos impede de responder também a Jesus como Pedro respondeu: “Senhor tu sabes tudo, tu sabes que te amo”.

2 comentários:

  1. Frei José Carlos,

    O texto que elaborou e partilha connosco, profundo, ilustrado com uma bela pintura, recorda-nos uma passagem importante do Evangelho: o diálogo entre Jesus e Pedro, como uma reabilitação de Pedro, e os seus diferentes significados. E, como nos afirma, ... “A conversa de Jesus com Pedro e as perguntas sobre o amor levam à descoberta dos vários níveis do amor e do seguimento de Jesus, que se traduzem num cuidado das ovelhas do rebanho, num amor misericordioso para com aqueles que também falham no cuidado, e numa abertura e disponibilidade total ao Espírito Santo, dessa mão que nos guiará pelos caminhos insuspeitos pelos quais se traduz o seguimento mais perfeito de Jesus.”
    Esta partilha faz-nos reflectir no amor de Deus para com todos nós, e encoraja-nos a pedir ao Senhor perdão pelas nossas faltas, porque é também um Deus de infinita misericórdia.
    Mas este texto, Frei José Carlos, levou-me a reflectir uma outra realidade, lembrando-me de diferentes situações vividas e/ou conhecidas e pergunto-me se a atitude de Pedro negando Jesus, porque como nos diz ... “Aquele Jesus, com o qual a criada o confrontava, não era o Jesus que ele conhecia, não cabia dentro dos referenciais que tinha adquirido ao longo do tempo que tinha vivido com ele”, não encontra paralelo, em muitas das nossas atitudes em momentos díficeis, de sofrimento, de grande dificuldade na vida dos nossos amigos, do nosso semelhante, porque enredados nas nossas fraquezas, nas nossas “defesas”, nas nossas formas subtis de egoismo, não somos capazes de enfrentar a situação real, que ultrapassa a imagem que criámos do nosso próximo, levando-nos ao afastamento e à ausência nos momentos mais necessários.
    Que o Senhor nos ilumine e ajude no nosso processo de transformação para que o amor e o seguimento de Jesus seja vivido no nosso quotidiano, em especial, nos momentos mais necessários.
    Obrigada Frei José Carlos por esta importante partilha. Bem haja.
    Votos de um bom fim-de-semana.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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  2. Frei José Carlos,

    Muito grata pela partilha deste maravilhoso texto tão profundo,que propõe para Meditação,que muito gostei e pela bela ilustração.
    Como nos diz o Frei José Carlos,que cada um de nós saiba despojar-se de tudo o que nos impede de responder também a Jesus como Pedro respondeu:Senhor tu sabes tudo,tu sabes que eu te amo.Obrigada por ter partilhado connosco.
    Desejo-lhe uma boa semana,e um bom fim de semana com a grande Festa do Espírito Santo.
    Um abraço fraterno.
    AD

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