terça-feira, 17 de abril de 2012

Como haveis de acreditar? (Jo 3,14)

Todos nós sabemos como foi difícil para Jesus fazer-se compreender, tanto junto dos discípulos que tinha escolhido para partilharem a sua intimidade, como junto de todos aqueles que se aproximavam dele com alguma questão, fossem eles fariseus ou saduceus, simples povo necessitado de pão ou escribas conhecedores da lei.
Face a esta dificuldade percebemos também as diversas tentativas de Jesus, a persistência e insistência uma vez que era necessário dar a conhecer a sua missão. Percebemos a forma como Jesus tudo fez para ser compreendido, ainda que algumas vezes abdique dessa obrigação face à recusa dos seus interlocutores em aceitarem o que lhes apresenta e revela.
Neste sentido surgem as parábolas, que se apresentam como enigmas ou pelo contrário como histórias perfeitamente compreensíveis para os ouvintes, pois Jesus fala das realidades da vida, das realidades do quotidiano, da vida daqueles que o ouviam.
É face a esta experiência e aos seus desaires, à incompreensão dos ouvintes, que Jesus acaba por confessar a Nicodemos a impossibilidade de falar das realidades do céu, pois se os homens não compreendiam as realidades terrenas e não acreditavam, como poderiam compreender e acreditar se lhes falasse das realidades divinas do céu?
De facto os seus ouvintes, tal como tantas vezes nós próprios, sofriam desse desejo de controlar o conhecimento que lhes era oferecido, de pela razão apoderarem-se dele de modo a moldá-lo a si mesmos e às suas necessidades. Tal como Nicodemos formulavam sempre a questão do porquê e do como, que ainda hoje nós formulamos.
E no entanto há questões que não têm respostas, há realidades face às quais não nos interrogamos, aceitamos simplesmente, porque como no amor há razões que a razão desconhece. Também na fé há razões que a razão desconhece, realidades a que a razão por si só não consegue dar uma resposta.
A fé exige assim a aventura, o arriscar os cumes da confiança numa realidade, e sobretudo numa pessoa, que nos escapa, que se nos apresenta como incógnita e incompreensível. A fé exige o amor, uma experiência de paixão e enamoramento que dá a razão sem razão de se acreditar, de se avançar apesar da noite ou da cegueira em que nos encontramos.
Necessitamos por isso perder o medo de avançar, apesar da noite; necessitamos libertar-nos desse desejo de tudo compreender, de tudo racionalizar, de tudo querer controlar. A fé é um dom que nos é oferecido para gradualmente ir iluminando as nossas trevas e a nossa cegueira e essa iluminação será cada vez mais intensa e verdadeira na medida do nosso amor.

Ilustração: “Nicodemos”, de Nicolay Nicolayewitsch Ge, Galeria Tretyakov, Moscovo.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos

    O texto da Meditação que elaborou recorda-nos a continuação do diálogo de Jesus com Nicodemos, a confissão de Jesus sobre a incompreensão com que se debate para que a sua missão seja compreendida por quase todos e “tal como Nicodemos formulavam sempre a questão do porquê e do como, que ainda hoje nós formulamos.”
    Como nos salienta …” A fé exige assim a aventura, o arriscar os cumes da confiança numa realidade, e sobretudo numa pessoa, que nos escapa, que se nos apresenta como incógnita e incompreensível. A fé exige o amor, uma experiência de paixão e enamoramento que dá a razão sem razão de se acreditar, de se avançar apesar da noite ou da cegueira em que nos encontramos.”…
    Bem-haja por nos encorajar…” a libertar-nos desse desejo de tudo compreender, de tudo racionalizar, de tudo querer controlar” e por nos lembrar que “a fé é um dom que nos é oferecido para gradualmente ir iluminando as nossas trevas e a nossa cegueira e essa iluminação será cada vez mais intensa e verdadeira na medida do nosso amor.”
    Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha da Meditação, sempre bem-vinda, como esclarecimento e estímulo, no caminho que vamos percorrendo, muitos de nós, com fé, com momentos de dúvida, de interrogação, continuando a busca de Deus, não desistindo da procura da Luz de Cristo.
    Peçamos ao Senhor que o ilumine e o abençõe e que nos ajude no nosso peregrinar.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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