sexta-feira, 6 de abril de 2012

Homilia da Celebração da Paixão do Senhor Jesus

Terminada a ceia pascal, na qual Jesus se despediu dos seus discípulos e lhes deixou as últimas recomendações, algum conforto para o que iria suceder imediatamente a seguir, Jesus retira-se na noite para o jardim das oliveiras com os discípulos.
Para lá chegar tem que atravessar a torrente do Cedron, a torrente que também David atravessou quando se viu obrigado a abandonar a cidade de Jerusalém face à traição de seu filho Absalão. A cidade de Jerusalém e as traições que lhe estão associadas ficam para trás, e no jardim das oliveiras Jesus espera o momento da sua hora.
Hora que chega com a aproximação dos soldados romanos e da guarda do templo conduzidos por Judas para o prenderem e levarem às autoridades judaicas e romanas.
A multidão militar vem de noite, como se fosse necessário uma emboscada, como se da parte de Jesus houvesse alguma perspectiva de resistência e combate. Do seu grupo apenas Pedro se servirá da violência para tentar proteger o Mestre, mas é imediatamente repreendido porque a violência não o deixará levar até ao fim o cumprimento da vontade do Pai.
Quando os soldados chegam com Judas é Jesus que se lhes dirige, que sai ao seu encontro, manifestando dessa forma a linha da autoridade e a sua própria iniciativa. Não é ninguém que lhe tira e vida ou o prende, é ele que a dá e se oferece, é ele que se deixa prender porque o seu reino não é deste mundo, mas fazer a vontade do Pai só é possível neste mundo.
Ao aproximar-se da soldadesca Jesus pergunta-lhes quem procuram e quando recuam e tombam volta a perguntar-lhes quem procuram, a quem buscam.
Tal iniciativa e pergunta não visa meramente identificá-lo, porque estando Judas a conduzir a multidão, como pastor de lobos malfeitores, não haveria essa necessidade, poderia identificá-lo. A pergunta de Jesus visa assim obrigar aqueles homens, e entre eles também Judas, a confrontar-se com a identidade daquele que vinham prender.
Ao perguntar por quem buscavam, Jesus manifesta o desejo de eles pronunciarem o seu nome, de o identificarem, para que a sua prisão não caísse no esquecimento, não fosse apenas mais um caso de polícia.
Aqueles soldados romanos e do templo têm assim que se confrontar com Jesus, com aquele Jesus de Nazaré que sempre tinha ensinado no templo, que tinha feito milagres, que tinha escapado outras vezes das suas mãos, mas agora estava ali à mão para se deixar apanhar. Aquele Jesus que era filho de carpinteiro, mas que eles também tinham reconhecido como o Messias esperado quando o aclamaram na entrada gloriosa em Jerusalém montado num jumentinho.
A pergunta que Jesus formulou àqueles homens permanece hoje dirigida a cada um de nós, aos seus discípulos, àqueles que acreditam em Jesus como Filho de Deus, porque afinal necessitamos saber quem buscamos, necessitamos confrontar-nos com a pessoa e a realidade de Jesus o Nazareno.
E neste sentido, face ao encontro, à revelação, também em nós muitas coisas caiem por terra, são derrubadas, porque as nossas expectativas, os nosso medos, os nossos preconceitos, algumas falsas imagens, não nos deixam encontrar plenamente com o verdadeiro Jesus de Nazaré. E é bom que caiam, que sejam derrubadas, para que o encontro com Jesus não seja um desencontro, uma passagem fugaz na noite escura, mas um encontro luminoso como o de Maria Madalena na manhã da ressurreição.
À pergunta de Jesus, “a quem buscais”, necessitamos pois de dar uma resposta, uma resposta verdadeira, livre dessas falsas imagens e preconceitos, mas para o poder fazer não podemos esquecer nem retirar do nosso horizonte a dimensão dramática que vivemos nesta Sexta-feira Santa, a paixão e morte de Jesus, fruto da violência e do ódio dos homens, sobre a qual se joga o amor de Jesus e o seu sentido de cumprimento da vontade do Pai.
Procuremos pois dar uma resposta a Jesus, uma resposta verdadeira e que se explicitará no amor aos irmãos, no serviço à verdade e à justiça à semelhança do mesmo Jesus e da sua entrega de vida.

Ilustração: “A prisão de Jesus”, por Guercino, Fitzwilliam Museu, Cambridge.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    O texto da Homilia da Celebração da Paixão do Senhor que teceu e a forma como aborda e interpreta o pedido de identificação de Jesus no jardim das oliveiras no “momento da sua prisão pelos soldados romanos e da guarda do templo conduzidos por Judas” para nos dizer que “aqueles que acreditam em Jesus como Filho de Deus” precisam de aprender quem é Jesus, revela-se de grande importância para cada um de nós.
    Como nos salienta ...” A pergunta de Jesus visa assim obrigar aqueles homens, e entre eles também Judas, a confrontar-se com a identidade daquele que vinham prender.
    Ao perguntar por quem buscavam, Jesus manifesta o desejo de eles pronunciarem o seu nome, de o identificarem, para que a sua prisão não caísse no esquecimento, não fosse apenas mais um caso de polícia. (…)
    A pergunta que Jesus formulou àqueles homens permanece hoje dirigida a cada um de nós, aos seus discípulos, àqueles que acreditam em Jesus como Filho de Deus, porque afinal necessitamos saber quem buscamos, necessitamos confrontar-nos com a pessoa e a realidade de Jesus o Nazareno.”…
    Como nos adverte o encontro com Jesus que buscamos pode não ser um verdadeiro encontro.
    E neste sentido, face ao encontro, à revelação, também em nós muitas coisas caiem por terra, são derrubadas, porque as nossas expectativas, os nossos medos, os nossos preconceitos, algumas falsas imagens, não nos deixam encontrar plenamente com o verdadeiro Jesus de Nazaré. E é bom que caiam, que sejam derrubadas, para que o encontro com Jesus não seja um desencontro, uma passagem fugaz na noite escura, mas um encontro luminoso como o de Maria Madalena na manhã da ressurreição.”…
    Bem-haja por nos exortar a “procurar dar uma resposta a Jesus, uma resposta verdadeira e que se explicitará no amor aos irmãos, no serviço à verdade e à justiça à semelhança do mesmo Jesus e da sua entrega de vida, lembrando-nos que …” para o poder fazer não podemos esquecer nem retirar do nosso horizonte a dimensão dramática que vivemos nesta Sexta-feira Santa, a paixão e morte de Jesus, fruto da violência e do ódio dos homens, sobre a qual se joga o amor de Jesus e o seu sentido de cumprimento da vontade do Pai.”
    Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha da Homília, profunda, com um cariz inovador, pela forma como aborda a problemática de Jesus como Filho de Deus para os crentes, por nos tornar presente que o processo de conversão de cada um de nós é permanente . Que o Senhor o ilumine e o proteja.
    Um Santo Sábado e um Santo Domingo de Páscoa.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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