É no meio da ceia
pascal, quando todos estavam reunidos em festa, que Jesus anuncia ao grupo dos discípulos
que um deles o vai entregar, o vai trair. As manobras que Judas tinha andado a
realizar em segredo, às escondidas, aparecem agora veladamente descobertas.
Ao saber o que se
tramava e quem era o autor das manobras de traição, Jesus podia apenas
dirigir-se a ele, falar com ele em privado, confrontá-lo com a traição. Contudo,
Jesus não faz isso, pelo contrário levanta no grupo e no meio da festa a
suspeita, deixando cada um a questionar-se, “serei eu senhor?”
Numa abordagem
malévola poder-se-ia dizer que Jesus tinha uma personalidade complicada, que
gostava de provocar, de deixar tudo e todos perturbados, de ser um desmancha-prazeres,
pois com aquela afirmação deixava tudo em suspenso, certamente um ambiente
pesado na sala onde antes reinava a alegria.
A interrogação de cada
um dos discípulos, e depois do próprio Judas, põe em evidência que a afirmação
de Jesus não era uma afirmação gratuita, não tinha qualquer interesse em criar
mau ambiente, mas revelar a cada um dos presentes a possibilidade real de
traição. Cada um deles podia entregar Jesus, podia atraiçoá-lo. Não se
perguntaram todos pela possibilidade? Não é afinal uma possibilidade que nos
atinge a todos, à qual todos estamos vulneráveis?
Há mil maneiras e
possibilidades de entregar o Mestre, de atraiçoar Jesus, de o deixar só face ao
mundo que o condena. De cada vez que nos escondemos, que nos silenciamos na
defesa da fé ou da Igreja, de cada vez que evidenciamos o nosso orgulho ou a
nossa inveja, de cada vez que nos deixamos aliciar por ideias e valores que se
assemelham aos cristãos mas na sua verdade inviabilizam o mistério de salvação
que Jesus realiza. E tantas outras formas possíveis!
Cada um de nós pode
entregar Jesus aos verdugos, àqueles que o expõem ao ridículo, e se umas vezes
tal acontece por actos concretos de cada um, muitas vezes acontece porque nos
calamos, porque somos omissos, porque não estamos para nos implicar e correr o
risco de dar a vida, ou a boa imagem que os outros têm de nós. Afinal Jesus
pode funcionar como mais um produto de consumo, que quando se torna mais caro
deixamos na prateleira.
Tal atitude tem como consequência
uma desgraça, pois como Jesus diz relativamente a Judas, melhor seria que não
tivesse nascido. Construímos a nossa própria condenação, tornamo-nos os
carrascos de nós próprios, porque ainda na desgraça da traição Jesus não deixa
de nos chamar amigos, tal como chamou a Judas quando ele se apresentou com os
soldados e a multidão para o prender.
Jesus não deixa de nos
estender a mão, Jesus não quer a nossa perda, mesmo na traição, uma vez que
essa perda representa a negação do seu mistério redentor. Ele deu a sua vida
pelos pecadores quando ainda eramos pecadores, para que na nossa traição pudéssemos
acolher o dom da sua vida e do seu amor, o dom do perdão sempre oferecido.
Saibamos acolhê-lo com
humildade e em espirito de agradecimento!
Era importante não esquecermos nunca que Jesus não quer que nos percamos, mesmo quando O traímos, O esquecemos, nos afastamos d´Ele Jesus estende-nos sempre a Sua mão para nos reconduzir. Porque será que tantas vezes não O vemos? Inter Pars
ResponderEliminarCaro Frei José Carlos,
ResponderEliminarNa sequência dos exames de consciência que vamos fazendo em diferentes momentos e nas mais diversas circunstâncias mas, particularmente, à medida que avançamos um passo na reflexão da Paixão e Morte de Jesus, como sentimos a nossa vulnerabilidade, como podemos ser simultaneamente vítimas e carrascos nas nossas vidas, “verdugos” na vida do próximo, ainda que racionalmente não o consigamos admitir. Não precisamos recuar muito no tempo, basta analisar a História do século XX e os acontecimentos que integrarão a história do século que decorre. A maioria de nós têm um pouco de Judas, de Pilatos, de Pedro e Paulo.
Como nos recorda …”Cada um de nós pode entregar Jesus aos verdugos, àqueles que o expõem ao ridículo, e se umas vezes tal acontece por actos concretos de cada um, muitas vezes acontece porque nos calamos, porque somos omissos, porque não estamos para nos implicar e correr o risco de dar a vida, ou a boa imagem que os outros têm de nós. Afinal Jesus pode funcionar como mais um produto de consumo, que quando se torna mais caro deixamos na prateleira.”…
É importante para alguns de nós, saber parar a tempo, não nos fecharmos, não nos refugiarmos nas nossas mágoas, nas feridas mal curadas, saber perdoar, e confiarmos que Jesus dá-nos a graça de nos renovar em permanência, abrindo-nos as janelas que forem necessárias para olharmos o infinito com fé, oração e beleza. E, quando somos os pecadores tenhamos a humildade de acolher Jesus que nos aceita por inteiro, com ternura, com misericórdia.
Um grande obrigada, Frei José Carlos, pela partilha do texto da Meditação, que nos desinstala e simultaeamente nos dá força e confiança, por lembrar-nos que Jesus…” deu a sua vida pelos pecadores quando ainda eramos pecadores, para que na nossa traição pudéssemos acolher o dom da sua vida e do seu amor, o dom do perdão sempre oferecido”. …
Obrigada pela ilustração! Que o Senhor o ilumine, o abenço e o guarde.
Continuação de um bom dia.
Um abraço mui fraterno e amigo,
Maria José Silva