Todos nós criamos as nossas expectativas, temos as nossas esperanças, e quando fazemos uma determinada opção esperamos ver os frutos, a recompensa por tudo o mais que deixámos para trás.
O grupo dos discípulos de Jesus não foge a este padrão e assim à medida que ele se encaminha para Jerusalém o medo e a incerteza vai tomando conta do grupo, bem como os desejos mais íntimos de partilha de poder e da glória.
Um pouco à socapa, com medo da inveja e da murmuração dos outros, Tiago e João pedem a Jesus um lugar no seu governo, um à sua direita e outro à sua esquerda. Eles que partilharam do momento da transfiguração podem com alguma segurança fazer esse pedido, podem estar mais livres do medo que se acerca a todo o grupo, pois viram já alguma coisa de diferente, algum do poder daquele Mestre a quem eles seguem.
Contudo o seu pedido é descabido e inevitavelmente provoca a murmuração dos outros companheiros, a manifestação da inveja e dos mesmos desejos de poder e glória que também os outros acalentavam no seu silêncio.
Perante tal desconcerto, tal divisão e visão face ao poder, Jesus vê-se obrigado a dizer-lhes o que espera, ou melhor, como entende o verdadeiro poder e como eles o devem entender e viver para poderem partilhar de qualquer glória no seu reino.
Assim, não deve ser o domínio e a força o que deve manifestar e fundamentar o poder, mas o serviço ao outro, a disponibilidade para o outro, a atenção às necessidades do outro. Dessa forma aquele que de facto quiser ser o primeiro, ter algum poder, deve começar por exercer o serviço, manifestar a disponibilidade para que se cumpra não a sua vontade mas a vontade de Deus, aceitar ser servo para a prossecução de um fim que lhe não pertence.
E como a proposta é inusitada, uma inversão dos padrões comuns da construção do poder e da autoridade, e não há qualquer outro referencial, Jesus apresenta-se a si mesmo e à sua entrega de vida como a razão para a proposta apresentada. Se ele entrega a sua vida e serve a humanidade nessa entrega, todos aqueles que quiserem partilhar da sua glória não podem deixar de fazer o mesmo.
Neste sentido podemos e devemos perguntar-nos sobre o nosso sentido de serviço e as nossas aspirações de poder e autoridade, que são realidades que indubitavelmente buscamos, mesmo quando nos propomos servir o outro. Como é que podemos libertar-nos dessa fome, dessas aspirações, que nos marcam tão profundamente mesmo nos nossos gestos mais fraternos ou solidários?
Um exercício quotidiano de humildade, de reconhecimento das nossas aspirações mais secretas pode ajudar-nos, mas necessitamos também da graça de Deus e de repetir em cada dia que se faça em nós a vontade de Deus mais que a nossa vontade. E na soma final, no que restar da cinza do desejo de poder, que o Senhor se sirva dela para ainda assim fazer o bem ao próximo.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarO texto que preparou tendo presente o Evangelho do dia de hoje (Mc 10,32-45) é profundo, directo, e leva-nos a reflectir sobre o comportamento, os desejos do ser humano que são semelhantes à reacção do grupo dos discípulos de Jesus. Como nos lembra ...” Todos nós criamos as nossas expectativas, temos as nossas esperanças, e quando fazemos uma determinada opção esperamos ver os frutos, a recompensa por tudo o mais que deixámos para trás.” Permita-me que transcreva alguns dos parágrafos que escreveu que me sensibilizam e fazem reflectir particularmente :
…” Assim, não deve ser o domínio e a força o que deve manifestar e fundamentar o poder, mas o serviço ao outro, a disponibilidade para o outro, a atenção às necessidades do outro.”… (…)
…” E como a proposta é inusitada, uma inversão dos padrões comuns da construção do poder e da autoridade, e não há qualquer outro referencial, Jesus apresenta-se a si mesmo e à sua entrega de vida como a razão para a proposta apresentada. Se ele entrega a sua vida e serve a humanidade nessa entrega, todos aqueles que quiserem partilhar da sua glória não podem deixar de fazer o mesmo.”…
E Frei José Carlos coloca a questão sobre o nosso “sentido de serviço … mesmo quando nos propomos servir o outro” e de como podemos libertar-nos …” dessa fome, dessas aspirações, que nos marcam tão profundamente mesmo nos nossos gestos mais fraternos ou solidários”.
Que o Senhor nos ajude nas nossas reflexões diárias a descobrir nos sítios mais recônditos do nosso ser a vontade de poder e autoridade e tenhamos a humildade e a vontade de reconhecer o que necessitamos corrigir com a graça de Deus e “de repetir em cada dia que se faça em nós a vontade de Deus mais que a nossa vontade”.
Obrigada Frei José Carlos pela partilha da Meditação, pela forma frontal e digna com que aborda um tema tão importante e delicado. Bem haja.
Um abraço fraterno
Maria José Silva
Frei José Carlos,
ResponderEliminarObrigada por este belo e maravilhoso texto que nos ajuda na Meditação quotidiana.É tão enriquecedora para todos quantos a lêrem.Foi uma partilha que gostei muito.Frei José Carlos,muito obrigada por todos os textos maravilhosos que tem proposto para ajudar-nos mais profundamente .
Bem haja por esta partilha.
Desejo-lhe uma boa semana.
AD