terça-feira, 29 de março de 2011

Perdoar sete vezes? (Mt 18,21)

É Pedro que coloca esta questão a Jesus e, face a outros dados que encontramos nos Evangelhos sobre Pedro e o seu temperamento, é fácil perceber que a questão deve ter surgido em virtude de alguma discussão com qualquer outro discípulo. Depois de tantos encontros e desencontros, de tantas desculpas, Pedro vem ter com o Mestre já cansado e impotente para uma vez mais perdoar, procurando uma resposta para a dificuldade em que se encontra.
Podemos imaginar que Pedro colocou a questão quase em segredo, como não querendo agravar ainda mais a situação, mas buscando uma resposta que afinal fosse ao encontro do seu desejo de satisfação, o respaldo do Mestre para uma atitude violenta que já considerava inevitável e justa.
Face a esta situação, Jesus lança a Pedro a resposta desafiante da necessidade do perdão infinito, de se perdoar o outro até setenta vezes sete, porque só dessa forma se pode verdadeiramente viver o perdão e alcançá-lo. Não há nem pode haver um limite para o perdão, uma fasquia a partir da qual o perdão pode ser trocado pela vingança, pode dar lugar ao extravasar dos sentimentos feridos e das frustrações. Se vivemos o perdão dessa forma rapidamente chegamos ao limite porque é sempre muito baixa a fasquia que estabelecemos face ao nosso orgulho ferido e à nossa dignidade ofendida.
A proposta de Jesus é assim um desafio à nossa liberalidade, magnanimidade, à nossa misericórdia, mas é também um reconhecimento da liberdade do outro, da necessidade de reconhecermos no outro a possibilidade de conversão, de erro de que se pode corrigir, mas sobretudo de um outro que também Deus acompanha e portanto nos convida a olhar com outros olhos.
E este olhar diferente é ainda mais exigente na medida em que, como nos conta a parábola, já fomos objecto de perdão, de gestos de misericórdia e compaixão por parte de outrem, pela parte de Deus. Se no seu amor Deus foi capaz de reconhecer em nós o desejo de mudança e aceitar essa possibilidade com tudo o que ela tem de fragilidade, também nós somos convidados a reconhecer no outro os seus limites e fraquezas confinantes ao mesmo desejo de fazer melhor e diferente.
E juntos poderemos chegar lá, na liberdade e no respeito pelas diferenças, na partilha do que nos une no caminho que cada um trilha pessoalmente com Deus.

2 comentários:

  1. Frei José Carlos,

    Leio e volto a ler a Meditação que partilha connosco para saborear a pertinência, a verdade incomensurável , a beleza, o convite, o desafio que as palavras encerram.
    E que difícil agir como nos propõe, perdoar sem ressentimentos, “ do íntimo do coração”, dar novas oportunidades, no respeito pelas diferenças ...
    Como afirma no texto ...” A proposta de Jesus é assim um desafio à nossa liberalidade, magnanimidade, à nossa misericórdia, mas é também um reconhecimento da liberdade do outro, da necessidade de reconhecermos no outro a possibilidade de conversão, de erro de que se pode corrigir, mas sobretudo de um outro que também Deus acompanha e portanto nos convida a olhar com outros olhos.
    E este olhar diferente é ainda mais exigente na medida em que, como nos conta a parábola, já fomos objecto de perdão, de gestos de misericórdia e compaixão por parte de outrem, pela parte de Deus.”…
    Que longo caminho que falta percorrer a muitos de nós para …”reconhecer no outro os seus limites e fraquezas confinantes ao mesmo desejo de fazer melhor e diferente.
    E juntos poderemos chegar lá, na liberdade e no respeito pelas diferenças, na partilha do que nos une no caminho que cada um trilha pessoalmente com Deus.”
    Que o Senhor nos conceda a capacidade de amar sinceramente o nosso próximo, para poder perdoá-lo sempre que tal se revelar necessário, como Deus nos perdoa, para que todos, sem excepções, possamos participar na construção de um Mundo melhor.
    Obrigada Frei José Carlos pela partilha. É um texto profundo que nos ajuda na reflexão sobre os nossos comportamentos, que nos exorta. Bem haja.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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  2. Frei José Carlos,

    Agradeço-lhe este belo texto que propõe para a nossa Meditação,que partlha connosco,o convite,o desafio que as palavras encerram,não é fácil agir,por vezes bem difícil se pode viver o perdão e alcançá-lo.
    Pedro na mensagem enviada por Deus,vê como Ele ao dar-nos a vida,também nos dá a liberdade de agir.Mas Deus como Pai,perdoa-nos em plenitude,muito embora possamos cometer os maiores erros.É este ensinamento que Ele espera de nós para com os outros.Perdoar sem limites.
    Como nos diz o Frei José Carlos,no texto,e juntos poderemos chegar lá,na liberdade e no respeito pelas diferenças,na partilha que nos une no caminho que cada um trilha pessoalmente com Deus.
    Obrigada por esta partilha muito rica e profunda que me ajudou muito,vem sempre ao encontro das nossas dificuldades.Bem haja,Frei José Carlos.
    Um abraço fraterno.
    AD

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