Fazer algo de
diferente provoca inevitavelmente comentários, questões. Tal sucedeu com os discípulos
de João Baptista que, ao verem que os discípulos de Jesus não jejuavam, se viram
obrigados a perguntar porquê.
Jesus responde-lhes de
uma forma que nos mostra que há um tempo para o jejum assim como há um tempo
para a festa, há tempos diferentes que provocam situações diferentes.
Contudo, e apesar da
diferença dos tempos e dos modos, há uma questão mais fundamental, uma questão
que ultrapassa o jejuar ou não jejuar, e que é a questão do ser. Afinal ser ou não
ser é a questão que se nos coloca.
Jejuar, enfastiar-se
de comida, ou outras realidades, são questões de ser, são expressões da nossa
interioridade e da liberdade que nela desenvolvemos ou vivemos.
Assim, o jejum e a
oração que somos convidados a viver são expressões de um desejo, de uma falta
que sentimos em nós e nos leva a confrontarmo-nos com ela própria, a fazê-la
presente de uma forma quase palpável.
Pelo jejum e pela
oração experimentamos as nossas limitações, a nossa incapacidade de agarrar nas
mãos o Deus em que acreditamos, bem como a nossa própria pessoa nas suas
fragilidades e incapacidades.
Vivemos uma história
que nos escapa, pois na medida em que Deus está presente está também ausente,
na medida em que sentimos as nossas forças e potencialidades reconhecemos
também as nossas fraquezas e incapacidades.
Tal história pode
conduzir-nos ao desalento, ao desânimo, a um sentimento de frustração, que não
podemos deixar de reconhecer nos marca a todos de diversos modos, e
infelizmente encontramos como uma desculpa para o abandono da vida da fé entre
tantos cristãos.
Contudo, esta frustração
não é um mal, não é uma condenação de um deus sádico, bem pelo contrário, deve
ser vista como uma consciência, um desejo de mais e melhor que habita em nós e
nos deve portanto mover a dar outros passos e mais passos no sentido da
satisfação.
O jejum que somos
convidados a viver é assim uma experiência de renovação do nosso desejo, da
nossa vontade de sermos cada vez mais e melhores.
Colocamo-nos assim na
linha das palavras de Jesus de que quem procura acha, e quem acha procura ainda
mais porque sente mais desejo, sente mais fome.
Que nesta Quaresma o
nosso jejum, a nossa oração e a nossa esmola aumentem em nós o desejo de ser, a
fidelidade à condição de filhos amados de Deus.
Ilustração: Vitral da
rosácea sobre a porta de entrada da Catedral de São Pedro de Genebra.
Obrigada pela visão optimista e consoladora da frustação,do desalento, do desânimo, como o desejo do mais e do melhor que já habita em nós.
ResponderEliminarÉ esperança duma Quaresma mais vivida.Inter Pars
Frei José Carlos,
ResponderEliminarAo iniciarmos o caminho quaresmal, o texto da Meditação que teceu é de grande espiritualidade, sobre o sentido do jejum, da oração, da esmola na vida cristã, indo ao fundamental: ser ou não ser eis a questão que se nos coloca, como nos refere.
E, se me permite, passo a respigar algumas passagens que me tocam. …” Assim, o jejum e a oração que somos convidados a viver são expressões de um desejo, de uma falta que sentimos em nós e nos leva a confrontarmo-nos com ela própria, a fazê-la presente de uma forma quase palpável.
Pelo jejum e pela oração experimentamos as nossas limitações, a nossa incapacidade de agarrar nas mãos o Deus em que acreditamos, bem como a nossa própria pessoa nas suas fragilidades e incapacidades.
Vivemos uma história que nos escapa, pois na medida em que Deus está presente está também ausente, na medida em que sentimos as nossas forças e potencialidades reconhecemos também as nossas fraquezas e incapacidades.(…)
(…) Colocamo-nos assim na linha das palavras de Jesus de que quem procura acha, e quem acha procura ainda mais porque sente mais desejo, sente mais fome.”…
Façamos nossas as palavras de convite de Frei José Carlos e peçamos ao Senhor …” Que nesta Quaresma o nosso jejum, a nossa oração e a nossa esmola aumentem em nós o desejo de ser, a fidelidade à condição de filhos amados de Deus.”
Grata, Frei José Carlos, pelas palavras partilhadas, de compreensão, de alento, de incentivo, de fraternidade.
Que o Senhor o ilumine, o guarde e abençoe.
Bom descanso.
Votos de um bom fim-de-semana.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva
P.S. Permita-me que partilhe um poema para rezar.
A VIDA
EM PROCESSO
DE
FLORESCIMENTO
São os primeiros dias da Quaresma, Senhor. Eu sei que este é um tempo para pôr-a-vida-em-processo-de-florescimento. Vivemos triturados na digestão que o mundo faz de nós próprios. Trazemos o ser hipotecado ao ter. Corremos de um lado para outro, reféns e instrumentos, mais do que autónomos e criativos. Mergulhar no caminho quaresmal (de oração, de penitência de caridade ...) liberta-nos, concede-nos um olhar novo sobre as coisas, cria no nosso coração zonas de disponibilidade para o que é essencial, possibilita o exercício do pensamento e do discernimento, melhora o sentido de humor, fortalece o ser.
(In, “Um Deus que Dança”, Itinerários para a oração, José Tolentino Mendonça)