domingo, 25 de setembro de 2011

Homilia do XXVI Domingo do Tempo Comum

Ao contrário do que habitualmente acontece em outras ocasiões, na leitura do Evangelho que escutámos, é Jesus que coloca uma questão aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos do povo. Não é uma armadilha, como estes, juntamente com os fariseus, costumavam praticar com ele, é uma pergunta simples, concreta, face a um comportamento que pode passar perfeitamente à margem de qualquer juízo moral.
E isto porque qualquer resposta positiva ou negativa, qualquer sim ou qualquer não, é condicionado por várias circunstâncias e muitas vezes o sentido da resposta ou compromisso pode alterar-se em virtude da alteração das condições e circunstâncias.
Podemos responder positivamente a um pedido porque nos agrada o solicitado, porque vislumbramos uma maneira de nos satisfazermos na nossa imagem pessoal, ou até na nossa imagem social, porque no momento pode ser a forma mais fácil de nos libertarmos de uma impertinência.
Por outro lado podemos responder negativamente porque nos sentimos cansados ou sem forças, porque não vemos sentido para o que se nos pediu, porque nos desagrada a companhia das pessoas com quem temos de realizar a tarefa pedida. Há todo um conjunto de condicionantes às respostas que damos, algumas delas até bastante profundas e que interferem com a nossa personalidade, com a nossa concepção de pessoas e de vida.
Contudo, e como também já verificámos na nossa vida, nenhuma resposta é definitiva ou irrevogável, e tal como o filho, que respondeu negativamente ao pai. podemos mudar a nossa resposta através da implicação na tarefa solicitada. Podemos como nos convida Jesus converter-nos, alterar o rumo das nossas decisões e as implicações inerentes.
Este processo, esta alteração, que acontece muitas vezes em função de um desejo momentâneo, ou de uma faísca de consciência ou paixão, exige por um lado um esforço, um exercício continuado e por outro um entusiasmo assente na verdadeira acepção da palavra.
Assim, não podemos querer uma transformação momentânea, uma revolução instantânea, como aconteceu com um frade amigo que depois de professar solenemente se interrogava porque não tinha ficado livre de alguns desejos menos consentâneos com o assumido livre e responsavelmente. De facto, o seu compromisso, o seu sim exigia, como exigem todos os nossos sins, um exercício, uma prática cuidada, uma resposta que se perpetua no tempo e não se limita àquele exacto momento, uma actualização que tem muito de conversão e empenhamento.
Usando uma metáfora, podemos dizer que recebemos uma daquelas arcas ou escrivaninhas que as nossas avós sempre cuidaram, limpando, encerando, protegendo-a dos nossos pontapés de miúdos traquinas. Para que em nossa casa e connosco não se encha de caruncho, mas se mantenha bonita como sempre a gostámos de ver, temos que continuar a limpá-la, a encerá-la e a cuidá-la todos os dias. Assim o mesmo com os nossos compromissos e as nossas respostas
Não é tarefa fácil, razão pela qual muitas vezes os nossos sins se convertem em nãos, ou pelo menos ficam em banho-maria, aguardando melhores momentos, circunstâncias mais oportunas ou favoráveis. É neste momento que entra ou deve entrar o entusiasmo, um sentimento que não se resume a mera fruição da obra a realizar ou satisfação pelo fim a alcançar.
Tendo em conta que na sua raiz grega entusiasmo significa com Deus (en theo), quando colocamos entusiasmo nas nossas opções, nas nossas decisões, estamos a colocar Deus pelo meio, a implicá-lo e a implicar-nos na concretização da resposta dada e a alcançar na sua plenitude e finalidade. E neste sentido, uma vez mais, não podemos deixar de estar abertos à colaboração de Deus, receptivos aos dons e às orientações que Deus nos dá e nos podem levar até muito mais longe do que suspeitávamos ou sonhávamos.
Deus está do nosso lado, está aberto à possibilidade de alteração dos nossos compromissos e decisões, considera a nossa liberdade e está atento para que nas nossas opções de justiça e de vida não sejamos confundidos. Por essa razão São Paulo nos apresenta na Carta aos Filipenses o grande mistério da humilhação humana do divino Jesus, porque por meio desse mistério podemos aprender que apesar das nossas fraquezas e debilidades, das nossas infidelidades, Deus vem ao nosso encontro, já veio ao nosso encontro para que tudo possamos realizar com Ele.
Peçamos portanto ao Senhor que nos fortaleça com essa confiança de o sabermos connosco e de perseverarmos diligentemente nas nossas respostas e opções que constroem a Vida.

2 comentários:

  1. Frei José Carlos,

    Leio, reflicto no texto da Homilia do XXVI Domingo que preparou e connosco partilha. A liturgia deste domingo que parecera-me simples ganhou outra dimensão ao ler o texto que elaborou. Não sei se, em síntese, poderia falar do “apelo à conversão”. Parece-me que vai mais além, que esse apelo se insere num processo dinâmico de transformação, marcado pelas acções que vamos realizando, condicionado pelas realidades do quotidiano, aferido pelo seguimento de Jesus, marcado pela verdade com que abraçámos e vivemos o projecto de Deus no presente, no pressuposto da liberdade que nos foi conferida, não nos podendo refugiar ou condenar pelo passado.
    E como nos salienta ...” Contudo, e como também já verificámos na nossa vida, nenhuma resposta é definitiva ou irrevogável, e tal como o filho, que respondeu negativamente ao pai, podemos mudar a nossa resposta através da implicação na tarefa solicitada. Podemos como nos convida Jesus converter-nos, alterar o rumo das nossas decisões e as implicações inerentes.
    Este processo, esta alteração, que acontece muitas vezes em função de um desejo momentâneo, ou de uma faísca de consciência ou paixão, exige por um lado um esforço, um exercício continuado e por outro um entusiasmo assente na verdadeira acepção da palavra. (…)
    Não é tarefa fácil, razão pela qual muitas vezes os nossos sins se convertem em nãos, ou pelo menos ficam em banho-maria, aguardando melhores momentos, circunstâncias mais oportunas ou favoráveis. É neste momento que entra ou deve entrar o entusiasmo, um sentimento que não se resume a mera fruição da obra a realizar ou satisfação pelo fim a alcançar.”
    Obrigada por nos recordar que ...” Deus está do nosso lado, está aberto à possibilidade de alteração dos nossos compromissos e decisões, considera a nossa liberdade e está atento para que nas nossas opções de justiça e de vida não sejamos confundidos.”…
    Peçamos ao Senhor que reforce a nossa fé e confiança “de o sabermos connosco “ e que Jesus Cristo, sentido da vida, seja assumido por nós, apesar das nossas dificuldades e fragilidades, vivendo o Seu exemplo, no presente e nas acções que praticamos.
    Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha, profunda, que nos interroga e reconforta. Bem-haja.
    Votos de uma boa semana.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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  2. Quanto mais lermos sobre uma meditação, mais coisas descobrimos que nos podem ajudar a crescer.
    Obrigada pela partilha!

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