A leitura do Evangelho
de São Lucas que escutámos exorta-nos à vigilância, a estar preparados para a
vinda do Senhor, pois não sabemos nem a hora nem o dia. Neste sentido, podemos
assumir que o ser cristão, o ser discípulo de Jesus, é um modo de vigilância. A
vida cristã está assente nessa necessidade de estar vigilantes e preparados
face ao Senhor que vem.
Podemos também assumir
que não é uma tarefa fácil, e certamente por essa razão muitos homens e
mulheres abdicam de vigiar e esperar o Senhor, consideram até que tal exigência
ou necessidade é uma espécie de escravatura.
Como posso afinal
viver em constante estado de alerta, em constante vigilância, sacrificando a
minha liberdade e até a minha autonomia numa espera que tantas vezes parece
infrutífera, inalcançável, pois parece que o Senhor não vem?
A exortação evangélica
à vigilância, e nomeadamente no texto de São Lucas que escutámos, está entrelaçada
com a bem-aventurança, pois Jesus diz que são felizes aqueles que esperam a
vinda do seu Senhor, são felizes aqueles que o Senhor encontrar vigilantes e
administrando com justiça os bens que lhe foram consagrados.
A bem-aventurança, a
felicidade, não está assim dependente da chegada do Senhor, não é uma
recompensa dada à chegada do Senhor, mas é uma realidade e uma condição natural
à mesma espera e vigilância. Aquele que vigia é já feliz.
Esta felicidade deriva
da atitude de fé, dessa garantia dos bens que se esperam e da certeza das
realidades que não se vêem, de que nos falava a Epístola aos Hebreus. Tal como
Abraão, Isaac e Jacob acreditaram no que lhes tinha sido prometido, e nessa fé
foram felizes, também a nossa caminhada e a vigilância face à expectativa dos
bens futuros, ao cumprimento da promessa do senhor que vem , nos garante já a
felicidade.
Esta vigilância feliz
é possível na medida da fé, mas igualmente na medida em que aquele que vigia e
espera reveste o seu coração do sentimento de amor que dá sem medida, sem
esperar nada em troca, sem esperar nenhuma recompensa. A felicidade da
vigilância está assim associada ao amor que não toma nada para si, ao amor
desprendido, ao amor independente, ao amor do Senhor que vem.
O amor do Senhor, que
vem sem que o saibamos quando, é assim a primeira e última razão da nossa
espera e da nossa vigilância, o único suficiente para salvaguardar a nossa
atitude e o nosso amor sem medida e sem condições. É este amor que alimenta a
fé e nos faz viver a felicidade da bem-aventurança.
Felicidade que não
resulta de uma atitude passiva, de um “dolce fare niente” enquanto se espera,
mas bem pelo contrário, é o resultado de uma tarefa árdua de manifestação e
desenvolvimento do próprio amor original através do amor aos irmãos.
A vigilância cristã é
assim um serviço, um chamamento ao serviço dos irmãos, à semelhança do serviço
que o próprio Senhor realizou pelo mistério da sua Encarnação. E por
conseguinte é também uma boa administração dos bens que nos foram consagrados,
um conjunto de bens e de dons de que não somos proprietários mas apenas
administradores.
Na medida em que esses
bens e dons são administrados na expectativa da vinda do Senhor, no desejo de
lhe prestar o melhor serviço, a felicidade acontece pela própria realização da
administração justa e misericordiosa, pela semelhança com a administração
amorosa do Senhor.
A vigilância activa e
bem-aventurada a que Jesus nos exorta e convida conduz-nos à experiência de uma
outra realidade, muito mais geradora de felicidade, a essa experiência do
encontro com o Senhor que já não nos trata por servos mas por amigos.
A vigilância cristã é
assim um aprofundar da relação, um caminhar na amizade do amigo que vem, e como
tal tudo se conjuga e realiza para a felicidade mútua, felicidade que se
desfruta desde já na expectativa e na alegria do encontro a acontecer.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarO texto da Homília do XIX Domingo do Tempo Comum que teceu é profundo e dá-nos pistas para a compreensão do excerto do Evangelho de S.Lucas, do qual passo a respigar …” A vigilância cristã é assim um serviço, um chamamento ao serviço dos irmãos, à semelhança do serviço que o próprio Senhor realizou pelo mistério da sua Encarnação. E por conseguinte é também uma boa administração dos bens que nos foram consagrados, um conjunto de bens e de dons de que não somos proprietários mas apenas administradores”…
Peçamos ao Senhor que sejamos verdadeiros testemunhos de Jesus que nos deu tudo, fazendo o caminho com Ele, escutando e praticando a Sua palavra que nos ilumina, administrando e partilhando todos os dons que nos foram dados com os outros para que o mundo seja melhor, mais justo, fraterno e solidário.
Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Homília, por recordar-nos que …” A vigilância cristã é assim um aprofundar da relação, um caminhar na amizade do amigo que vem, e como tal tudo se conjuga e realiza para a felicidade mútua, felicidade que se desfruta desde já na expectativa e na alegria do encontro a acontecer.“
Que o Senhor o ilumine, o abençoe e o guarde.
Votos de uma boa semana.
Bom descanso.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva