quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Por dentro estais cheios de hipocrisia e maldade! (Mt 23,28)

Os Evangelhos mostram-nos por vezes um Jesus animado por uma grande violência, com palavras e actos que soam estranhos face à sua misericórdia, à sua compaixão, à atenção que mostrava para com aqueles que se encontravam com ele.
O episódio que rapidamente nos vem à memória desta violência inusitada é o da expulsão dos vendedores do templo, mas não é o único, porque outros momentos houve, ainda que desta violência apenas nos tenham chegado as palavras, como as que dirigiu aos fariseus quando os chamou de hipócritas e sepulcros cheios de ossos mortos e podridão.
Podemos imaginar como teriam ficado estes homens, aqueles que se consideravam dignos, os que se achavam verdadeiramente cumpridores da lei e de todos os preceitos religiosos. Podemos imaginar a tensão que pairava no ar face a estas acusações e à impossibilidade de defesa face a tanta verdade e sabedoria, face à autoridade de Jesus que a multidão apreciava e reconhecia.
Contudo, face à violência de Jesus, não podemos deixar de ter presente que ela não é um gesto irreflectido, que ela não é uma consequência do seu egoísmo, um acto louco de quem já não tem outro poder de argumentação, mas pelo contrário uma manifestação de um amor e de um cuidado pelas realidades divinas que Jesus não suporta ver mal tratadas, despojadas da sua dignidade e portanto o comovem até ao ponto dessa violência.
A violência de Jesus parte dessa impossibilidade de aceitar que o coração do homem se mascare, se feche na mentira, que o espaço do diálogo com Deus se transforme num palco de teatro. A violência de Jesus deriva dessa incompatibilidade com o tráfico que tantas vezes tentamos estabelecer com Deus, dessa infelicidade que tantas vezes construímos por não enfrentarmos a verdade de nós próprios.
Percebemos assim que a acusação de Jesus face aos fariseus seja de que eles estão interiormente cheios de hipocrisia e maldade. Ainda que as suas vidas e acções sejam perfeitas e boas aos olhos dos outros homens, no interior do coração estão infectadas pela mentira e pela falsidade, é face a Deus que eles se mascaram e fingem.
Estas palavras de Jesus são para nós hoje uma profunda interpelação, porque nos situam face à nossa relação com Deus, às mascaras que também perante Deus colocamos, não nos confrontando com a verdade das nossas vidas que Deus ilumina e esclarece. Não se trata já das mascaras que colocamos face aos outros, mas das que colocamos face a Deus e de que necessitamos despojar-nos.

 
Ilustração: “Jesus e o fariseu”, figura em talha do altar do Sagrado Coração na igreja de São Vicente em Heiligenblut, Austria.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    Jesus revelou-se ao longo da vida pública como um homem sem máscaras e, consequentemente com autoridade para pôr em causa toda a forma de hipocrisia dos que a disfarçavam exterior e/ou interiormente indepentemente dos grupos donde provinha. Jesus é a Verdade.
    Como nos salienta, …” A violência de Jesus parte dessa impossibilidade de aceitar que o coração do homem se mascare, se feche na mentira, que o espaço do diálogo com Deus se transforme num palco de teatro. A violência de Jesus deriva dessa incompatibilidade com o tráfico que tantas vezes tentamos estabelecer com Deus, dessa infelicidade que tantas vezes construímos por não enfrentarmos a verdade de nós próprios.”…
    Grata, Frei José Carlos, pelas palavras partilhadas, maravilhosamente ilustradas, que nos interpelam, por exortar-nos a despojar-nos das mascaras de cada um de nós perante Deus, por recordar-nos que …” Estas palavras de Jesus são para nós hoje uma profunda interpelação, porque nos situam face à nossa relação com Deus, às mascaras que também perante Deus colocamos, não nos confrontando com a verdade das nossas vidas que Deus ilumina e esclarece.”…
    Que o Senhor o ilumine, o abençoe e o guarde.
    Votos de uma boa noite. Bom descanso.
    Um abraço fraterno e amigo,
    Maria José Silva

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