domingo, 19 de abril de 2009

HOMILIA II DOMINGO DA PÁSCOA


Meus Irmãos

Antes da reforma litúrgica levada a cabo com o Segundo Concilio do Vaticano o domingo que hoje denominamos como domingo da misericórdia era conhecido e denominado por “domingo in albis”.
Era o domingo a seguir à Pascoa no qual os baptizados na Vigília Pascal retiravam a veste branca que tinha recebido no baptismo. Com este gesto o baptizado ficava a fazer parte de uma forma plena da comunidade dos crentes e baptizados.
Comunidades que vimos apresentada e definida na leitura dos Actos dos Apóstolos, uma comunidade que mais que uma realidade é um projecto, um modelo a edificar e concretizar.
Sabemos pela história, por outros relatos dos próprios Actos dos Apóstolos e pelas cartas de São Paulo que as primeiras comunidades cristãs não eram tão perfeitas como nos é apresentado nesta passagem do livro dos Actos dos Apóstolos. Havia problemas e problemas gravíssimos, o que nos pode fazer interrogar o sentido e a realidade desta comunidade modelo.
Para a compreender temos que ter presente que a comunidade cristã, a comunidade dos discípulos de Jesus Cristo começou muito antes, no momento em que Jesus chamou os doze para o acompanhar. Temos que ter presente que depois das bodas de Caná houve uma transformação, ou reformulação dessa comunidade e que junto à cruz essa comunidade adquire uma nova dimensão existencial.
Depois das bodas de Caná São João diz-nos que Maria e os discípulos passaram a Cafarnaum e aí viviam em comunidade, uma comunidade que já não assentava nos laços de sangue mas numa relação de fraternidade e discipulado. A comunidade era já algo mais que um grupo de seguidores, ou um grupo de familiares.
Um elemento paradoxal desta comunidade é o próprio Judas, que para além de ter traído o Senhor era também aquele que cuidava da bolsa comum. Por este dado percebemos que havia uma economia comum, para a qual todos contribuíam, inclusive as mulheres que acompanhavam Jesus.
Junto à cruz, com a mãe e o discípulo amado, a comunidade adquire uma dimensão existencial cujo centro é o próprio Jesus, eu deixa de estar presente fisicamente mas continua e passa a estar presente através do cumprimento do mandamento do amor.
Esta é a grande questão da segunda leitura, da leitura da Carta de São João, porque a vida de Jesus, a sua morte e ressurreição, é uma manifestação desse amor de Deus por toda a humanidade e por cada um dos homens. Neste sentido somos todos convidados como discípulos a viver esse mandamento, a fazer Jesus presente, a fazer comunidade como membros desse corpo glorioso que está presente ao mesmo tempo que está ausente.
Esse é o grande sinal que nos é dado pelo Evangelho no qual Tomé duvida da ressurreição do Senhor Jesus. Tomé não estava presente aquando da manifestação de Jesus ressuscitado, um Jesus que se mantinha presente com as marcas da sua paixão, mas que ao mesmo tempo se afastava e tornava presente pela memória do seu amor. A sua dúvida obriga à manifestação e à revelação da nova realidade que Tomé assume de uma forma cabal: “Meu Senhor e meu Deus”.
Com esta afirmação de fé, com este credo, o apóstolo Tomé manifesta a sua confiança, a sua crença num Jesus que viveu e morreu, mas manifesta sobretudo a fé em Jesus que está presente na sua ausência, numa outra dimensão que só é perceptível através dos olhos da alma. É uma presença que extrapola tudo o desejado, tudo o que eles, apóstolos, tinham sonhado e aspirado. Jesus não é o rei, não é o revolucionário, não é o novo governante, é o Senhor e o Deus de cada um que acredita nele e no seu mandamento de amor.
Este facto é para cada um de nós um desafio, na medida em somos colocados perante uma realidade que vemos e desafiados a acreditar em outra realidade que não vemos mas que está presente e existe. Já não é o corpo de Jesus, o corpo que Tomé é convidado a tocar, a comprovar, é o corpo glorioso, o próprio corpo da Igreja, que tantas vezes nos parece como inexistente, como algo inatingível. Perante isto somos convidados a fazer a mesma profissão de fé que fez Tomé, meu Senhor e meu Deus, a acreditar que o corpo de que cada um é membro, está vivo, está presente, e está actuante, ainda que da nossa parte tantas vezes sejamos pouco operacionais e manifestadores dessa existência e dessa acção.
Que o Espírito Santo, que levou Pedro a fazer a sua confissão de fé, e Tomé a fazer a dele, nos ilumine o coração para sermos fiéis e verdadeiramente membros vivos deste corpo que não vemos mas pressentimos.

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