sábado, 11 de abril de 2009

MEDITAÇÃO DOMINICANA DA PAIXÃO


MEDITAÇÃO DOMINICANA DA PAIXÃO

A representação mais popular e conhecida de São Domingos, pintada pelo Beato Angélico, é simultaneamente a mais desconhecida. Habitualmente chega às nossas mãos apenas o pequeno lado direito, a figura de São Domingos lendo o livro da Sagrada Escritura, ficando toda a demais representação na sombra da beleza da figura juvenil.
Esta selecção e focalização impede-nos de admirar e conhecer aquele que é um dos mais extraordinários frescos do Beato Angélico, aquele que é o mais moderno, quase de um princípio surrealista.
Estamos perante uma representação da Paixão, tema tão caro a São Domingos e certamente também aos irmãos que conviveram com o Beato Angélico, uma vez que encontramos nas diversas celas, que ele pintou a pedido dos irmãos no Convento de São Marcos de Florença, frescos com esta temática.
Podemos dizer que estamos perante uma meditação da Paixão, ainda que uma meditação um pouco desconcertante, até um pouco macabra, uma vez que o Cristo representado está sentado e de olhos vendados, e à sua volta gira como que numa dança um conjunto de mãos e uma cara ofensiva.
São os símbolos do ultraje, da ofensa, os gritos da multidão para que fosse crucificado, as cuspidelas dos soldados romanos, a brutalidade dos socos e do chicote, a coroa de espinhos e a venda para que nada visse do que lhe preparavam. Tudo gira para o magoar, para lhe fazer mal. Em cada ícone representado está um eco dos nossos pecados e daqueles que colocaram Jesus naquela situação. É a traição de Judas e a nossa, é a debandada dos discípulos e o nosso abandono, é a inveja dos poderes religiosos e a nossa própria inveja.
Mas a isto tudo Jesus resiste com uma serenidade tremenda, sentado no seu trono real, vestido com o seu traje branco nupcial. Numa mão o ceptro e na outra a bola do mundo. Ele está a ser julgado, mas ele é que é o juiz, ele está a ser desprezado e humilhado, mas ele é que é o Rei. Há uma tranquilidade tremenda neste Cristo escarnecido, a tranquilidade de quem se sabe entregue à misericórdia do Pai, ao Amor que salva. Nada, nem os instrumentos da Paixão, pode afectar ou extinguir esse Amor, essa misericórdia, e confiança depositada.
Aos pés deste Cristo, São Domingos estuda e lê a Palavra de Deus, fazendo companhia à figura da Mãe de Jesus que no lado oposto parece abandonada. Podíamos dizer que nesta representação temos uma duplicação da entrega da Mãe ao discípulo amado e deste à Mãe de Jesus, como acontece no Evangelho de São João no momento anterior à morte de Jesus.
Depois de celebrarmos a Paixão, a morte de Jesus, fica-nos para o silêncio da contemplação esse fresco e o que ele significa. Cada um está ali representado nas ofensas da sua infidelidade; na filiação e devoção que São Domingos tinha à Mãe de Jesus; na confiança que somos convidados a ter face à integridade e nobreza com que Jesus enfrentou todos os desafios humanos e divinos. Como São Domingos permaneçamos, unidos a Maria, contemplando na Palavra, a face gloriosa oculta de Cristo Salvador.


1 comentário:

  1. Sugiro a leitura do blog do frei Fernando de Brito em:http://frbritoop.blogspot.com/

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