Uma vez mais um grupo de fariseus e escribas vem ter com Jesus. Desta vez, sabendo que ele se encontrava no templo rodeado da multidão expectante, trazem-lhe uma mulher apanhada em flagrante adultério.
É uma armadilha, pois tendo sido a mulher apanhada em flagrante delito era normal que trouxessem também o homem com quem se encontrava para também ser julgado. Mas não, o adúltero desapareceu, não o apanharam ou não o quiseram apanhar, ou então querem-no ainda apanhar nesse Jesus que cativa e seduz as multidões. Esta mulher adúltera é assim mais uma vítima da maquinação, é o isco perfeito para apanhar aquele Jesus numa palavra contra a lei e os preceitos de Moisés.
Como habitualmente Jesus não entra nestas disputas, não se sujeita à armadilha de modo a ser apanhado em flagrante, mas sabendo das intenções subjacentes a cada questão e provocação remete os seus interlocutores à lei de Deus e à incoerência das suas vidas face a essa mesma lei.
Neste caso da mulher adúltera, em que tanto ela como ele estão cercados pelo movimento de ódio e de violência, Jesus, perante a questão que lhe colocam, começa a escrever no chão, a rabiscar qualquer palavra ou sinal no pó do chão do templo. Um sinal, um gesto silencioso que apenas é quebrado face à insistência de uma resposta por parte do interlocutores. E depois continua a escrever.
Diante da interpelação “quem não tiver pecados que atire a primeira pedra” e àquilo que Jesus escreve no chão, os acusadores da mulher vão saindo, a começar pelos mais velhos, deixando a mulher apenas com Jesus.
Que escreveria Jesus no pó do chão para fazer aqueles homens recuar diante da interpelação do pecado? Que mandamento ou conjura profética poderia ter tal efeito? Ou não seria apenas o gesto de escrever o sinal de maior interpelação, a maior acusação face ao crime que cometiam com a mulher e pretendiam cometer com ele?
São João não nos quis revelar o que Jesus escreveu, o que rabiscou no pó, porque certamente era pouco significativo face ao próprio gesto. Ao escrever no chão com o dedo Jesus assume-se como alguém acima da lei com a qual o queriam julgar, assume-se como o autor dessa lei, da lei dada por Moisés mas primeiramente escrita pelo dedo de Deus nas tábuas de pedra que Moisés trouxe do monte Sinai. É o dedo de Deus que uma vez mais escreve os mandamentos.
E é perante tal acto que os homens se vão retirando, pois descobrem que a lei escrita na pedra ou no pó não lhes está escrita no coração como o profeta Ezequiel tinha profetizado, como Deus desejava do seu povo eleito. O gesto de Jesus revela-lhes assim a infidelidade e incoerência face à lei que tanto defendiam e traziam na boca, mas que não eram capazes de viver.
Neste sentido o gesto de Jesus não pode deixar também de nos interpelar, de nos questionar sobre a forma como vamos inscrevendo no nosso coração a lei de Deus e a partir desse registo vamos procurando vivê-la em cada dia e em cada situação.
Jesus escreve no chão também para nós, para nos alertar sobre a nossa fidelidade, mas também para nos dizer que a sua lei, os seus mandamentos, estão escritos no pó da nossa humanidade, da nossa condição humana, e é aí que temos que os procurar conhecer e viver.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarA Meditação que partilha connosco recorda-nos os acontecimentos principais do diálogo de Jesus com o grupo de fariseus e escribas e com a mulher adúltera segundo o Evangelho de S. João (8,6) e o significado desta narrativa para os vários intervenientes e também para nós. E como nos afirma no texto ...” Jesus escreve no chão também para nós, para nos alertar sobre a nossa fidelidade, mas também para nos dizer que a sua lei, os seus mandamentos, estão escritos no pó da nossa humanidade, da nossa condição humana, e é aí que temos que os procurar conhecer e viver.”
Encontramos no gesto de Jesus o amor misericordioso de Deus, perdoando a mulher. Porém, lembra-lhe a necessidade de assumir um compromisso, dizendo-lhe que não volte a pecar.
Ao reconhecer-nos pecadores, peçamos a graça do amor e do perdão de Deus.
Obrigada pela partilha deste texto profundo, simples e que ilustrou com tanta beleza. Bem haja Frei José Carlos.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva