terça-feira, 19 de abril de 2011

Jesus sentiu-se intimamente perturbado (Jo 13,21)

Estando à mesa com os discípulos Jesus sentiu-se intimamente perturbado. Podíamos pensar que estava perturbado face à perspectiva do futuro, à morte que já se anunciava e queria fazer sentir. Mas tal perturbação, ainda que presente, não é a que mais afecta intimamente o coração de Jesus. No coração sabe que o seu futuro e a sua morte estão na vontade do Pai e na sua vontade de obediência e portanto a perturbação é relativa.
O que perturba intimamente o coração de Jesus é o estado dos seus amigos, a perspectiva do amor traído que cai sobre todos eles, ou quase todos eles, porque o mais novo, o que está ao seu lado, como filho das suas entranhas, não o abandonará e estará presente até ao último momento.
A declaração da eminência da traição é feita de forma solene, de modo a que se perceba que não é por uma consciência puramente humana que conhece o futuro e a traição. “Em verdade vos digo” é a manifestação do conhecimento por uma revelação divina, de um conhecimento que radica no amor e na intimidade com o Pai.
É o Pai que revela a proximidade da hora da entrega da vida bem como a indicação daquele que é o traidor, que já deu passos no sentido da entrega do Mestre e do Filho do Homem, que se passou para o bando dos inimigos.
E nesta traição Jesus experimenta uma vez mais a condição humana, faz a experiência da traição de um daqueles que ele tinha escolhido. Na sua aniquilação nem a esta experiência Jesus se quis esquivar, assumindo dessa forma que a traição é uma realidade da natureza humana.
A traição de Judas revela a essência do pecado, a recusa do amor de Deus, o facto que verdadeiramente perturba o coração de Jesus de que nos fala São João. Contudo, e tendo conhecimento do que se passava e o esperava, da traição de Judas e da sua contribuição para o processo da sua morte, Jesus não faz qualquer crítica, não emite qualquer juízo de condenação, bem pelo contrário como o pai da parábola do filho pródigo silencia e redobra a sua atenção, o seu cuidado.
Cuidado expresso no pedaço de pão com molho oferecido, um gesto de predilecção e deferência na cultura judaica e que mostra o acolhimento ainda possível, a porta aberta para o regresso a casa. E Judas hesita por um momento.
Também a nós e na nossa condição pecadora Jesus continua a estender o pedaço de pão embebido no molho do cordeiro, não para nos condenar ou para nos impelir a sair da sala e a fazer o que temos que fazer, mas para nos evidenciar a sua predilecção e o seu convite no sentido de um regresso, de um retomar da relação.
Saibamos nós receber o pedaço de pão e com ele o dom do amor que o Senhor nos faz.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    Obrigada pela Meditação que partilha connosco, por nos salientar as razões porque Jesus sentiu-se intimamente perturbado (Jo 13,21), da manifestação da intimidade com o Pai, de como Jesus assumiu mais uma vez a condição humana, do perdão e da misericórdia do Senhor para connosco, mesmo na traição, de como está sempre de braços abertos para nos receber no Seu infinito amor para com o Homem. Permita-me que transcreva algumas passagens do texto que me tocam.
    ...” O que perturba intimamente o coração de Jesus é o estado dos seus amigos, a perspectiva do amor traído que cai sobre todos eles, ou quase todos eles, porque o mais novo, o que está ao seu lado, como filho das suas entranhas, não o abandonará e estará presente até ao último momento.”…
    …”É o Pai que revela a proximidade da hora da entrega da vida bem como a indicação daquele que é o traidor, que já deu passos no sentido da entrega do Mestre e do Filho do Homem, que se passou para o bando dos inimigos.
    E nesta traição Jesus experimenta uma vez mais a condição humana, faz a experiência da traição de um daqueles que ele tinha escolhido. Na sua aniquilação nem a esta experiência Jesus se quis esquivar, assumindo dessa forma que a traição é uma realidade da natureza humana.”…
    ...” Também a nós e na nossa condição pecadora Jesus continua a estender o pedaço de pão embebido no molho do cordeiro, não para nos condenar ou para nos impelir a sair da sala e a fazer o que temos que fazer, mas para nos evidenciar a sua predilecção e o seu convite no sentido de um regresso, de um retomar da relação.”…
    Bem haja pelo desafio que nos deixa …”Saibamos nós receber o pedaço de pão e com ele o dom do amor que o Senhor nos faz.”
    Obrigada Frei José Carlos por esta partilha que nos desinstala mas também nos conforta e encoraja a não desistir quando nos sabemos pecadores. Bem haja.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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