domingo, 17 de julho de 2011

Homilia do XVI Domingo do Tempo Comum

O Evangelho deste domingo continua a trazer à nossa meditação e contemplação o ministério público de Jesus e a sua pregação da Boa Nova através das parábolas, que uma vez mais se alicerçam nos elementos tradicionais da cultura rural. As sementes do joio e do trigo, o grão de mostarda e o fermento, não eram realidades estranhas àqueles para quem Jesus falava.
Contudo, e paradoxalmente, aquilo que parece fácil, extremamente compreensível, transforma-se em algo semelhante a um enigma, transforma-se numa realidade que necessita uma explicação para ser acessível e compreensível. E para o paradoxo ser ainda maior, são aqueles que num primeiro momento poderiam compreender o que Jesus dizia que se mostram mais desconhecedores, que se apresentam mais ignorantes, necessitando por isso em privado de perguntar o significado do enunciado.
As parábolas parecem assim querer revelar uma realidade que necessita maturação, que necessita um olhar transparente e arguto, capaz de ver para além do óbvio e do imediato. E no caso da parábola do trigo e do joio, reforçada pelas parábolas do grão de mostarda e do fermento, essa maturidade e esse tempo não podem deixar de nos servir de pista interpretativa.
A parábola do trigo e do joio coloca-nos assim, e antes de mais, face à nossa capacidade de observação e às nossas expectativas. Os servos, do senhor que tinha feito a sementeira, esperavam um campo pleno de trigo, mas encontram o joio entre o trigo semeado. A realidade e a história têm assim essa capacidade de nos surpreender, de não vir ao encontro das nossas expectativas e seguranças garantidas. Há uma margem de imprevisto, até de uma certa irracionalidade no devir dos acontecimentos e da nossa história. Até mesmo na nossa história com Deus.
Contudo, é face a esse imprevisto que Deus nos convida à confiança e à paciência, a uma atenção ao joio que no meio da seara não impede o trigo de crescer, nem de madurar e frutificar. Apesar do inimigo ter semeado o joio, a semente do mal, o trigo e a semente do bem continuam na terra e continuam com a toda a sua capacidade de crescimento e produção. O joio não afecta o trigo no seu desenvolvimento, uma vez que se lhe mantém externo.
A força intrínseca da semente de mostarda e do fermento na massa, de que se compõem as outras duas parábolas de Jesus, ratifica esta mesma ideia, pois é a partir do seu interior e da sua pequenez que tanto a semente como o fermento desenvolvem a sua actividade e a sua força. Não podemos perder assim a fé e a esperança na capacidade interior de crescimento e alteração, uma vez que tais capacidades não advêm da semente em si mesma mas da sua natureza criada e do seu criador. São como os gemidos inefáveis, imperceptíveis aos ouvidos humanos mas perceptíveis Àquele que tudo conhece e vê no íntimo do coração, porque os aí colocou.
Neste sentido e face à preocupação dos servos, a parábola de Jesus convida-nos a uma confiança, a uma tranquilidade no que diz respeito aos resultados da colheita, pois ela será sempre boa, haverá sempre colheita apesar do joio. Como na parábola dos talentos cada um renderá de acordo com as suas capacidades, na medida em que a isso se dispuser e empregar as suas energias intrínsecas.
Outra realidade face à qual a parábola do trigo e do joio nos coloca é a do tempo adequado para a selecção, ou seja para o exercício da justiça. Jesus garante-nos que será feita uma justiça, uma selecção e separação entre o trigo e o joio. Serão os seus anjos a fazê-la no momento em que a seara estiver pronta para a colheita, ou seja suficientemente enraizada, crescida e madura para ser colhida. Nessa altura não haverá qualquer perigo de se arrancar o joio, pois não trará consigo qualquer pé de trigo mais fraco ou ainda por crescer.
Coloca-se assim a questão da justiça e do desejo de justiça que habita o coração do homem; uma justiça que frequentemente se deseja imediata, rápida e eficaz, mas que nesta rapidez se manifesta apenas como uma fraqueza e uma pura ilusão do coração do homem. Jesus convida-nos, no seguimento da Sabedoria, a uma paciência, a uma bondade e a uma indulgência nessa satisfação de justiça, nesse exercício da separação do trigo do joio. Indulgência e bondade tanto mais necessárias, na medida em que em nenhum momento nos é dito como identificar o trigo e o joio, como é possível exercer a justiça com toda a destrinça.
A explicação que Jesus dá em casa aos seus discípulos deixa algumas questões em aberto, como a não identificação dos servos do Senhor, aqueles que afinal querem arrancar o joio antes do trigo estar maduro, exercer essa justiça para a qual ainda não estão preparados. Ao não fazer a identificação dos servos da parábola, Jesus intima os discípulos a assumirem essa identidade, a assumir que não estão ainda preparados, ou nunca estarão preparados para fazer essa separação e exercer essa justiça.
A sua missão, a tarefa para que são convidados, é de semear, é de cuidar da terra para que a semente lançada frutifique, uma vez que a colheita já tem os seus trabalhadores contratados, os anjos do Senhor. Também a nós, a cada um de nós, é feita a mesma intimação, para que participemos do projecto da Sabedoria de desenvolver a justiça através da construção do humano. A recolha dos frutos, sejam eles os que forem, cabe ao Senhor.

3 comentários:

  1. Para mim é uma Homilia que terá suceso!
    É muito bem esclarecida e bem composta

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  2. Frei José Carlos,

    A Homília do XVI Domingo do Tempo Comum que partilha connosco é de uma grande profundidade e ajuda-nos, nomeadamente, na interpretação das três parábolas, enquadradas no ministério público de Jesus e na pregação da Boa Nova: o trigo e o joio, o grão de mostarda e o fermento. São um desafio à nossa forma de pensar e de agir. Permita-me que transcreva algumas das passagens que me tocam particularmente.
    ... “A parábola do trigo e do joio coloca-nos assim, e antes de mais, face à nossa capacidade de observação e às nossas expectativas. (…) Há uma margem de imprevisto, até de uma certa irracionalidade no devir dos acontecimentos e da nossa história. Até mesmo na nossa história com Deus.
    Contudo, é face a esse imprevisto que Deus nos convida à confiança e à paciência, a uma atenção ao joio que no meio da seara não impede o trigo de crescer, nem de madurar e frutificar.”…
    ...” A força intrínseca da semente de mostarda e do fermento na massa, de que se compõem as outras duas parábolas de Jesus, ratifica esta mesma ideia, pois é a partir do seu interior e da sua pequenez que tanto a semente como o fermento desenvolvem a sua actividade e a sua força. Não podemos perder assim a fé e a esperança na capacidade interior de crescimento e alteração, uma vez que tais capacidades não advêm da semente em si mesma mas da sua natureza criada e do seu criador. São como os gemidos inefáveis, imperceptíveis aos ouvidos humanos mas perceptíveis Àquele que tudo conhece e vê no íntimo do coração, porque os aí colocou.”…
    É importante saber esperar com paciência o tempo em que faça a ceifa, a justiça divina, como nos diz Frei José Carlos. ...” Jesus convida-nos, no seguimento da Sabedoria, a uma paciência, a uma bondade e a uma indulgência nessa satisfação de justiça, nesse exercício da separação do trigo do joio.”…
    Bem haja por nos salientar que …”Também a nós, a cada um de nós, é feita a mesma intimação, para que participemos do projecto da Sabedoria de desenvolver a justiça através da construção do humano. A recolha dos frutos, sejam eles os que forem, cabe ao Senhor.”
    Oremos a Deus, Senhor do perdão, da justiça e da paz, para que nos guie nos caminhos que vamos percorrendo.
    Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha desta profunda, bela e importante Homilia, que nos deixa como meditação. Como precisamos ser humildes, estar atentos aos sinais invisíveis de Deus, acreditarmos e aceitarmos que o Espírito Santo nos ajuda no nosso processo de transformação. Bem-haja.
    Votos de uma boa semana.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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  3. Frei José Carlos,

    Muito grata por esta maravilhosa partilha tão profunda,da Homilia deste Domingo,tão importante pelo seu conteúdo,muito esclarecedora.
    Obrigada,Frei José Carlos ,por nos propor tão bela Meditação,da belezada Palavra de Deus,que partilhou connosco.Bem haja.
    Desejo-lhe uma óptima semana.
    Um abraço fraterno.
    AD

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