A leitura do Evangelho de São Mateus deste domingo põe fim à apresentação das parábolas do Reino, que há duas semanas iniciámos com a parábola do semeador, prosseguimos na semana passada com a parábola do trigo e do joio e hoje concluímos com as parábolas do tesouro e da pérola. Duas parábolas pequenas, bastante simples, mas que desenvolvem uma síntese sobre a realidade do Reino de Deus, concluindo o anúncio e a pregação de Jesus junto ao lago.
Podemos dizer que são parábolas que nos falam sobre as formas de apropriação do Reino, sobre a forma como podemos desenvolver em nós a atenção e o cuidado face à semente que é semeada na nossa vida e no nosso coração, para que ela produza o desejado cem por um.
Neste sentido, e conhecendo o homem e o seu coração, Jesus utiliza a realidade que mais nos pode cativar o desejo, que mais nos pode mover a uma atenção e a uma busca, a realidade do tesouro, fonte de tantos contos orientais e de devaneios imaginativos como o da gruta do Ali Baba. Nada poderia suscitar mais o nosso desejo. E cativada a atenção não há necessidade de maiores discursos, de mais profundas considerações, porque o nosso coração e a nossa atenção já estão despertos e focados.
Nas duas parábolas verificamos que o encontro do tesouro e da pérola decorre da própria situação de cada um dos personagens, pois não fazem nada de extraordinário para encontrarem o tesouro. É quase um acaso, um acidente no decorrer do seu quotidiano. Neste sentido o tesouro e a pérola, apresentam-se com uma oferta, como um dom gratuito colocado à disposição de todos os homens nas próprias circunstâncias da sua vida.
O que nos levanta a questão das buscas especiais, dos desejos de acontecimentos extraordinários, de experiências espirituais muito particulares e fora do comum e do quotidiano. Esquecendo que Deus se encontra na nossa vida, nas realidades até pequenas do nosso quotidiano, buscamo-lo longe, fora de casa, não cuidando nem dando atenção às suas manifestações e sinais da presença tão próxima como na alegria do trabalho, na amizade dos colegas, na vida dos nossos familiares e sua exigências.
O encontro do tesouro e da pérola não são no entanto o fim, não representam a conclusão da história, mas bem pelo contrário o seu começo, pois é a partir desse encontro que se desenvolvem um conjunto de actividades no sentido de tudo dispensar para adquirir esse tesouro e essa pérola. O trabalhador do campo vende tudo o que tem para adquirir o campo, bem com o comprador de pérolas para adquirir a pérola preciosa e única.
Mas, e ainda que as duas parábolas digam respeito ao Reino e à sua apropriação, há uma diferença substancial, podemos dizer até processual entre as duas, pois a parábola do tesouro centra-se na gratuidade, o Reino é o tesouro encontrado, enquanto que a parábola da pérola se centra no comprador, o Reino é semelhante a um comprador de pérolas.
Neste sentido, não podemos esquecer que o Reino de Deus, de que Jesus nos fala, se nos apresenta como uma oferta, como um tesouro que de facto podemos encontrar quase por acaso no nosso lavrar de campo, nas nossas rotinas quotidianas; mas é simultaneamente um trabalho pessoal, um exercício de busca, de uma pérola mais perfeita face àquelas que já possuímos ou conhecemos.
Como tantos homens o mercador de pérolas move-se voluntariamente em busca, no desejo de encontrar, insatisfeito com o que tem, porque sabe que existe uma pérola mais perfeita, mais preciosa, face à qual todas as outras são relativas. E quando encontra essa pérola, quando por acidente e no seu buscar quotidiano encontra o seu tesouro, dispõe-se a vender tudo para o possuir, a possuir.
Neste processo ambas a parábolas contrastam fortemente com as parábolas do semeador e do trigo e do joio, nas quais prevalece uma dimensão enorme de tempo e paciência. Aqui não há tempo a perder, é necessário arriscar tudo de imediato, pois outro pode apanhar o tesouro e arrebatá-lo das nossas mãos. Contraste inevitável na medida em que a acção nas duas primeiras parábolas se coloca do lado de Deus e nas parábolas do tesouro e da pérola se coloca do lado do homem. E este não tem muito tempo.
Assim, não nos resta outra alternativa senão pedir ao Senhor, e à semelhança de Salomão, que nos dê a ciência e o conhecimento para saber discernir os tesouros que se encontram no nosso caminho, as presenças do Reino que se manifestam no nosso banal quotidiano, e a perseverança de continuar procurando nesse mesmo quotidiano e sem desfalecer a pérola única e perfeita, face à qual tudo o mais é relativo.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarO texto da Homilia do XVII Domingo do Tempo Comum que partilha connosco é profundo, salientando-nos que contrariamente às duas primeiras parábolas do Reino de Deus cuja acção ...” se coloca do lado de Deus”, nas parábolas do tesouro e da pérola “se coloca do lado do homem”. E remete-nos para a nossa realidade e para a forma como a vivemos.
Como nos afirma, ainda que as duas parábolas ...” digam respeito ao Reino e à sua apropriação, há uma diferença substancial, podemos dizer até processual entre as duas, pois a parábola do tesouro centra-se na gratuidade, o Reino é o tesouro encontrado, enquanto que a parábola da pérola se centra no comprador, o Reino é semelhante a um comprador de pérolas.
Neste sentido, não podemos esquecer que o Reino de Deus, de que Jesus nos fala, se nos apresenta como uma oferta, como um tesouro que de facto podemos encontrar quase por acaso no nosso lavrar de campo, nas nossas rotinas quotidianas; mas é simultaneamente um trabalho pessoal, um exercício de busca, de uma pérola mais perfeita face àquelas que já possuímos ou conhecemos.”…
Cientes da gratuidade do Reino de Deus, saibamos viver a vida com esperança e determinação para que o Reino seja realidade.
Façamos nossas as palavras do Frei José Carlos …“pedindo ao Senhor e , à semelhança de Salomão, que nos dê a ciência e o conhecimento para saber discernir os tesouros que se encontram no nosso caminho, as presenças do Reino que se manifestam no nosso banal quotidiano, e a perseverança de continuar procurando nesse mesmo quotidiano e sem desfalecer a pérola única e perfeita, face à qual tudo o mais é relativo.”
Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha desta Homilia que é importante, de grande actualidade, bela e que nos encoraja a não desistir. Bem-haja.
Votos de uma boa semana.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva