sábado, 18 de fevereiro de 2012

Beato Angélico em luz e cor

Terminou há um mês uma exposição no Museu Jacquemart-André em Paris sobre frei Angélico, cujo tema era “Frei Angélico e os mestres da luz”.
Este tema e a sua escolha prendem-se inevitavelmente com a questão da luz e da cor que podemos apreciar nas obras do Beato Angélico, uma luz e uma cor usados de uma forma muito pessoal.
Contemplando o quadro da Anunciação que se encontra no Museu do Prado, Eugénio D’Ors escreveu que nesta tela se começa a entender que em pintura a cor seja uma coisa bastante distinta da luz, quase contraditória.
Frei Angélico não é um pintor colorista, ainda que as suas cores sejam bastante vivas, mas é um pintor luminoso, sedento da alma que se revela na pintura; não é um pintor que nos pretende embriagar no vórtice das cores, mas um pintor que nos pretende dar a paz, deixar-nos tranquilos.
Neste sentido, a luz que frei Angélico coloca na sua pintura transforma o que pinta, e por isso a sua carreira artística é uma evolução no tratamento da luz e da cor. Na sua época juvenil a luz agarra-se ao corpo como uma substância física, uma pele de uma outra natureza, enquanto que as cores se plasmam na sua excessiva pureza. Na época da maturidade a luz e a cor integram-se de tal maneira que uma e outra são penetradas mutuamente e transformam-se em algo único.
A radiação luminosa que se multiplica pelo céu, em Cristo, na Virgem Maria, nos Santos e nos Profetas, nos Anjos e nos Apóstolos parece já não ser deste mundo, mas de uma outra dimensão que se deixou transfigurar por uma luz divina. Não surpreende por isso que Giorgio Vasari, que pôde observar o trabalho de frei Angélico tenha comentado “que os santos que pinta frei Angélico têm mais graça e semelhança de santos que os de outro pintor qualquer”.
Também neste sentido se expressa Sergei Averintsev, professor de literatura clássica na Rússia e membro da Academia Pontifícia das Ciências Sociais, desde 1994 quando o Papa João Paulo II o convidou até 2003 quando faleceu, quando diz que a obra de frei Angélico é aquela que no ocidente mais se aproxima da concepção ortodoxa do ícone no sentido da relação de santidade do pintor e a sacralidade da pintura.
Na pintura do Beato Angélico espelha-se a santidade do homem que pintou. Saibamos nós também comunicar alguma coisa de divino àquilo que fazemos

Ilustração: “A Coroação da Virgem”, de Fra Angélico, Galeria dos Uffizi, Florença.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    Bem-haja, Frei José Carlos, por partilhar de novo, o texto da Meditação sobre o Beato Angélico, no dia em que a igreja e particularmente a Ordem dos Pregadores celebra a sua memória. É muito interessante a forma como aborda a questão da luz e da cor na obras deste Santo Dominicano.
    Contemplo a pintura “A Coroação da Virgem” que escolheu para ilustrar o texto e nela encontramos beleza, e a combinação harmónica da cor e da luz difusa que nos transmitem serenidade. Há uma relação profunda que se estabelece entre o que se analisa e o sujeito que observa numa relação espiritual que nos eleva. Como nos salienta, ...” Frei Angélico não é um pintor colorista, ainda que as suas cores sejam bastante vivas, mas é um pintor luminoso, sedento da alma que se revela na pintura; não é um pintor que nos pretende embriagar no vórtice das cores, mas um pintor que nos pretende dar a paz, deixar-nos tranquilos.”…
    Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha e por nos exortar a que …” Saibamos nós também comunicar alguma coisa de divino àquilo que fazemos”. Que o Senhor ilumine e abençoe o Frei José Carlos.
    Votos de um bom domingo.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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