quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Vês alguma coisa? (Mc 8,23)

Ao chegar a Betsaida trouxeram a Jesus um cego para que lhe tocasse. Jesus tomou o cego pela mão, conduziu-o para fora da aldeia, deitou-lhe saliva nos olhos, impôs-lhe as mãos por duas vezes e após um primeiro momento de uma visão turva o cego começou a ver perfeitamente. Entre a primeira e segunda imposição das mãos, a pergunta se via alguma coisa, e a resposta surpreendente de ver os homens como se fossem árvores a andar.
Esta cura do cego de Betsaida confronta-nos com uma realidade que muitas vezes nos custa a viver, que nos custa a aceitar, e que é a realidade do tempo, do processo no tempo. Frequentemente deixamo-nos levar por essa tentação de querer um processo de conversão imediato, rápido, em que o tempo é dispensável.
A cura do cego de Betsaida mostra-nos que Jesus está disposto a perder tempo connosco, que nos quer conduzir pela mão, que nos quer levar para fora dos nossos ambientes, que nos interroga e age sobre nós até que vejamos claramente a luz que brilha. A visão da luz é um processo que exige tempo, por vezes muito tempo.
A cura do cego de Betsaida, como outros milagres e curas operadas por Jesus, mostra-nos que ele age progressivamente, que usa de delicadeza e paciência para connosco, que nos procura no sentido de um encontro pessoal, que há uma habituação à luz da sua presença e pessoa.
E contudo, nós queremos tudo imediatamente, deixamo-nos levar pela necessidade de resultados imediatos que marca a nossa cultura e forma de estar no mundo actual.
A pergunta de Jesus, “vês alguma coisa”, é neste sentido uma pergunta que se repete e à qual em cada dia devemos ir dando uma resposta diferente, uma resposta que passa da realidade turva, de ver os homens caminhando como árvores, até à luz perfeita de ver os homens como iguais e filhos de Deus.
Faz Senhor que eu veja, que eu me vá habituando a ver a tua luz para poder um dia contemplá-la em todo o seu esplendor.

Ilustração: “Cristo curando o cego”, de El Greco, Metropolitan Museum of Art.

2 comentários:

  1. Frei José Carlos,

    Muito grata por esta bela e profunda Meditação,que gostei e me ajudou a reflectir com mais profundidade,num momento de muitos problemas e que é difícil dar resposta.Como diz o Frei José Carlos,faz Senhor que veja,que eu me vá habituando a ver a tua luz,para poder um dia contemplá-la em todo o seu esplendor.Obigada,Frei José Carlos,pela maravilhosa partilha,que nos dá força a prosseguir o caminho.Um bom dia e que o Senhor o ilumine e o proteja,Frei josé Carlos.
    Um abraço fraterno.
    AD

    ResponderEliminar
  2. Frei José Carlos,

    Volto a ler o texto da Meditação que teceu e reflicto nas palavras partilhadas numa dimensão introspectiva, em forma de balanço. Ciente que a conversão é um processo individual, que implica que saiamos de nós próprios, sentimos que a dimensão temporal tem um papel decisivo, sem que, por vezes, se compreenda como as transformações se operam, na certeza que o caminho a percorrer é longo, paciente, incompatível com a “forma de estar no mundo actual”.
    Como nos salienta ...” Esta cura do cego de Betsaida confronta-nos com uma realidade que muitas vezes nos custa a viver, que nos custa a aceitar, e que é a realidade do tempo, do processo no tempo. (…)
    (…) A visão da luz é um processo que exige tempo, por vezes muito tempo.
    A cura do cego de Betsaida, como outros milagres e curas operadas por Jesus, mostra-nos que ele age progressivamente, que usa de delicadeza e paciência para connosco, que nos procura no sentido de um encontro pessoal, que há uma habituação à luz da sua presença e pessoa”.
    Oremos com Frei josé Carlos …”Faz Senhor que eu veja, que eu me vá habituando a ver a tua luz para poder um dia contemplá-la em todo o seu esplendor.”
    Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha da Meditação, profunda, que nos ajuda a compreender a pergunta de Jesus ao cego de Betsaida, a qual se dirige também a cada um de nós, e como nos recorda …”é neste sentido uma pergunta que se repete e à qual em cada dia devemos ir dando uma resposta diferente, uma resposta que passa da realidade turva, de ver os homens caminhando como árvores, até à luz perfeita de ver os homens como iguais e filhos de Deus.”
    Que o Senhor abençoe e proteja o Frei José Carlos.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

    P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe o texto de uma oração.

    OS DIAS
    TORNAM-SE
    CLAROS


    Os dias tornam-se claros, Senhor. À medida que as horas de luz aumentam, parece que
    cresce também a extensão interior do tempo. Gosto do pleno azul dos céus, pois ele nos
    restitui o sabor indiviso da Tua plenitude. Gosto da nitidez que a matéria ganha, porque sei
    que nela se manifesta a evidência do Espírito. Gosto de pensar que hoje subirei pelas ruas
    iluminadas de sol, pois isso espelha a Tua promessa de que venceremos a vida penumbrosa e sombria.

    (In, Um Deus Que Dança, Itinerários para a Oração, José Tolentino Mendonça, 2011)

    ResponderEliminar