segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Nenhum sinal lhes será dado (Mc 8,12)

O Evangelho de São Marcos conta-nos que depois de vários milagres de Jesus, e de modo particular do milagre da multiplicação dos pães para quatro mil pessoas, os fariseus lhe pediram um sinal do céu, algo de extraordinário que os libertasse das suas dúvidas, ou nem tanto, possivelmente algo que confirmasse a sua suspeita de modo a poderem organizar ainda mais rapidamente o seu desaparecimento.
O pedido de um sinal por parte dos fariseus, face aos milagres já operados por Jesus, é de facto um pedido estranho, um pedido que nos leva a suspeitar que apenas se tratava de mais uma armadilha, um estratagema para apanhar Jesus, porque da parte deles não havia qualquer interesse verdadeiro em Jesus, ou numa adesão a esse Jesus que se lhes revelava como sendo do céu através dos milagres já operados.
É certamente por esta razão que Jesus diz que nenhum sinal lhes será dado, que nada de mais extraordinário realizará para provocar uma outra atitude naqueles homens, porque de facto o que já tinha realizado e dito era suficiente para uma alteração, para um interesse verdadeiro, para uma adesão.
A resposta de Jesus e esta negação a um sinal, tem por outro lado uma razão muito mais intrínseca à própria condição e natureza do sinal face à realidade em si mesma. Um sinal pode desviar a atenção e a centralidade daquilo que deve ser o centro, o fundamental, o que dá razão ao próprio sinal. Ao aceder ao pedido de um sinal, Jesus colocaria o importante e significativo fora de si próprio, fora da sua esfera e na esfera de um acontecimento ou realidade que nada tinha de próprio.
É diante desta resposta de Jesus e da sua razão que também nós nos devemos interrogar sobre a nossa demanda de sinais e a sua aceitação, a orientação das nossas estratégias e planos por esses mesmo sinais. Num plano meramente leigo, civil, podemos interrogar-nos se quando dizemos que a economia está a dar sinais de retoma, de facto está, ou são apenas dimensões particulares que concebemos como leitura do todo, e que não é correcta nem corresponde à verdade.
Mas na nossa vida de fé e seguimento de Jesus esta leitura e demanda de sinais alcança uma importância ainda muito mais significativa, porque o que Jesus pede na fé e aos seus discípulos é uma adesão à sua pessoa, o estabelecimento de uma relação, e não uma adesão por um sinal que é apenas um manifestação externa, o resultado de uma acção.
Há assim uma forte tentação, e até certo ponto uma grande imaturidade na fé e na adesão a Jesus quando lhe pedimos um sinal, uma manifestação do seu amor, do seu interesse e carinho por nós, da sua presença vigilante e protectora na nossa vida. Necessitamos despojar-nos dessa tentação, dessa leitura e apreensão sinalética, para nos encontrarmos verdadeiramente com aquele que ele é, o verdadeiro Deus e o verdadeiro homem. Só na medida do nosso despojamento, da libertação das nossas propensões e pretensões concentracionárias e idolátricas, e a abertura ao dom de Deus, no que tem de indizível e incomensurável, nos encontraremos verdadeiramente com ele.
Que o Senhor purifique o nosso coração desse desejo de imagens e sinais e aumente em nós a vontade de perseverantemente o buscarmos no silêncio da sua presença amorosa.

Ilustração: “Retrato de Cristo”, de Elisabetta Sirani, Museu de Arte de Ponce, Puerto Rico.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    Reflicto no texto da Meditação que teceu e partilha connosco. Na verdade, na nossa condição, muitos de nós, em algum (uns) momento(s) da nossa vida, como cristãos pedimos um sinal, em perfeita contradição com o que pedimos no Pai-Nosso que se faça a “sua vontade”, porque não compreendemos ou não aceitamos a lógica, os caminhos de Deus.
    Como nos recorda no texto ...” na nossa vida de fé e seguimento de Jesus esta leitura e demanda de sinais alcança uma importância ainda muito mais significativa, porque o que Jesus pede na fé e aos seus discípulos é uma adesão à sua pessoa, o estabelecimento de uma relação, e não uma adesão por um sinal que é apenas um manifestação externa, o resultado de uma acção.”…
    Bem-haja por nos salientar sem rodeios que …” Há assim uma forte tentação, e até certo ponto uma grande imaturidade na fé e na adesão a Jesus quando lhe pedimos um sinal, uma manifestação do seu amor, do seu interesse e carinho por nós, da sua presença vigilante e protectora na nossa vida.”…
    Façamos nossas as palavras de Frei José Carlos e peçamos ao …” Senhor que purifique o nosso coração desse desejo de imagens e sinais e aumente em nós a vontade de perseverantemente o buscarmos no silêncio da sua presença amorosa”.
    Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha da Meditação, profunda, ilustrada com uma bela imgem de Cristo, que nos leva a reflectir sobre a qualidade da nossa relação com Jesus. Que o Senhor abençoe e proteja o Frei José Carlos.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

    P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe o texto de uma oração.

    QUERIA
    DIZER MAIS

    Senhor, hoje queria dizer mais. Queria que a minha oração não fosse este rumor de sempre, as mesmas palavras
    disparadas à pressa, entre uma coisa e outra; ou o balbucio esquivo, cheio de tudo o que eu não disse, porque
    não encontrei o tempo, o modo ou a verdade. Hoje queria dizer mais. Não trago intenções, nem pedidos. Tenho pensado
    no que seria pedir-te não apenas que olhes por mim (isso fazes continuamente, mesmo se me esqueço de pedir), mas
    que olhes para mim. Dia após dia, sinto que, mais do que tudo, preciso do Teu olhar. Talvez me faltem palavras... Queria apenas colocar devagar as minhas mãos dentro das Tuas. E isso ser, Senhor, a minha oração e a minha vida.

    (In, Um Deus Que Dança, Itinerários para a Oração, José Tolentino Mendonça, 2011)

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