Na geografia do nosso coração e da nossa vida espiritual há momentos em que sem porquê nos damos conta do deserto, do deserto em que nos perdemos, em cujo horizonte as dunas de areia movediça se alteram vedando-nos até a miragem do oásis.
E a sede aperta, o corpo ressente-se do calor abrasador que nos amolece ou do frio nocturno que nos tolhe. Buscamos a fonte, procuramos no horizonte o oásis que imaginamos nos satisfará e saciará.
No entanto é ali, naquele deserto, naquelas mesmas dunas que se movem e nos barram, que é possível saciar-se e matar a sede e matar a fome. O Senhor saciará a tua alma nos lugares desertos.
O deserto, esse espaço de tentação e de confronto, onde as lutas são inevitáveis, onde o demónio vem ao nosso encontro propondo-nos a glória em troca da escravidão, onde também Deus vem ao nosso encontro para o combate da sua marca.
E quantas vezes nos vergamos à vitória da glória escravizante, quantas vezes nos deixamos vencer por essa satisfação momentânea que nos é oferecida pelo demónio. É mais fácil, uma vez que parece que fica tudo resolvido.
Pelo contrário, o combate com Deus não termina, permanece em aberto como uma ferida, como essa marca que nos faz coxear como Jacob. A satisfação da alma no deserto provoca mais sede e mais fome, necessidade de mais luta, de uma luta para permanecer no deserto e com sede e com fome de modo a ser saciado. É tão duro.
E por isso matamos a fome e a sede no oásis que imaginamos, deixamo-nos levar pela servidão que nos anestesia e deixa num estado de letargia.
Senhor, tu que nos conduzes ao deserto, sê a nossa força de combate, o desejo de permanecer com fome e com sede, de permanecer por ti e contigo.
Ilustração: “Estudo para oração pela morte no deserto”, de Elihu Vedder, Colecção American Art, no Museu de Brooklyn.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarNa vida de cada um de nós, sem excepção, na unicidade e diversidade que a caracteriza, como nos diz no texto ...” há momentos em que sem porquê nos damos conta do deserto, do deserto em que nos perdemos, em cujo horizonte as dunas de areia movediça se alteram vedando-nos até a miragem do oásis.”…
Como nos salienta é no deserto, ...”é ali, naquele deserto, naquelas mesmas dunas que se movem e nos barram, que é possível saciar-se e matar a sede e matar a fome. “….
Como nos recorda, é na busca da fonte, do jardim que o “Senhor saciará a nossa alma nos lugares desertos”, “espaço de tentação e de confronto” … “onde também Deus vem ao nosso encontro para o combate da sua marca”… (…) “combate com Deus que não termina, permanece em aberto como uma ferida, como essa marca que nos faz coxear como Jacob. A satisfação da alma no deserto provoca mais sede e mais fome, necessidade de mais luta, de uma luta para permanecer no deserto e com sede e com fome de modo a ser saciado. É tão duro.”…
Façamos nossas as palavras de Frei José Carlos e peçamos ao Senhor …” tu que nos conduzes ao deserto, sê a nossa força de combate, o desejo de permanecer com fome e com sede, de permanecer por ti e contigo.”
Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha da Meditação, profunda, que nos desinstala e que nos exorta a não desistir do combate. Que o Senhor o abençõe e proteja.
Votos de um bom domingo.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva
P.S. No texto que escrevi no post anterior no primeiro parágrafo e na frase que se inicia por “Considero ….. e termina em geográficas”, a mesma deve ler-se “Considero ….. geográficas, foi excelente.” Pelo lapso, apresento ao Frei José Carlos e a todos os seguidores do blogue, as minhas desculpas.MJS
Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe o texto de uma oração.
O TEU AMOR
QUE NOS ACEITA
POR INTEIRO
Rezo nesta manhã o Teu amor, ó Deus. O Teu amor que nos aceita por inteiro, que abraça
o que somos e o que não somos; o que nós fomos e o que nos tornámos. O Teu amor que
ama as nossas possibilidades infinitas e indefinidas; os nossos desabrochares esperançosos
e as nossas quedas frustantes; as nossas liberdades insensatas e a nossa timidez hesitante.
O Teu amor ensina-nos a confiança e continuamente relança a nossa história.
(In, Um Deus Que Dança, Itinerários para a Oração, José Tolentino Mendonça, 2011)