domingo, 1 de maio de 2011

São Tomé do pintor José de Ribera

Está de perfil, abstraído e distante de cada um que olha para ele. A sua atitude e a sua atenção é a de espera, a da espera de uma resposta, de uma palavra que não é a nossa. Tal como uma sentinela que aguarda a aurora assim ele aguarda, de mão estendida, suplicante, expectante, vigilante.
A lança em que se apoia e agarra e que o identifica no conjunto do Apostolado parece ser a sua fonte de força. Uma vez mais parece uma sentinela esperando a senha para dar o passo. En guarde!
O rosto jovem deixa intuir uma perspicácia, uma inquietação quanto à resposta esperada, mas também uma paz tremenda, uma tranquilidade de quem sabe onde colocou a sua esperança. A luz do dia que obliquamente vai entrando no espaço ilumina-lhe o rosto nessa confiança.
O manto branco drapejado, num movimento de fuga, parece querer retirá-lo dessa espera e confiança. É como uma pele que o protege, mas ao mesmo tempo o oculta, como se para além do manto não houvesse nada mais que uma mão estendida, mendicante.
Se não vir o lugar dos cravos e a ferida da lança são as ideias que lhe bailam na consciência, esse manto que o envolve e parece querer subtrair de cena.
Mas a lança agarra-o, funda-o e fixa-o na cena, a lança é a resposta, o suporte, a entrada para um mistério tão grande como o Senhor e o Deus, dele, e nosso. Não é necessário tocar em nada, comprovar, porque a lança só por si é a prova, a chave para abrir a porta da graça.
É Tomé, o Apóstolo da dúvida e da confissão de fé, que o pintor espanhol José de Ribera pintou por volta de 1612 em Roma. Faz parte da Colecção Roberto Longhi, que conjuntamente com outros quadros compõem a exposição que o Museu do Prado em Madrid organizou e tem patente até 31 de Julho para mostrar a obra da juventude deste grande pintor.
Uma reunião em Madrid no dia de ontem deu-me a possibilidade de visitar esta exposição com perto de trinta quadros, na qual para além de vários retratos de Apóstolos e Santos encontramos também, entre outros, uma “Ressurreição de Lázaro”, uma “Lamentação sobre o corpo de Cristo morto” e um “São Sebastião com as santas mulheres”, quadros onde o corpo se desenvolve na sua expressão cromática da quase morte ao cadáver quase putrefacto. São os primeiros ensaios de evoluções posteriores da obra de Ribera.
Aos que tiverem a oportunidade de passar por Madrid convido-os a não deixarem de ver esta bela exposição.

2 comentários:

  1. Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha deste interessante, belo e poético texto que escreveu sobre o retrato de São Tomé do pintor José de Ribera. Bem haja.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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  2. Rejubilo por si, Frei José Carlos,pela oportunidade de se deleitar com a arte de José Ribera e pela generosidade de a partilhar connosco.
    GVA

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