Tal como nos relata o Evangelho de São João também nós passados oito dias sobre a Páscoa nos voltamos a reunir para celebrar o dia e a Páscoa da Ressurreição do Senhor.
E ao fazê-lo somos convidados a contemplar o mistério da Misericórdia de Deus, mistério e realidade tantas vezes esquecida e que hoje olhamos de modo mais atento graças ao Papa João Paulo II que instituiu este segundo domingo do tempo pascal como domingo da Misericórdia. Hoje que celebramos também a sua beatificação.
A misericórdia aparece-nos na leitura do Evangelho de São João, neste acontecimento da aparição a Tomé, sob duas formas distintas mas complementares. Assim, deparamos com a misericórdia de Deus, e de modo particular da pessoa de Jesus, na relação e no diálogo que mantém com Tomé por causa da sua dúvida sobre a aparição do Senhor.
Tomé, que tinha abandonado Jesus no momento de maior sofrimento, à semelhança dos outros companheiros, que tinha um espírito possivelmente mais crítico ou até céptico, exige por isso provas da ressurreição de Jesus, provas que confirmassem a ressurreição, mas também a não alienação dos companheiros, porque podiam perfeitamente estar a imaginar uma realidade para compensar o sentimento de culpa pelo abandono.
É neste contexto que, à semelhança da primeira aparição ao grupo reunido e fechado em casa, Jesus se faz presente e conhecedor de toda a discussão, como se nunca tivesse deixado de estar presente. Contudo, e apesar do conhecimento e das dúvidas de Tomé Jesus não tem para com ele qualquer reparo, qualquer queixa ou condenação em relação à duvida, bem pelo contrário apresenta-lhe as mãos e o lado para que possa tocar e comprovar.
Jesus tem assim um gesto de misericórdia para com Tomé; à semelhança de toda a sua vida e do mistério da incarnação, vem ao encontro das necessidades do homem, neste caso do homem Tomé, vem ao encontro das suas dúvidas, buscas e questionamentos, como que partilhando a mesma dúvida e a mesma busca.
Neste sentido a história de Tomé é para nós um alento, ou deveria ser um alento nas nossas buscas e questionamentos, nas nossas dúvidas, porque também a nós Jesus se nos apresenta partilhando a nossa inquietação. Ele conhece-nos e sabe das nossas fraquezas e tentações e vem ao nosso encontro como veio ao encontro da humanidade.
E como para Tomé também a nós nos apresenta as mesmas provas, as mesmas chagas das mãos e do lado, o resultado final e histórico de toda a sua vida e de todo o amor que teve pelos homens. Não há outro caminho, outro processo para avançarmos no esclarecimento das nossas dúvidas senão essa humanidade e essa oferta de amor. E só avançaremos na medida em que nos dispusermos a isso, em que aceitarmos ler e interpretar essa história de amor e sofrimento.
O outro elemento ilustrativo da misericórdia de Deus que encontramos na leitura do Evangelho de São João é o poder que Jesus concede aos discípulos de perdoar os pecados. Poderíamos imaginar muitas coisas, muitos outros poderes como o de curar ou o de fazer milagres, mas é esse poder de perdoar que o Senhor partilha e outorga aos seus discípulos. Não é suficientemente grande, poderoso, para o olharmos com um pouco mais de atenção, de reverência?
E não necessitamos olhar para o sacramento da reconciliação, do perdão sacramental, basta-nos ter em atenção o que nos diz e rezamos na oração do Pai-Nosso, no qual pedimos a Deus que nos perdoe os nossos pecados como nós perdoamos aos demais. De facto, se não formos capazes de perdoar, os pecados permanecerão no outro e em nós também enquanto dívida não liquidada, enquanto mácula não purificada.
Há assim a necessidade do perdão, de perdoar os outros, de nos perdoarmos a nós próprios, de nada reter do mal feito, para podermos estar preparados e receptivos ao perdão de Deus, à misericórdia que Deus quer ter connosco na medida em que estejamos dispostos a tal.
O encontro e desencontro de Tomé com Jesus mostra-nos assim como Deus está presente e vem ao encontro das necessidades dos homens, mesmo nessas questões tão avassaladoras e por vezes marginalizadoras como são as que questionam o próprio Deus. Uma vez mais, e também aí, não podemos prescindir da humildade e do reconhecimento de que Deus ama mesmo quando o colocamos em causa e por esse meio nos abre uma brecha de aproximação para que o reconheçamos como nosso Senhor e nosso Deus. Saibamos nós perceber e aceitar as provas que nos apresenta e como são testemunho da sua misericórdia.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarRecordo a passagem do Evangelho segundo São João (20, 19-31) e medito na profunda Homília do II Domingo do Tempo Pascal que partilha connosco. Eis um novo encontro de Jesus ressuscitado com os discípulos, no qual a figura de Tomé tem uma força determinante, pelo comportamento, pela simbologia do encontro (do “nosso encontro” versus “desencontro”), pelas dificuldades com que nos deparamos na nossa fidelidade a Deus, nas nossas hesitações, nas nossas dúvidas. Permita-me que cite algumas passagens do texto da Homilia que me tocam particularmente.
...” Contudo, e apesar do conhecimento e das dúvidas de Tomé, Jesus não tem para com ele qualquer reparo, qualquer queixa ou condenação em relação à dúvida, bem pelo contrário apresenta-lhe as mãos e o lado para que possa tocar e comprovar.
Jesus tem assim um gesto de misericórdia para com Tomé; (…)
E como para Tomé também a nós nos apresenta as mesmas provas, as mesmas chagas das mãos e do lado, o resultado final e histórico de toda a sua vida e de todo o amor que teve pelos homens. Não há outro caminho, outro processo para avançarmos no esclarecimento das nossas dúvidas senão essa humanidade e essa oferta de amor. E só avançaremos na medida em que nos dispusermos a isso, em que aceitarmos ler e interpretar essa história de amor e sofrimento.
O outro elemento ilustrativo da misericórdia de Deus que encontramos na leitura do Evangelho de São João é o poder que Jesus concede aos discípulos de perdoar os pecados.”…
...” Há assim a necessidade do perdão, de perdoar os outros, de nos perdoarmos a nós próprios, de nada reter do mal feito, para podermos estar preparados e receptivos ao perdão de Deus, à misericórdia que Deus quer ter connosco na medida em que estejamos dispostos a tal.”
Aceitemos, Frei José Carlos, com humildade a exortação que nos deixa . …”Saibamos nós perceber e aceitar as provas que nosso Senhor e nosso Deus nos apresenta e como são testemunho da sua misericórdia.”
Obrigada pela partilha desta Homilia que nos ajuda a prosseguir no Caminho para Deus, que nos encoraja a ultrapassar as nossas dúvidas, as nossas debilidades. Bem haja.
Votos de uma boa semana.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva
Boa noite Frei José Carlos
ResponderEliminarMuito grata pelas suas palavras que são de uma grande ajuda para o discernimento e meditação na Palavra do Filho de Deus incarnado. Há oito dias, estando as portas fechadas o Senhor apresentou-se no meio dos onze díscipulos, e neste domingo o Senhor, estando eles reunidos, volta a apresentar-se no meio deles. Louvado seja o Senhor que na sua misericórdia se nos apresenta. Bendito e louvado seja o Seu Santo Nome. Ó Santa Misericórdia. Bendita Luz, afável, venerável, de amor e doçura.
Fraternalmente
L