É face ao escândalo dos
fariseus, provocado pela sua presença num almoço de publicanos e pecadores, que
Jesus profere estas palavras: “ eu não vim chamar os justos mas os pecadores”.
Palavras acutilantes
para aqueles que se consideravam justos, que pelo simples cumprimento de todas
as leis e preceitos se consideravam salvos, como eram os fariseus.
Mas de facto, quem
poderia o Senhor vir chamar senão os pecadores? Não estaremos todos no mesmo
barco, na mesma situação de infidelidade ao plano de Deus? Ou pelo contrário, nos
consideramos tão puros e tão santos que já não necessitamos de conversão, de
mudar alguma coisa na nossa vida, de fazer alguma coisa melhor?
As ilusões da
perfeição, do mal menor, do meu feitio, do já não sei como, colocam-nos num estado
em que o sentimento ou a consciência de pecado fica diluída e com ela a
possibilidade de conversão, de alteração de alguma coisa na nossa vida.
É a verdade e o
confronto com a verdade, e com a verdade das nossas limitações e fragilidades,
dos nossos egoísmos e prazeres compensatórios, com a verdade da nossa situação
de pecadores que nos pode conduzir à conversão. É aí que se encontra o terreno
fértil para que algo brote de novo.
Mateus, sentado à
banca dos impostos, não espera nem exige um perdão dos seus pecados para seguir
Jesus. É na sua condição pecadora que assume o convite de Jesus ao seguimento,
e por isso pouco depois o encontramos em sua casa rodeado daqueles que sempre
partilharam da sua vida e eram considerados pecadores como ele. E com eles está
Jesus.
Assim, se Mateus
seguiu Jesus foi porque no apelo encontrou um sinal do apreço, do amor que
Jesus sentia por ele, uma manifestação de que a sua situação e condição de
pecador podia ser alterada. Havia uma outra oportunidade para ele. O seguimento,
e o acolhimento podiam alterar a sua vida.
E quem melhor que alguém
que sentiu a misericórdia de Deus, o seu perdão e o seu amor, para cantar e
contar essa misericórdia e esse perdão? É a experiência do amor redentor de
Deus, do perdão amoroso que nos leva a anunciá-lo até ao fim do mundo e dos
tempos.
Como o título do livro
“Necessitam-se Pecadores”, do dominicano francês Bernard Bro, também nós
dizemos que se necessitam pecadores, pecadores que aceitem o convite de Jesus
ao seguimento, à experiência do perdão, porque com essa experiência uma nova
vida e um novo mundo se iniciam.
Ilustração: “O
Chamamento de São Mateus”, de Hendrick ter Brugghen, Museu de Belas Artes de
Budapeste.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarNo dia em que a Igreja celebra a festa litúrgica do Apóstolo São Mateus, o texto da Meditação que teceu e partilha é profundo e ilustrado maravilhosamente. Leio, releio e ao som do Magnificat fico a reflectir nas palavras corajosas que escreveu e que nos desafiam como pecadores que somos num processo permanente de conversão. Todos somos chamados a seguir Deus, em qualquer circunstância e todos os caminhos conduzem até ao Pai.
Permita-me que respigue algumas das passagens do texto que escreveu e que me tocam. ...” É a verdade e o confronto com a verdade, e com a verdade das nossas limitações e fragilidades, dos nossos egoísmos e prazeres compensatórios, com a verdade da nossa situação de pecadores que nos pode conduzir à conversão. É aí que se encontra o terreno fértil para que algo brote de novo. (…)
(...) se Mateus seguiu Jesus foi porque no apelo encontrou um sinal do apreço, do amor que Jesus sentia por ele, uma manifestação de que a sua situação e condição de pecador podia ser alterada. (…)
(...) E quem melhor que alguém que sentiu a misericórdia de Deus, o seu perdão e o seu amor, para cantar e contar essa misericórdia e esse perdão? É a experiência do amor redentor de Deus, do perdão amoroso que nos leva a anunciá-lo até ao fim do mundo e dos tempos.”…
Saibamos ter a humildade de pedir o amor misericordioso de Deus para todos nós e que nos liberte o coração de preconceitos para olharmos, amarmos os excluídos, ditos pecadores, como irmãos que um dia aceitarão o “convite de Jesus ao seguimento, à experiência do perdão”. Somos todos, a começar por cada um de nós, que somos chamados a participar na construção de “uma nova vida e um novo mundo”.
Grata, Frei José Carlos, pelas palavras partilhadas, corajosas que ajudam-nos no diálogo franco com Jesus, no acolhimento do nosso próximo como Deus nos ama e perdoa.
Desejo ao Frei José Carlos um bom fim de semana com paz, com alegria e esperança.
Bom descanso.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva
P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe de novo o texto de uma oração, intemporal, como oportunamente referi, faz parte dos nossos diálogos com Deus, porque as balbuciamos com fé, humildade e confiança.
O TEU AMOR
QUE NOS ACEITA
POR INTEIRO
Rezo nesta manhã o Teu amor, ó Deus. O Teu amor que nos aceita por inteiro, que abraça o que somos e o que não somos; o que nós fomos e o que nos tornámos. O Teu amor que ama as nossas possibilidades infinitas e indefinidas; os nossos desabrochares esperançosos e as nossas quedas frustantes; as nossas liberdades insensatas e a nossa timidez hesitante.
O Teu amor ensina-nos a confiança e continuamente relança a nossa história.
(In, Um Deus Que Dança, Itinerários para a Oração, José Tolentino Mendonça, 2011)