Chora perdidamente
aquele que a libertou da escravidão do pecado, e na sua dor, com as suas
lágrimas, é incapaz de ver o extraordinário que contempla.
As lágrimas não a
deixam ver o que se apresenta diante dos olhos, nem os anjos nem o próprio
Mestre. As lágrimas turbam-lhe a visão.
Também a nós nos
acontece o mesmo algumas vezes, também a nós na dor da perda as lágrimas nos
impedem de ver o que se apresenta diante dos olhos.
O chamamento pelo nome
traz a Maria o cessar das lágrimas, a passagem da morte à vida, a ressurreição,
pois o seu nome na boca de Jesus traz-lhe à memória a relação, o amor, os
momentos vividos, a vida e a liberdade.
Pelo seu nome, invocado
por Jesus, Maria descobre que o amor é mais forte que a morte, que é em vão que
procura entre os mortos aquele que é a Vida, aquele que lhe deu vida.
No seu amor, na sua
paixão, Maria tenta prender Jesus, num desejo de não voltar a perder aquele que
ama quere-o presente sempre junto de si, consigo.
Tentação que nos
alcança a todos, na nossa relação com Deus, e na nossa relação com os outros,
com aqueles que de modo particular amamos.
Contudo, e como Maria
Madalena descobre, nenhum de nós se pode apoderar de Deus, não o podemos
prender, tal como não podemos prender nem apossar-nos daqueles que amamos.
A descoberta do outro,
a relação com o outro, seja Deus, seja um homem ou mulher, é sempre um convite
a partir, a ir anunciar uma boa nova.
Se Maria Madalena foi
enviada aos discípulos a anunciar que o Mestre estava vivo, tinha ressuscitado,
nós somos igualmente enviados a anunciar que a vida vale a pena, que o amor é
mais forte que a morte, que a vida vivida com amor é eterna.
Que as lágrimas da dor
e da perda não nos turbem o olhar e o amor nos descubra a presença ressuscitada
daqueles que partiram e partem.
Ilustração: “Noli
me tangere”, de Adriaen van der Werff.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarLeio e saboreio as palavras que teceu e partilha, ilustradas maravilhosamente a que o italiano confere uma melodia especial. Fico a reflectir na dor e desorientação de Maria Madalena, vivida por muitos de nós quando perdemos aqueles que amamos e de tal maneira ficamos perturbados que deixamos de pensar, de ver mais além, de distinguir entre a emoção, a razão e a fé. E não seríamos verdadeiros se dissessemos que todos os cristãos, pelo menos, num primeiro momento, conseguem aceitar a finitude dos que amam de forma natural, que se aceitasse o acontecimento como a passagem da morte à vida, acreditar que se trata da morte física que nos devolve ao pó antes do sopro divino. Precisamos daquele olhar, da palavra, das mãos que tocávamos.
Mas Maria é interrompida pelo chamamento do seu nome …”Mulher, porque choras?” (Jo 20,12)… Como nos afirma, trata-se de um chamamento que …” traz a Maria o cessar das lágrimas, a passagem da morte à vida, a ressurreição, pois o seu nome na boca de Jesus traz-lhe à memória a relação, o amor, os momentos vividos, a vida e a liberdade. (…)
(…) No seu amor, na sua paixão, Maria tenta prender Jesus, num desejo de não voltar a perder aquele que ama quere-o presente sempre junto de si, consigo.
Tentação que nos alcança a todos, na nossa relação com Deus, e na nossa relação com os outros, com aqueles que de modo particular amamos.”…
Como nos recorda no texto …” e como Maria Madalena descobre, nenhum de nós se pode apoderar de Deus, não o podemos prender, tal como não podemos prender nem apossar-nos daqueles que amamos.”… Que longo processo, que difícil, Frei José Carlos!
Um grande obrigada, Frei José Carlos, pelas palavras partilhas de profunda espiritualidade, beleza e compreensão da realidade do ser humano e como nos exorta …” Que as lágrimas da dor e da perda não nos turbem o olhar e o amor nos descubra a presença ressuscitada daqueles que partiram e partem.”
Que o Senhor o ilumine, o guarde e o abençoe.
Bom descanso.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva
P.S. Permita-me que recorde uma citação feita ontem por um psiquiatra de um texto escrito por um jornalista que há pouco tempo, “en passant” a rever alguns poemas de Sophia de Mello B Andresen tomara conhecimento.
…"E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas a ilusão de que tudo podia ser meu para sempre."
Miguel Sousa Tavares